Por: F. Altamir da Cunha
A morte não é uma hipótese; é uma certeza. É um fenômeno natural, que atesta a finitude da vida no corpo e nos convida a profundas reflexões. Aceitá-la como resultado de uma lei, que não podemos mudar, é passo indispensável para vencer o medo a ela relacionado.
Posto que a vida no corpo conduza inexoravelmente à morte, quem não a aceita poderá se tornar escravo do medo e não se ajustar satisfatoriamente à vida. Comportando-se assim como um condenado à pena de morte, aguardando o dia da execução.
Estudos realizados comprovam a relação significativa entre o medo da morte e as angústias que atormentam o homem contemporâneo. Alguns seguidores do pensamento de Martin Heidegger (notável filósofo do século XX) defendem que as pessoas que mais temem a morte são sempre as mesmas que mais têm medo da vida. Esta afirmativa não é desprovida de razão; pois, sendo a morte uma etapa inevitável da vida, temer a morte é temer a própria vida.
Dessa relação entre o medo de viver e o medo de morrer, surge o dever impostergável de nos educarmos para a morte. Precisamos aprender a conviver com essa realidade, evitando que ela se transforme em obstáculo à nossa evolução espiritual.
Faremos uma análise sobre o assunto, iniciando por alguns questionamentos comuns:
a) Será a morte necessária?
A resposta mais inteligente nos foi dada pelo Mestre Jesus: “Na verdade, na verdade vos digo que, se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer dá muito fruto”. (1)
A morte é necessária; não há justificativa para a permanência do Espírito no corpo físico, após um determinado tempo, quando, por força do processo natural de transformação da matéria, o corpo torna-se inadequado às suas necessidades. Retorna, então, o Espírito à pátria de origem – a espiritualidade – onde permanece pelo período que se fizer necessário, preparando-se para uma nova reencarnação.
b) Sendo a morte necessária, o que podemos fazer para enfrentá-la com serenidade?
Combater os fatores que causam o medo da morte. Até certo ponto o temor pode ser conseqüência da lei de conservação; no entanto, quando exorbita, causa muitos transtornos psíquicos e espirituais. Na maioria das vezes, é fruto da ignorância. Quando conhecermos a verdade a respeito da vida e da sua inter-relação com a morte, cumprir-se-á o que foi ensinado por Jesus: “E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. (2)
Analisemos agora, algumas das principais causas do medo da morte e suas influências em nossas vidas:
– O apego à vida material:
“Todos sabemos que morremos, que a morte é inevitável, mas estamos tão apegados à vida e fazemos uma idéia tão negativa e temerosa da morte que a rejeitamos em nossa consciência e a transformamos num mito, afastando-a para o Fim dos Tempos. Mito assustador, ela permanece na distância, envolta em névoas, de maneira que só a vemos como figura trágica de um conto de terror. Heidegger observou que só a aceitamos, para os outros, com a expressão aleatória morre-se, que nunca se refere a nós”. (3)
É bem verdade que necessitamos, enquanto encarnados, de vínculos afetivos e emocionais com as pessoas e os bens materiais indispensáveis à nossa evolução, mas é preciso que nos eduquemos para não nos escravizarmos. Da Terra não levaremos nada do que encontramos ao chegar. Portanto, assumir a condição de donos, quando somos apenas usufrutuários, é um doloroso equívoco.
A morte funciona como uma ação de transferência compulsória dos bens materiais; por isso o apego resulta em medo da morte, como conseqüência do medo de perder esses bens.
Há mais de 2000 anos, Jesus já ensinava: “Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração”. (4)
– A influência de dogmas religiosos que apresentam o inferno como o mais provável lugar aonde o Espírito aportará.
Um espaço localizado no mundo espiritual, proporcionando sofrimentos sem fim aos pecadores; Satanás chefe supremo do inferno, habilidoso e astuto, com poder comparável ao de Deus. É o mínimo apresentado por esses dogmas que destroem sonhos, geram pesadelos e, conseqüentemente o medo da morte. Não poderia resultar diferente, quando cada um, no uso do bom senso, reconhece que não é um primor de criatura, e que se encontra distante da condição de cumpridor dos deveres, com relação à lei de amor ensinada por Jesus. Reconhecendo-se assim, como pecador, atormenta-se com medo da morte (na verdade, medo do inferno).
Quem primeiro cuidou da Psicologia da Morte e da Educação para a Morte, em nosso tempo, foi Allan Kardec, codificador da Doutrina Espírita (2).
É indiscutível a importância da Doutrina Espírita não apenas para confirmar a imortalidade do Espírito, mas também para eliminar da morte o injusto rótulo – pavoroso e indesejável fenômeno.
Apenas quando nos espiritualizamos é que entendemos que não há mais como pensarmos na vida (estágio transitório no corpo), sem pensarmos na morte (fenômeno biológico); também não há como pensarmos na morte, sem pensarmos na vida (vida espiritual).
Quanto à fantasia dogmática conhecida como inferno, interpretamos como um estado transitório, reflexo da avaliação individual do Espírito culpado, que transgrediu as leis universais. Todavia, quando acontecem as mudanças necessárias, identificando-se com a lei de amor, surgirá o céu em forma de paz e felicidade, cumprindo-se o que Jesus ensinou: “[…] pois o reino de Deus está dentro de vós”. (5)
Portanto, crer na vida após a morte, extinguir apegos e vícios, que tanto nos vinculam à matéria, sintonizar com a lei de amor e crer na justiça Divina são fundamentos indispensáveis da educação para a morte.
Referências
(1) João 12:24.
(2) João 8:32.
(3) J. Herculano Pires. In: Educação para a morte.
(4) Lucas 12:34.
(5) Lucas 17:21.
O consolador – Ano 2 – N 84