Autor: Eduardo Carvalho
Como espíritas, não temos o hábito de visitar cemitérios, pois compreendemos que ali está apenas uma “roupa” que aquele espírito utilizou durante uma de suas inúmeras reencarnações. Portanto, compreendemos que nosso ente querido, nosso amigo, a pessoa que em vida nos foi muito importante, já não se encontra mais ali. Sabemos que ela se encontra em algum lugar no plano espiritual, sendo socorrida, estudando, trabalhando, preparando-se para voltar ou, até quem sabe, já tenha voltado. Também não temos o hábito de prestar cultos de devoção e nem adoração a nenhum espírito encarnado ou desencarnado.
No entanto, algumas vezes nos deparamos com situações que fogem ao esperado. Uma destas situações pode ser presenciada perante o túmulo de Allan Kardec, no cemitério du Père Lachaise, em Paris. O Père Lachaise é o cemitério mais famoso de Paris, podendo ser considerado como um cemitério turístico, uma vez que ali estão enterrados diversos artistas, políticos, cientistas, escritores e outras pessoas famosas, como o dramaturgo Oscar Wilde, o cantor Jim Morrison, o filósofo Augusto Comte e o compositor Frédéric Chopin. Algumas sepulturas são verdadeiras obras de arte.
Logo na entrada principal são vendidos mapas indicando a localização de pouco mais de 100 túmulos famosos, entre eles o de Allan Kardec e o de Gabriel Delanne. Seguindo o mapa, é muito fácil localizar o túmulo de Kardec, que chama a atenção de longe, por ser o túmulo mais florido do cemitério. É interessante observar a enorme quantidade de flores que são deixadas próximas à estátua com o busto de Kardec. Não há um único espaço nas proximidades do monumento que serve como túmulo que não esteja ocupado por um vaso de flores.
Como todo bom turista, a primeira coisa que eu fiz ao chegar ao túmulo foi tirar algumas fotos. Em seguida, fiquei observando o comportamento das pessoas que ali chegavam. Algumas vinham com vasos de flores, procuravam por um cantinho entre os inúmeros vasos que já estavam ali e deixavam o seu. Paravam e faziam uma prece perante o túmulo. Outras faziam questão de tocar a imagem do busto de Kardec, como se buscasse dali retirar energias. Era impressionante observar a comoção destas pessoas durante o ritual. Havia ainda aquelas que ascendiam velas. Isso tudo levando-se em consideração que atrás do túmulo havia um aviso da União Espírita Francesa recomendando que não se fizesse rituais de adoração perante o túmulo. Conversei com algumas destas pessoas e que me contaram que frequentam algum centro espírita na França, mas que eles são muito raros. Uma delas até pediu o endereço do meu hotel e me prometeu enviar o endereço de um centro muito importante em Paris. Havia também alguns brasileiros ali e um rapaz da Colômbia que trouxe flores.
Todas as demais pessoas que passavam perante o túmulo paravam e olhavam curiosas, tentando entender o que aquele túmulo tinha de tão especial, já que a quantidade enorme de flores chama a atenção de longe e não é vista em nenhum outro túmulo do cemitério. Algumas destas pessoas se aproximavam para ler o texto que havia atrás do túmulo e que explicava quem foi Allan Kardec.
Fiquei alguns minutos parado perante o túmulo, refletindo, pensando sobre as pessoas que traziam as flores e tocavam o busto. Porque elas tinham aquelas atitudes se a doutrina espírita explica de forma bastante racional que elas não são necessárias? Então um pensamento me veio à cabeça: “A razão mostra-nos o caminho e corrige nossa rota, a emoção nos dá a energia necessária para percorrê-lo”.
É isso o que leva milhares de pessoas a lotarem os cultos evangélicos, as missas-show do padre Marcelo ou a cidade de aparecida do norte no dia 12 de Outubro. E Talvez seja isso o que alimenta estas pessoas que levam as flores ao túmulo, para que elas possam continuar sua caminhada em um lugar onde o movimento espírita não tem tanta força.
E quanto a nós, o que nos alimenta em nosso trabalho pelo movimento espírita? O que nos leva trabalhar em nossas casas e a participar dos encontros de mocidade? O que nos faz querermos trabalhar, estudar, divulgar, estarmos juntos, apesar das diversas dificuldades que muitas vezes encontramos pelo caminho? Será que é a razão, nos dizendo que temos que fazer isso porque será o melhor para a nossa evolução? Ou será a emoção que sentimos quando estamos nos encontros, quando estamos com os amigos, quando estamos trabalhando e ajudando ao próximo? Aquela sensação de felicidade e de paz?
Não estou de forma alguma desmerecendo a razão, temos que ser racionais sim, mas não devemos nos esquecer do quanto a emoção é importante em nossas vidas, principalmente para o trabalho que abraçamos na divulgação dos ensinamentos do Cristo. É importante ficar claro que eu não estou defendendo os cultos realizados no túmulo de Kardec, mas também não os estou condenando. Quando busquei tentar entender, percebi que aquelas pessoas buscam por algo, que no fundo é mesmo que nós buscamos, e que estas pessoas precisam de forças, da mesma maneira que nós. Bem, esta foi a lição que eu pude tirar e fico feliz por poder compartilhá-la com vocês. Pensem nisso meus amigos.
Fala MEU! Edição 67, ano 2008
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