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A casca de banana

Autor: Irmão X (espírito)

Secundino renasceria entre os homens para socorrer crianças desamparadas, e, para isso, organizou-se-lhe grande missão no Plano Espiritual.

Deteria consigo determinada fortuna, a fortuna produziria trabalho, o trabalho renderia dinheiro e o dinheiro lhe forneceria recursos para alimentar, vestir e educar duas mil criaturinhas sem refúgio doméstico.

Atendendo à empreitada, Lizel, o instrutor desencarnado que o seguiria entre os homens, dar-lhe-ia, em tempo devido, o necessário suprimento de inspirações.

Estariam juntos, e Secundino, internado no corpo terrestre, assimilaria as ideias que o mentor lhe assoprasse.

A experiência começou, assim, promissora…

Da infância à mocidade, o tarefeiro parecia encouraçado contra a doença. Extravagante como ninguém, descia, suarento, de vigoroso cavalo do sítio paterno, mergulhando no sorvete, sem qualquer choque orgânico, e ingeria frutos deteriorados, como se possuísse estômago de resistência invencível.

Em todas as particularidades da luta, contava com a afeição de Lizel, e, muito cedo, viu-se em contacto com o amigo espiritual, que não só lhe aparecia em sonhos, como também através dos médiuns, com os quais entrasse em sintonia.

O benfeitor falava-lhe de crianças perdidas, pedia-lhe proteção para crianças sem rumo, rogava-lhe, indiretamente, a atenção para o noticiário sobre crianças ao desabrigo.

E tanto fez Lizel que Secundino planeou o grande cometimento.

Seria, sim, o protetor dos meninos desamparados… Entretanto, considerando as necessidades do serviço, pedia dinheiro em oração.

E o dinheiro chegou, abundante…

Ao influxo do amor providenciai de Lizel, sentia-se banhado em ondas de boa sorte… Explorou a venda de manganês e ganhou dinheiro, negociou imóveis e atraiu dinheiro, comprou uma fazenda e fez dinheiro, plantou café e ajustou dinheiro…

Começou, porém, a batalha moral.

Lizel falava em crianças e Secundino falava em ouro.

– “Protegeria a infância desditosa – meditava, convicto –; contudo, antes, precisava escorar-se, garantir a família, assegurar a tranquilidade e arranjar cobertura.”

Casado, organizou fortuna para a mulher para o pai, acumulou fortuna para os filhos e para o sogro, amontoou riquezas para noras e genros, e, avô, adquiriu bens para os netos…

Porque tardasse demais na execução dos compromissos, a Esfera Superior entregou-o à própria sorte.

Apenas Lizel o seguia, generoso. E seguia-o arrasado de sofrimento moral, assinalando-lhe frustração.

Secundino viciara-se nos grandes lances da vantagem imediata e algemara-se francamente ideia do lucro a qualquer preço.

Lembrava os antigos projetos como sonhos da mocidade…

Nada de assistência a menores abandonados, que isso era obra para governos… Queria dinheiro, respirava dinheiro, mentalizava novas rendas e trazia a cabeça repleta de cifras.

Lizel, apesar disso, acompanhava-o, ainda… Agoniava-se para que Secundino voltasse a pensar nos meninos sem ninguém… Ansiava por rever-lhe o ideal de outra época!… Tudo seria diferente se o pobre companheiro despertasse para as bênçãos do espírito!…

Aconteceu, no entanto, o inesperado.

Ao descer de luzido automóvel para estudar o monopólio do leite, Secundino não percebe pequena casca de banana estendida no chão.

Lizel assinala o perigo, mas suplica em vão o auxílio de outros amigos espirituais.

O negociante endinheirado pisa em cheio no improvisado patim, perdendo o equilíbrio em queda redonda.

Fratura-se a cabeça do fêmur e surge a internação no hospital; contudo, o coração cansado não corresponde aos imperativos do tratamento.

Aparece a cardiopatia, a flebite, a trombose e, por fim, a uremia…

No leito luxuoso, o missionário frustrado pensa agora nas criancinhas enjeitadas, experimentando o enternecimento do princípio… Chora. Quer viver mais tempo na Terra para realizar o grande plano. Apeia para Deus e para Lizel, nas raias da morte…

Seu instrutor, ao notar-lhe o sentimento puro, chora também, tomado de alegria… No entanto, emocionado consegue dizer-lhe apenas:

– Meu amigo! Meu amigo!…. Agradeçamos ao Senhor e à casca de banana a felicidade do reequilíbrio!… Seu ideal voltou intacto, mas agora é tarde… Esperemos que o berço lhe seja e propício…

Nota

O conto acima, psicografado por Francisco Cândido Xavier, faz parte do livro Contos Desta e Doutra Vida.

Obra completa: https://www.febeditora.com.br/contos-desta-e-doutra-vida

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