Autora: Jane Martins Vilela
… Se a caridade reinasse na Terra, o mau não teria mais predominância; fugiria envergonhado, se esconderia, porque se encontraria deslocado por toda parte. Então o mal desapareceria, ficai bem compenetrados disto
Pascal, 1862, em O Evangelho segundo o Espiritismo
Pascal se refere a um sentimento primário, uma das raízes dos males da Terra, o egoísmo, que Emmanuel diz ser uma chaga da humanidade e que deve desaparecer da Terra, pois lhe retarda o progresso.
Há egoísmo quando o semelhante é esquecido, quando o pedido de Jesus – “ tudo aquilo que quereis que vos façam, fazei vós aos outros” – não é atendido.
Uma sociedade egoísta sofre. Quem tem compreensão sabe que a dor é o remédio para a caridade desabrochar, o amor se revelar e o egoísmo desaparecer. O amor é a grande luz se expandindo, a todos envolvendo, fazendo desaparecer a sombra desse mal que ainda vige, mas não por muito tempo, pois as mudanças para uma era melhor se fazem com intensidade crescente.
Joanna de Ângelis, Espírito, pela psicografia de Divaldo P. Franco, nos esclarece, escrevendo:
“O egoísmo é parasita destruidor.
Observa o ciúme e verás o egoísmo revoltado, por não deter a posse.
Examina a ira e descobrirás o egoísmo contrariado, explodindo.
Detém-te na calúnia e sentirás o egoísmo em regozijo.
Acompanha a maledicência e tropeçarás no egoísmo, em jornada de insensatez.
Contempla a vingança e a terapia que tenhas será para o egoísmo que enlouqueceu.
Confere o furto e o egoísmo justificará a posse indébita.
Em qualquer crime contra o indivíduo, a propriedade, o povo, as nações, eis o egoísmo, campeão da desdita, segurando as rédeas de comando arbitrário.”
Meditando nisso, vemos que essa doença ainda está em atividade, e o remédio, a dor, continuará como socorro aos doentes, até que o amor se faça presente em plenitude e a cura ocorra. Bom é vermos qual é a nossa escolha, doença ou saúde, esperando que o espírita, esclarecido pelo conhecimento, opte pela saúde, ou seja, pelo amor, que – como disse o apóstolo Pedro – cobre uma multidão de pecados.
Esperamos que quando a dor se faça presente, pois que ela atinge ainda a todos nesta Terra, saibamos nos conduzir com amor, sendo o altruísmo, fruto dessa escolha, presença confortadora, representando aquele que ilumina com sua atitudes por onde passe. O altruísmo deixa um rastro de luz e gratidão, alegria e paz para aquele que o vivencia.
Pudemos visitar uma senhorinha, de idade avançada, que teve uma vida altruísta.
112 anos de idade! Veio longe, com o amor de seu coração. Seu rosto envelhecido reflete uma candura, uma bondade, uma ternura…
Acamada, o corpo não tem mais força para se sustentar de pé, mas ainda goza de saúde perfeita e lúcida. Perguntamos, apertando-lhe carinhosamente as mãos, como estava, e ela, sem uma queixa, com um sorriso a iluminar-lhe o semblante, respondeu que estava muito bem. Uma lição para os mais jovens que caminham, muitas vezes, reclamando.
A filha, zelosa, que cuida dela agora, revela um amor muito grande por essa mãe. Acabou deixando de cuidar de si para atender melhor a genitora, a ponto de nós lhe recomendarmos que continue fazendo as caminhadas que fazia, pelo bem de seu corpo. Que peça à filha que vem ajudá-la de manhã, que estenda um pouco mais seu horário, pois isso é possível para que ela possa fazer a caminhada de uma hora, que lhe era usual.
Essa filha carinhosa nos surpreendeu com uma pergunta simples, mas que a estava atormentando: Ela pode beber água? “Claro que pode, sempre que quiser, não há problemas com seu corpo”, respondemos.
“Ela nunca reclamou, mas os outros filhos que cuidavam dela antes me avisaram que não podia dar água para ela. Agora eu entendo: estavam economizando fralda descartável, não queriam ficar trocando.” Abriu um sorriso e disse: Estou aliviada, vou dar água sempre que ela pedir.
A velhinha nunca tinha reclamado, para não incomodar. Altruísmo dela, altruísmo e gratidão da filha que cuida. Na verdade, dever filial.
Essa velhinha de 112 anos vai se desvencilhar bem fácil do seu corpo físico, quando a morte chegar, pelas suas virtudes e por estar sendo um Espírito completista, aquele que consegue levar a termo sua encarnação. Ela pode até estar em moratória, vivendo além do programado, não o sabemos. Seus benfeitores espirituais, sim, sabem. Não condenamos seus outros filhos, pois eles agiram de conformidade com o que acreditavam correto. Pelos seus méritos, ela veio para as mãos da filha que vai cuidar melhor dela.
Ao nos despedirmos, essa bondosa velhinha tomou-nos docemente as mãos e nos direcionou aquelas preciosas palavras antigas: “Vá com Deus! Deus te abençoe!” É assim mesmo: “te abençoe!” É assim que o povo fala! “Vá com Deus ! Deus te abençoe!” Na segunda pessoa, contra as regras gramaticais, mas com beleza e emoção, que superam as regras.
Na questão 913 de “O Livro dos Espíritos”, Allan Kardec pergunta qual é o mais radical dos vícios, cuja resposta dos Espíritos transcrevemos na íntegra, para a nossa meditação:
“Nós o dissemos muita vezes: é o egoísmo. Dele deriva todo o mal. Estudai todos os vícios e vereis que no fundo de todos está o egoísmo. Inutilmente os combatereis e não conseguireis extirpá-los enquanto não houverdes atacado o mal em sua raiz, não houverdes destruído a causa. Que todos os vossos esforços, portanto, tendam para esse objetivo, porque aí está a verdadeira chaga da sociedade. Todo aquele que quer se aproximar, desde essa vida, da perfeição moral, deve extirpar de seu coração todo sentimento de egoísmo, porque o egoísmo é incompatível com a justiça, o amor e a caridade. Ele neutraliza todas as outras virtudes.”
Na questão 917 os Espíritos esclarecem que o egoísmo desaparecerá à medida que a vida moral prevalecer sobre a material e o futuro real, a imortalidade, se tornar compreendido, quando os princípios da caridade e da fraternidade farão com que se pense mais nos outros, com o exemplo do bem se espalhando e todos agindo de conformidade com os ensinamentos do Cristo, tratando-se uns aos outros como gostariam de ser tratados. Aqueles que já ajam assim, que continuem firmes, perseverantes, até que o bem e o amor sejam a conduta de toda a Terra. Isso não tardará tanto, apenas um tempo mais. Quanto será, não o sabemos, os benfeitores espirituais da Terra, sim, estes sabem.
O consolador – Ano 5 – N 247