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Anorexia: Espelho, espelho meu…

Autora: Patrícia Francezi

“Existe alguém mais gorda do que eu?”.

Esta é a bruxa da Anorexia, falando diretamente com o reflexo no espelho. O espelho, responde a esta bruxa, que ela é a pessoa mais gorda do mundo, e que precisa tomar atitudes drásticas para mudar a situação. A imagem refletida, ou vista pela maioria das pessoas que tem este tipo de problema, reflete não a “Branca de Neve”, mas a própria imagem com muitos quilos a mais. E então, os relatos são sempre muito próximos: “ninguém achava que eu estava acima do peso, mas não era o que eu via no espelho”, “eu me via gorda, e horrível”, “eu não gostava da minha imagem, e nem de mim como me via”, “tinha muito medo de engordar”, e por aí vamos. Tantos relatos desse tipo, que nos perguntamos em que espécie de realidade vivem estas pessoas.

Anorexia não é nada moderna, tem origem na Idade Média, em que o jejum muitas vezes era considerado um ato de devoção, ou milagres divinos.

O termo “anorexia nervosa”, foi utilizada pela primeira vez por William Gull, em uma conferencia dada em Oxford (Gull 1874):  “forma peculiar de doença que afeta principalmente mulheres jovens e caracteriza-se por emagrecimento extremo” cuja “falta de apetite é decorrente de um estado mental mórbido e não a qualquer disfunção gástrica”. Ele descartou que a causa fosse orgânica. Nos 30 anos posteriores, os estudos voltaram-se para o estado psicológico e psiquiátrico.

Dessa forma, concluiu-se que Anorexia é uma doença caracterizada por uma perda voluntária de peso, motivada por um desejo patológico de emagrecer aliada a um medo intenso de engordar.

Os jovens possuem o maior número dos casos de Anorexia Nervosa diagnosticados, e tem variação entre 15 a 25 anos.

Observa-se que atualmente esta faixa tem diminuído e já se encontram crianças a partir de 7 ou 8 anos que são diagnosticadas com a doença.

Cerca de 95% dos casos, são diagnosticados entre o sexo feminino, e até 20% tem como consequência o desencarne do paciente. Os casos de desencarne estão mais associados à ataques cardíacos devido a falta de potássio ou sódio, ocasionado pela falta de alimentação e desnutrição. Outros fatores podem causar doenças mais severas, como diminuição do sistema imunológico associado à uma leve infecção que pode se tornar muito grave para um anoréxico em pouco tempo.

Há que se observar, que atualmente a causa da doença tem sido atribuída aos modelos de beleza e a mídia em torno de pessoas naturalmente magras. O perigo está em uma pessoa normal forçar-se a ficar como estes “ícones”.

No entanto, quando se faz uma pesquisa mais aprofundada dos casos, os relatos são muito variados e a maioria delas não informa ter como um modelo a perseguir uma pessoa qualquer, mas alguma situação que desencadeou esta forma de pensamento.

Observando nosso cotidiano, vemos diariamente nos meios de comunicação, todo tipo de forma de emagrecimento, a importância do exercício físico, a crescente corrente contra “alimentos que fazem mal a saúde”, quando o que conta na verdade é o exagero.

A maior parte das pessoas, não tem tempo de cozinhar e acaba se alimentando mal, o que gera a obesidade por excesso de alimentos, ou por má alimentação. Os casos neste âmbito são também muito distintos, mas a propaganda em cima deles, é muito maior do que para as modelos de passarela como se deseja supor.

Os acessos a estas pessoas, as modelos, ou imagens delas, podem ter sido facilitados pela Internet, mas considerando que a maior parte da nossa população tem ao seu alcance os meios como TV e rádio, há de se notar que o tema que envolve a mídia na verdade é a obesidade.

Nossos preconceitos também desencadeiam o desejo de não nos tornarmos alvos do nosso próprio gracejo, e vemos por ai meninas que na verdade não querem ser “gordas como o fulano”, e tornam-se obsessivos à ponto de não terem mais em conta que o que está em jogo é a própria saúde.

Pelos padrões da sociedade (e não mais da mídia), “a primeira impressão é a que fica”. Estabelecemos padrões de vestimenta, de comportamento, de moda, de educação, sem considerar que a individualidade não permite que sejamos todos iguais.

