Autor: Marcus De Mario
Estava eu já sentado em minha poltrona no voo que me traria de volta ao Rio de Janeiro, depois de uma jornada de palestras e capacitações pelo interior paulista, quando uma passageira reclamou da comissária de bordo que não havia espaço no bagageiro para colocar sua mala. E exigiu que a funcionária da empresa aérea deslocasse as bagagens, pois ela queria colocar sua mala exatamente no bagageiro acima de onde estava sua poltrona. Educadamente a comissária de bordo explicou que não podia fazer isso, mas que a passageira podia colocar a mala num bagageiro mais à frente, que estava vazio. Diante dessa resposta, a passageira, visivelmente alterada, levantando o tom de voz, reclamou que a mala ficaria longe, o que retardaria sua saída do avião quando chegado ao destino. Mais uma vez assisti a comissária explicar, com toda paciência, que isso não aconteceria, pois agora o desembarque é feito por chamada das fileiras, e que ela poderia, depois da aterrissagem, levantar e já pegar sua mala. Contrafeita, irritada, a passageira deu ordem, isso mesmo, pois ela não solicitou, seu tom de voz foi incisivo, que a comissária levasse e guardasse sua mala no outro bagageiro mais à frente.
Fazendo um parêntesis na história, que é real, verdadeira, presenciada por mim, devemos todos ficar sabendo, se é que já não sabemos, que os comissários de bordo não são obrigados a armazenar a nossa bagagem nos compartimentos superiores, isso é tarefa do passageiro. Os comissários podem orientar e auxiliar, mas não fazer o serviço, a não ser em casos especiais, como para uma pessoa idosa, um cadeirante e assim por diante.
Feito o parêntesis, voltemos à história. Novamente a comissária, com paciência e educação, informou que ela não poderia fazer isso, obedecendo o protocolo da companhia aérea e a regulamentação da aviação civil, e que a passageira deveria armazenar sua mala no bagageiro superior. Felizmente, apesar das muitas palavras mal utilizadas no momento, a passageira guardou sua mala e se sentou, não sem antes reclamar de todo mundo e dizer que ela é que estava com a razão, o que provocou a intervenção de outros passageiros, solicitando calma.
Quando o avião decolou, para alívio de todos, a passageira em questão calou e não mais tumultuou o ambiente, nem mesmo no desembarque, embora ainda fizesse algumas queixas, mas em tom mais brando.
Essa história retrata bem o quanto estamos egoístas e individualistas. O quanto desrespeitamos os direitos dos outros. O quanto somos exclusivistas defendendo apenas os próprios interesses, mesmo que eles prejudiquem a maioria. Por que estamos assim?
A resposta está na educação que foi promovida conosco desde a infância, e na educação que estamos promovendo com nossos filhos, netos e alunos.
Uma educação que não humaniza, que não moraliza, que não espiritualiza, que não promove a empatia e a solidariedade, só pode gerar indivíduos egoístas, orgulhosos, em quem a ética do viver com os outros passa longe de suas coordenadas existenciais.
Pais que obedecem às vontades dos filhos e professores que nada querem saber do comportamento dos alunos, contribuem vigorosamente para esse estado de violência da sociedade, pois mantém a educação apenas no nível da formação técnica, profissional, lançando na corrente social indivíduos que não sabem se colocar no lugar do outro, não sabem sentir o outro, não sabem trabalhar pelo bem coletivo.
O problema não está na mala/bagagem da passageira, e sim na “mala” em que a passageira se tornou enquanto pessoa, chegando ao ponto de mal ser suportada pelas outras pessoas.
E, diante disso, dessa história real, ainda dizem muitos que a educação nada tem a ver com isso. Bem, pedindo desculpas aos que assim pensam, temos que a educação não apenas tem tudo a ver com isso, como é também o remédio a esse mal, se for aplicada como deveria ser, na formação integral do ser humano.