A infância e juventude no Centro Espírita

Autor: Norberto Tomasini Junior

Após diversas conversas com dirigentes espíritas e debates realizados em conselhos regionais, intermunicipais e distritais da USE (União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo, ficou evidente uma necessidade urgente: a de desenvolver trabalhos voltados para as novas gerações, que equilibrem a coerência doutrinária com os princípios espíritas e as necessidades atuais de crianças e jovens. Esse desafio não é apenas organizacional; trata-se de uma missão essencial para a perpetuação do Espiritismo como doutrina filosófica, científica e moral.

Inspirados em importantes obras como “Orientação ao Centro Espírita” da Federação Espírita Brasileira (FEB), na histórica “Viagem Espírita em 1862” de Allan Kardec e no Plano de Trabalho para o Movimento Espírita Brasileiro (2023-2027), podemos vislumbrar caminhos que combinam inovação e fidelidade doutrinária na atração de crianças e jovens para as casas espíritas.

Educação e Coerência: O Alicerce da Infância e Juventude

No capítulo destinado à Área de Infância e Juventude (AIJ) do documento Orientação ao Centro Espírita, reforça-se que o trabalho com as novas gerações deve ser pautado pela fidelidade aos ensinamentos de Allan Kardec. A educação espírita precisa promover o estudo sistemático e acessível das obras fundamentais, com foco na formação moral, evitando modismos que desviem do caráter filosófico e educacional do Espiritismo.

O Plano de Trabalho para o Movimento Espírita Brasileiro (2023-2027) enfatiza a Diretriz 10 – Orientação e engajamento da Juventude nas atividades do Centro e do Movimento Espírita, que estabelece a necessidade de aproximar os jovens do estudo espírita sem perder a fidelidade doutrinária. O documento propõe iniciativas voltadas para o acolhimento, estudo e participação ativa da juventude no centro espírita, destacando a necessidade de linguagens adequadas e da adaptação das metodologias de ensino sem concessões doutrinárias​.

A FEB também destaca a importância de metodologias pedagógicas adaptadas à idade e ao contexto social de cada faixa etária, utilizando abordagens que conciliem o aprendizado com atividades que inspirem participação ativa e reflexões profundas. Além disso, sugere-se que as casas espíritas priorizem a formação continuada dos educadores, de modo que estejam preparados para lidar com os desafios e interesses específicos das novas gerações.

O Exemplo de Kardec em “Viagem Espírita em 1862”

A Viagem Espírita em 1862 é um relato poderoso sobre o esforço de Allan Kardec para consolidar o movimento espírita em suas bases. Durante essa viagem, o codificador visitou diferentes grupos e sociedades espíritas, observando de perto a importância de uma educação doutrinária bem estruturada.

Kardec destacou que a coerência moral e filosófica do Espiritismo era um fator essencial para atrair seguidores conscientes, incluindo as novas gerações. Ele também sublinhou a necessidade de promover espaços que permitam uma integração harmoniosa entre os valores espirituais e os desafios práticos enfrentados pelas crianças e jovens.

Em suas observações, Kardec notou que, em muitas localidades, o Espiritismo crescia justamente entre as classes mais educadas, que buscavam respostas filosóficas e morais. Este dado é um convite para as casas espíritas se organizarem de forma clara e estruturada, oferecendo conteúdo relevante e profundo, mas sempre acessível.

A Importância do Ambiente Familiar e Comunitário

Um ponto central tanto na Orientação ao Centro Espírita quanto nas reflexões de Kardec é o papel da família na formação espírita das novas gerações. O Evangelho no Lar é destacado como uma prática essencial para reforçar os valores espíritas no ambiente doméstico, sem dogmas ou receitas. Essa conexão entre família e casa espírita cria uma base sólida para atrair crianças e jovens, que passam a enxergar a Doutrina como um caminho seguro e confiável.

Além disso, a Diretriz 4 do Plano de Trabalho para o Movimento Espírita Brasileiro (2023-2027) propõe a adequação dos Centros Espíritas para melhor atender às suas finalidades, incluindo a ampliação das atividades para os públicos infantojuvenis. A recomendação é que os centros sejam mais acolhedores e ofereçam espaços preparados para essa faixa etária, sem perder o foco no ensino doutrinário​.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou que o número de jovens entre 15 e 29 anos que se declaram sem filiação religiosa tem crescido no Brasil. Esse dado reforça a necessidade de uma abordagem que conecte os jovens à espiritualidade de forma racional, coerente e alinhada às necessidades contemporâneas, sem apelar para modismos ou concessões doutrinárias.

Possíveis caminhos para o Futuro

Para atrair as novas gerações sem concessões doutrinárias, é fundamental que os centros espíritas adotem estratégias que unam tradição e inovação, tais como:

  1. Educação Doutrinária Clara e Dinâmica: Utilizar métodos interativos e pedagógicos que conectem o ensino espírita às experiências cotidianas das novas gerações.
  2. Ambiente Acolhedor e Seguro: Criar espaços onde crianças e jovens se sintam ouvidos, respeitados e inspirados.
  3. Atividades Integradoras: Promover eventos e projetos que envolvam não apenas as novas gerações, mas também suas famílias, incentivando a participação conjunta.
  4. Uso Consciente da Tecnologia: Explorar ferramentas digitais para ampliar o alcance das atividades doutrinárias e educacionais.
  5. Formação Contínua dos Educadores: Investir na capacitação de monitores e facilitadores para lidar com os desafios educacionais da atualidade.

Além disso, uma das recomendações da FEB é que os centros espíritas incentivem a criação de grupos de estudo para jovens, onde possam discutir temas atuais sob a ótica espírita, favorecendo o senso crítico e a autonomia moral.

A Diretriz 7 do Plano de Trabalho para o Movimento Espírita Brasileiro (2023-2027) também reforça a importância da formação continuada dos trabalhadores espíritas, o que inclui capacitar aqueles que trabalham com a infância e juventude para que estejam preparados para dialogar com as novas gerações sem perder a essência doutrinária​.

Conclusão

A construção de um futuro sólido para o Movimento Espírita passa, inevitavelmente, pelo investimento nas novas gerações. Inspirados pelo trabalho incansável de Allan Kardec e pelos direcionamentos da FEB, podemos fortalecer a presença de crianças e jovens nas casas espíritas, garantindo que a Doutrina Espírita permaneça viva, coerente e transformadora.

Como Kardec afirmou durante a Viagem Espírita de 1862:
“O progresso da Doutrina está nas mãos daqueles que compreendem sua essência e se dedicam ao bem comum. Só assim o Espiritismo crescerá e florescerá em todas as épocas e lugares.”

O compromisso de preparar as novas gerações para serem espíritas conscientes e comprometidos é, antes de tudo, uma tarefa de amor e responsabilidade. Com dedicação, coerência doutrinária e inovação bem aplicada, as casas espíritas poderão continuar a missão de iluminar consciências e construir um mundo mais justo e fraterno.

DICA

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