Autor: Felipe Gallesco
Há alguns anos, participei de um evento chamado EECDME, que significa Encontro Estadual de Comissão Diretora de Mocidade Espírita, realizado pelo departamento de mocidade da União das Sociedades Espíritas (U.S.E), no Estado de São Paulo.
O evento foi realizado numa escola pública, durante dois dias inteiros e tinha aproximadamente 100 participantes, mais os trabalhadores. Participaram pessoas de todas as regiões do estado.
Nos estudos em sala, nas dinâmicas ou conversas que aconteciam nos intervalos das atividades, o foco estava em como melhorar a organização dos trabalhos para os jovens e eram debatidos problemas, sucessos e exemplos reais.
Em uma das conversas, uma história narrada pela dirigente me chocou mais que tomar banho gelado por dois dias. Passei os anos seguintes pensando sobre o problema que segue.
No litoral existia uma casa espírita, onde o departamento jovem realizava reuniões aos sábados. O grupo não era muito grande, cerca de 10 pessoas e, com exceção da dirigente, todos estavam na faixa da adolescência.
Ela buscava e levava os participantes para casa espírita, apresentava o tema, fazia as observações e indicava quem deveria fazer a prece de abertura e encerramento. Nenhum jovem demonstrava iniciativa para discutir ou realizar as atividades, mas todos diziam gostar das reuniões.
A história foi contada em tom de desabafo, por se sentir sobrecarregada, cansada, desmotivada. Nas vezes em que não podia conduzir o grupo, as reuniões não aconteciam e existia o medo do trabalho acabar no futuro.
Os ouvintes, entre eles eu, que também me vi diversas vezes na mesma situação, começamos a apresentar sugestões tais como, realizar mais dinâmicas, tentar chamar mais jovens com perfis de liderança, ficar em silêncio até alguém se manifestar, e a conversa seguiu ainda por um bom período da tarde.
Não foram discutidas as causas do problema. Depois de anos pensando sobre o assunto, conclui ser devido à insegurança dos jovens, e que essa situação devia ocorrer com relativa frequência em outras casas espíritas.
Se existe alguém que expõe, explica, se comunica bem, os jovens constroem a falsa crença de não conseguirem agregar com a mesma qualidade, ficam com medo de dizer o que pensam e receber críticas ou risos. Preferem só ouvir e se isolar.
Esse comportamento parte também do suposto que, se alguém já faz tudo, não há necessidade de se fazer mais nada. É um problema cultural dos grupos que precisa ser modificado para obter uma resposta diferente.
A melhor forma para resolver é trabalhar a confiança dos participantes com assuntos que eles se sintam seguros para comentar. Se a preferência é por futebol, por exemplo, que estudem esse assunto em uma ou algumas reuniões, mesmo que o tema não possa ser analisado na visão espírita.
No grupo onde frequento, um amigo, na sua primeira exposição dentro da reunião de mocidade, pediu para falar sobre Fórmula 1. Era o único assunto que ele sentia confiança no conhecimento que tinha. Concordamos. Alguns anos depois ele palestrava sobre Espiritismo em diferentes locais.
É importante também conduzir as discussões para assuntos do cotidiano, trazer vivências e permitir que os participantes opinem e troquem experiências, sem medo de represálias ou julgamentos. Pessoas amadurecem individualmente e em grupos.
Os jovens se tornam mais ativos nas reuniões e casas espíritas quando percebem que agregam valor ao local, que participam das tomadas de decisões e que não são tratados como crianças.
A mudança de cultura é um processo gradual, que leva certo tempo até começar a aparecer resultados positivos.
Admiro a postura da dirigente por ter compartilhado o caso e tenho certeza de que, pelos anos que transcorreram, aquele grupo está em um momento diferente atualmente.