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A consulta

Autor: Irmão X (espírito)

Ante o amigo que se responsabilizava pelas tarefas do templo espírita-cristão, a dama bem-posta rogava, afoita:

– Venho pedir-lhes socorro, porque minha vida está realmente transtornada… Ainda ontem, sonhei que meu pai, desde muito no Além, veio a nossa casa, sustentando comigo longa palestra… Acordei, de súbito, e ainda pude ver-lhe o rosto, magro e vivo, rente a mim. Acabrunhada, dirigi-lhe algumas indagações em pensamento e, com assombro, ouvi-lhe a voz, explicando-me que a morte não existe, que a vida continua e que, além do sepulcro, prossegue interessado em meu bem-estar… Entretanto, não pude furtar-me aos calafrios. Horrível sensação de pavor assaltou-me o espírito e comecei a gritar, inconscientemente… Que supõe vem a ser isso?

– Mediunidade, minha senhora, mediunidade. . . – comentou o orientador, calmo e prudente.

– Ah! sim – continuou a exaltada senhora -, muitas pessoas de minhas relações afirmam que, de fato, sou médium… Desde criança, vejo coisas e, cada noite, antes do sono, embora cerre as pálpebras, diviso vultos estranhos que me cercam o leito, sem dissipar o temor de que me vejo possuída… Como interpretar esses fatos?

– São fenômenos de sua mediunidade – respondeu o ponderado interlocutor.

– Sim, sim – aduzia a visitante -, outras ocorrências me espantam. Muitas vezes, à sesta, ou quando em conversação com amigas, noto que objetos se movem, junto de mim, sem contacto físico. Pancadas nos móveis, como se pessoas invisíveis desejassem conversar conosco, repetem-se ao meu lado, todos os dias. Em muitas ocasiões, vejo mãos, como se fossem de névoa translúcida, a se movimentarem, agravando-me os sustos. Como classificar esses casos?

– Mediunidade, minha irmã…

– E essa angústia que sinto, diariamente, qual se uma luva de sombra me buscasse a garganta? Muitas vezes, fico parada, prestes a morrer… E essa asfixia vem de longe… Debalde, tenho experimentado tratamentos diversos. Tenho a ideia de que forças inexplicáveis me escaldam a cabeça, ao mesmo tempo em que me enregelam o corpo. Nesses instantes, ouço vozes e lamentações que me torturam o pensamento… Como definir essas impressões?

– Minha irmã, tudo isso é mediunidade – esclareceu o mentor, seguro de si.

E a dama contou novos sonhos, relacionando novos fatos, até que terminou por suplicar, depois de longo tempo:

– Amparem-me, por amor de Deus!… Estou disposta a qualquer sacrifício… Darei o que for preciso para desvencilhar-me dos obstáculos que me levam a semelhantes perturbações…

O dirigente da instituição deixou-a extravasar as promessas brilhantes que enfileirava uma sobre a outra, e acentuou, em seguida:

– A solução do problema está com você. Estude e trabalhe, minha irmã. Estude, aprimorando a personalidade que lhe é própria, para dilatar os domínios do seu pensamento, compreendendo a vida com mais largueza, e trabalhe na sementeira do bem, atraindo a cooperação e a simpatia dos outros. Renovação mental, disciplina das emoções, esforço persistente no bem e meditação sadia não devem ser desprezados na aquisição de nossa paz, que não pode ser comprada a terceiros e sim construída por nós mesmos na intimidade do coração. Para isso, o Espiritismo ser-lhe-á valioso campo de luta, no qual conhecerá, com mais segurança, as suas energias psíquicas, enriquecendo-as pela cultura edificante e pela caridade bem conduzida.

Todavia, quando a irrequieta senhora ouviu falar em estudo, trabalho, renovação, disciplina, esforço, meditação, cultura e caridade, perdeu a eloquência em que se distinguia. Desapontada, tartamudeou, aflita:

– Julguei obter auxílio mais facilmente…

– Sim, a senhora será ajudada a fim de ajudar-se E porque o relógio modificasse a fisionomia das horas o diretor convidou:

– Iniciemos agora, minha irmã. Nossos estudos vão começar, à luz da prece.

– Sim – falou a enferma, desencantada -, hoje não posso, mas virei amanhã…

E saiu sem despedir-se. Os dias correram apressados.

Contudo, por mais que os amigos do Grupo a esperassem, solícitos, a consulente não mais voltou.

Nota

O conto acima, psicografado por Francisco Cândido Xavier, faz parte do livro Contos Desta e Doutra Vida.

Obra completa: https://www.febeditora.com.br/contos-e-apologos

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