O capítulo 5 do Livro dos Espíritos, trata da “Lei de conservação”. Neste capítulo, entre as questões 718 e  727, Kardec questiona os espíritos sobre as “privações voluntárias e mortificações”; as questões tratam também da alimentação, sobre o que é útil e inútil nos martírios criados por nós mesmos. As questões abaixo resumem muito bem o pensamento dessa parte do Livro e comprovam que a Anorexia já era uma prática anterior à este século:

721 A vida de mortificações ascéticas (dedicadas à meditação com o fim de ser virtuoso) dos devotos e dos místicos, praticada desde a Antiguidade e entre diferentes povos, é meritória sob algum ponto de vista?

– Perguntai para o que e a quem ela serve e tereis a resposta. Se serve apenas àquele que a pratica e o impede de fazer o bem, é egoísmo, qualquer que seja o pretexto com o qual se disfarce. Renegar-se a si mesmo e trabalhar para os outros é a verdadeira mortificação, conforme a caridade cristã.

726 Se os sofrimentos deste mundo nos elevam pela maneira que os suportamos, elevam-nos também os que criamos voluntariamente?

– Os únicos sofrimentos que elevam são os sofrimentos naturais, porque vêm de Deus; os sofrimentos voluntários não servem para nada quando não contribuem para o bem dos outros. Por acaso acreditais que avançam no caminho do progresso os que abreviam sua vida nos rigores sobrehumanos, como fazem os bonzos (monges do Budismo. São dados a martírios e suplícios), os faquires (que se deixam mutilar ou se submetem a jejuns. Exibem-se para provar o domínio e a insensibilidade da dor sobre o corpo) e alguns fanáticos de muitas seitas? Por que não trabalham antes pelo bem de seus semelhantes? Que vistam o indigente; consolem o que chora; trabalhem por aquele que está enfermo; sofram necessidades para o alívio dos infelizes; então, sim, sua vida será útil e agradável a Deus. Quando os sofrimentos voluntários têm em vista apenas a si mesmo, é egoísmo; quando se sofre pelos outros, é caridade: são estes os preceitos do Cristo.

A anorexia poderia ser encarada como uma prática de suicídio. Uma grande parte das pessoas que tem este problema cita que “seria mais fácil para todos se morresse”.

Não devemos julgar este ou aquele tipo de pensamento. Devemos nos conduzir e conduzir o anoréxico ao pensamento futuro, a mostrar-lhe que esta atitude terá consequência, e já tem consequências. Seus familiares e amigos temem por seu desencarne e sofrem também por esta doença. As consequências futuras para o doente, ele também deverá passar por provas futuras para correção dos atos falhos (como todos nos em tantos outros âmbitos).

Por outro lado, é necessário considerar que muitas vezes o pensamento alheio ao doente detém a causa, como por exemplo, o excesso de zelo com a alimentação, a exposição de uma criança às restrições alimentares, argumentando-se que isso é ou não saudável.

Restringindo-se na alimentação para fazer um regime, ligar muito mais a forma que ao espírito diante dos jovens também são exemplos, e estes exemplos são seguidos pelos mais jovens. Orientar mas não aterrorizar. Balancear as necessidades, cuidar mais para que saiamos com as crianças para brincar. Se eles se movimentam, não precisam ser restritos em sua alimentação. Buscar o equilíbrio, entre a saúde proporcionada pelo alimento e o gasto da energia acumulada por alimentar-se.

Devemos, portanto, moderar nossos pensamentos e atitudes. Saber que o corpo nada vale sem um espírito. E que cada indivíduo possui suas próprias experiências a superar, e que não podemos julgar qualquer pessoa que seja, em bonito ou feio, gordo ou magro. Devemos considerar sua individualidade sem julgamentos de qualquer espécie.

Quando tivermos em nossa mente que a vida não cessa com o desencarne, tenderemos a utilizar melhor este meio de comunicação provisório que é nosso corpo, não tentando dominá-lo e fazer com ele o que bem entendermos como cirurgias estéticas, ou atos desnecessários.

Saberemos que, independente da forma, devemos cuidar da saúde para continuarmos trabalhando em nosso progresso espiritual, porém sem destruí-lo, pois será merecidamente cobrado se assim o fizermos.

É necessário auxiliar pessoas que passam pela Anorexia, cultivando entre elas a certeza de que não há juízo final para o espírito. E para os que não têm este transtorno, preventivamente, cultivar os bons hábitos e pensamentos, e assim não nos ligarmos em definitivo com as normas sociais, e com os preconceitos.

E para nós mesmos, utilizarmos o espelho, não para perguntar se estamos bonitos ou feios, mas pra nos questionar:

“Espelho, espelho meu, me mostre meus defeitos morais para corrigí-los com a ajuda de Deus?”

Fala MEU! Edição 82, ano 2010

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