Autor: Irmão X (espírito)
Convencido de que o Mestre distribui as graças, de acordo com as solicitações dos discípulos, o crente fervoroso e sincero, vivamente interessado na perfeita integração com o Senhor, pediu-lhe dinheiro, alegando a necessidade de recursos materiais para atender-lhe aos desígnios.
Ouvindo-lhe a rogativa, o Salvador mobilizou emissários para satisfazê-lo.
Em breve, a fortuna vinha ao encontro do aprendiz, enchendo-lhe os cofres e prestigiando-lhe a casa.
Multiplicaram-se-lhe, porém, as preocupações e surgiram desgostos graves. Longe de elevar-se à espiritualidade superior, passava dias e noites vigiando a entrada e a saída do ouro, assinalando os depósitos crescentes.
Distraído das obrigações mais humildes, perdeu a companhia da esposa e dos filhos, desgarrados do lar pelas fascinações da vida fácil.
No fundo, entretanto, conservava a fé inicial e, quando lhe transbordaram as arcas, reconheceu a dificuldade para alçar-se ao Cristo.
Prosternou-se em oração e implorou a Jesus lhe dessa autoridade, assegurando que aguardava semelhante vantagem a fim de segui-lo.
O Senhor acolheu-lhe a súplica e expediu mensageiros que lhe garantissem a desejada aquisição.
Quase de imediato, o discípulo foi guinado a nobre posição administrativa; todavia sem bases na experiência, em pouco tempo se viu odiando e incompreendido incapaz de suportar calunia e critica observações descabidas e advertências mordazes de subalternos e superiores. Movimentava vultosos patrimônios materiais; contudo, não correspondia aos imperativos do espírito.
Aturdido e desencantado, tornou à oração e implorou a Jesus a concessão de dons maravilhosos, afiançando que somente assim poderia servi-lo.
O Divino Doador anotou-lhe a solicitação e recomendou aos assessores lhe confiasse o poder de curar.
O aprendiz recebeu a dádiva e entregou-se ao trabalho.
Dentro de alguns dias, enormes fileiras de necessitados batiam-lhe à porta. A popularidade absorveu-lhe as horas. Escasseou-lhe o tempo, até para alimentar-se. Sem preparação para o delicado serviço, no decurso de alguns meses declarou-se em falência. Faltavam-lhe forças para o ministério. Em face da multidão dos sofredores e dos ignorantes, os familiares que lhe restavam no lar abandonaram o campo doméstico. E o pobre, por sua vez, não soube tratar com os desesperados da sorte. Quando não podia atender alguém, depois de haver socorrido dezenas de aflitos, sentia-se crivado de acusações que não sabia acolher com serenidade. Submeteu-se, desse modo, ao cansaço absoluto. Descontrolou-se. Renegou o dom que o Céu lhe emprestara.
No entanto, porque a fé ainda lhe vibrava no íntimo, regressou à petição, com sinceridade, e renovou a súplica.
Em pranto, implorou a pobreza e a obscuridade. Desejava desfazer-se de todos os laços com a posse terrestre. Seria trabalhador anônimo. Ligar-se-ia à Providência, através do esforço desconhecido.
Registrando-lhe os rogos, o Mestre enviou prepostos adequados à situação. O discípulo foi conduzido à penúria. Esgotaram-se-lhe os recursos. A enfermidade visitou-o com insistência. Desacertaram-se-lhe os negócios. Fugiram amigos e apareceram credores.
Sozinho e desamparado, viu-se igualmente inapto para aquele gênero de provação. Sarcasmos e zombarias choviam-lhe na estrada. Foi apontado à conta de imprevidente e relapso, sem o governo da própria existência. Debalde tentou colaborar em obras edificantes. Mesmo aí encontrou gargalhadas por parte de alguns companheiros. Ninguém confiava nele. Aos olhos alheios era relaxado e dissipador. Verificou o misero que a impaciência e a revolta passaram a frequentar-lhe o coração. Surpreendia-se, por vezes, irado e infeliz, ensaiando reações.
Socorrido, porém, pela sublime claridade da fé, proclamou a incapacidade de suportar a pobreza absoluta e, genuflexo, implorou ao Senhor:
– Mestre Amado, sei que me abres a porta sempre que bato confiante, mas, em verdade, ignoro a essência de meus próprios desejos. Reconheço agora que dispensas a riqueza, o poder e a gloria de teus dons, conforme os méritos e as necessidades dos aprendizes. Não dás a escassez externa àquele que ainda não sabe utilizá-la para o bem, nem confias tuas dádivas aos que não sabem como transportá-las, entre os homens ingratos e cruéis. Conheces a posição de cada um de nós e medes, com sabedoria, a extensão de nossas possibilidades. Não conferes o benefício da lagrima ao coração endurecido, como não deixas o cetro da direção, por muito tempo, nas mãos levianas ou inábeis; não concedes a pobreza absoluta a quem não sabe aproveitar o sofrimento, como não permites que a riqueza se demore na moradia dos insensatos!…
Emudece, Senhor, os pedidos de minha ignorância, não permitam que eu te suplique situações que desconheço… Modifica minha vontade, para que meus desejos concordem com os teus desígnios… Até hoje tenho sido cego! Não me negues tua misericórdia!… Faze que eu veja!…
O Mestre ouviu-lhe a rogativa, mas, dessa vez, não mandou emissários para a colaboração indireta. Veio, Ele mesmo, ao santuário interior do aprendiz.
O discípulo, em pranto, sentiu então que alguém lhe falava do centro d’alma. Não era uma voz semelhante às vozes que escutara no mundo…
Era um sopro divino, nascido da misteriosa cripta do coração, renovando-lhe todo o ser. Extasiado e feliz, reconheceu a presença do Senhor que lhe falou a consciência desperta:
– Doravante, permanecerá em mim, como permaneço em ti. Estaremos unidos para sempre!…
Nota
O conto acima, psicografado por Francisco Cândido Xavier, faz parte do livro Pontos e Contos.
Obra completa: https://www.febeditora.com.br/pontos-e-contos