Autor: Marcus De Mario
A sala de aula está repleta de olhares sedentos de conhecimento, afinal todos ali estão com um objetivo comum: tornarem-se pedagogos, estarem preparados para trabalhar nas escolas e dar aula a crianças, adolescentes, jovens. A professora explica, sem meias palavras: “Não se iludam! Esse negócio de diálogo com os alunos, construção do aprendizado e outras coisas, é tudo bobagem. Tenho mais de vinte anos de magistério e posso afirmar a vocês que o professor deve entrar em sala e marcar bem a sua autoridade. É ele quem manda e quem ensina. É um erro tirar das salas aquele tablado, porque o professor tem que “ficar por cima”. Se vocês, quando começarem a dar aula, não fizerem isso, os alunos tomam conta e fazem de vocês verdadeiros palhaços!”.
Quem me narra a cena, com olhar de espanto e indignação, é uma amiga, atualmente fazendo a faculdade de pedagogia. Reflito e argumento: “Discurso e postura mudaram bem pouco nesses trinta e pouco anos que separam minha história de aluno na faculdade, da sua história, hoje, também como aluna numa faculdade”.
Diante da realidade que enfrentamos, com a proliferação de faculdades de pedagogia, a maioria particulares, como atestam estatísticas do Ministério da Educação, devemos perguntar: como estamos educando aqueles que devem educar? É questionamento bem mais forte do que se formulássemos a questão desta outra maneira: o que se ensina a quem deve ensinar? Isso porque um pedagogo deveria ser exemplo de educador, fazendo a diferença na escola. E porque professor não é sinônimo de repassador de conteúdos. Infelizmente, não é o que se vê.
Entrincheirados numa cultura acadêmica distanciada da realidade escolar básica, e fazendo de mestrados e doutorados escudo protetor para hipocrisias, diletantismos, favorecimentos e perpetuação no cargo, grande parcela dos professores do ensino superior mantém discurso e postura desantenados, desplugados e dissociados da realidade e das conquistas pedagógicas e psicológicas referentes ao homem.
Minha amiga tem razão em ficar indignada. O conselho dado por sua professora é medieval, demonstrando preconceitos com relação aos alunos e colocando o professor como detentor de um autoritarismo ditatorial e anti-didático – talvez seja melhor dizer antipedagógico.
Quantas vezes, já perdi a conta, professores ficaram olhando para mim sem conseguir definir o que é educação? E a definição de pedagogia? E por que estão em sala de aula? A maioria é pedagogo, está fazendo ou já fez pós-graduação. E não conhecem muitos pensadores e educadores. Nunca leram sobre eles ou algo que escreveram. Às vezes desconhecem o mínimo sobre didática. Será que podemos chamá-los de pedagogos?
Desde a década de sessenta do século vinte perdemos o rumo da educação em nosso país. Lá se vão mais de sessenta anos de formação deficiente do professor, desqualificação da escola e substituição do educar pelo ensinar. E os resultados aí estão, sem necessidade de comentários.
Enquanto ficarmos assistindo, ano após ano, pedagogos de papel, exibindo um certificado da faculdade, adentrarem ao sistema de ensino com visão e valores deturpados, o que podemos esperar como consequência?
Precisamos romper com a clássica sala de aula e o professor ensinando, mas como fazer isso se não estamos educando corretamente quem deve educar?