Autor: Rogério Coelho
As razões alegadas para condenar as relações com os Espíritos não resistem a um exame sério.
(…) repelir as comunicações mediúnicas é repudiar o meio mais poderoso de instruir-se
Allan Kardec [1]
A Comunicabilidade dos Espíritos, consequência imediata da Imortalidade da Alma, são um e outro os dois pontos básicos do Espiritismo, nos quais está ancorado o aspecto CONSOLADOR dessa Doutrina maravilhosa. E não é sem razão que Jesus profetizou[2] o seu advento com tal identificação: “Eu rogarei ao Pai, e Ele vos dará outro CONSOLADOR…”
Afinal, não é um grande consolo ter a certeza absoluta de que as pessoas que amamos e que nos antecederam na viagem de volta para Casa, no Mundo Maior, não estão perdidas do Lado de Lá?! Não é uma boa-nova saber que é apenas uma questão de tempo para que se estabeleça o reencontro feliz com os que se nos vinculam nas expressões de carinho?!
Quando comumente ouvimos dizer: “perdi fulano”, referindo-se à “morte” de alguém, é evidente que quem assim se pronuncia, não detém o conhecimento espírita. Da mesma forma quando também dizem: “Ah! coitado! descansou! (?)”.
Tais criaturas – desinformadas – não sabem que existem muitos Espíritos rogando a reencarnação para que, uma vez ergastulados no corpo somático, possam descansar um pouco, uma vez que do Lado de Lá se sentem muito cansadas, estafadas, esgotadas…
Em sua portentosa e singular série, André Luiz através da abendiçoada e também inigualável mediunidade de nosso saudoso Chico Xavier, desvela algumas faces do Mundo Espiritual aos nossos olhos e então, podemos perceber, ainda que superficialmente, a complexidade dos trabalhos à disposição de quem os deseja executar. Portanto, lugar de descanso, o Outro Lado não é, absolutamente… E pelo “andar da carruagem”, muitos desses Espíritos que solicitaram o reingresso no corpo físico para descansar já estão por aqui, porque o que tem de gente “à toa na vida vendo a banda passar”, (repararam as multidões que se embarafustam no carnaval? Dá para quantificar?” Mas, deixemo-los de lado, porque na verdade o que vai mesmo “sambar” para tais é a possibilidade de ascensão espiritual, e voltemos ao nosso tema: “Comunicabilidade dos Espíritos”.
A Comunicabilidade dos Espíritos é um fato comprovado até mesmo na Bíblia ancestral que muitos só carregam debaixo do braço, mas não deixam penetrar no cérebro o seu conteúdo, perdidos que estão nos embaraços e prejuízos da “letra que mata”.
Deliciemo-nos com a lógica insofismável do ínclito mestre lionês quando ele analisa as “anêmicas” e infundadas argumentações desses líderes espiritofóbicos, mostrando-lhes a incoerência em que se locupletam e que sempre começam por dizer que Moisés proibiu a mediunidade, esquecendo-se, (de propósito), que existem duas partes distintas na lei de Moisés: a Lei de Deus propriamente dita, promulgada no Monte Sinai, (por sinal através de um fenômeno mediúnico de pirografia), e a lei civil ou disciplinar, apropriada aos costumes e caráter do povo. A primeira, [a Lei de Deus], é invariável, ao passo que a outra [a lei civil], se modifica com o tempo. E a proibição de se comunicar com os “mortos” é do âmbito desta última, já revogada pelo próprio Moisés, quando em sua luminosa aparição junto com Elias no Monte Tabor, ante o assombro de Pedro, Tiago e João, testemunhas oculares do fato, conversou com Jesus, sobre os Seus últimos momentos no planeta e coroamento de Sua missão junto a nós, inaugurando, assim a era da mediunidade.
Sigamos, pois, nesse passo, o luminoso raciocínio do incomparável mestre lionês[3]: “(…) se Moisés proibiu evocar os mortos, é que estes podiam vir, pois do contrário inútil fora a proibição. Ora, se os mortos podiam vir naqueles tempos, também o podem hoje; e se são Espíritos de mortos os que vêm, não são exclusivamente demônios. Demais, Moisés de modo algum fala nesses últimos.
É duplo, portanto, o motivo pelo qual não se pode aceitar logicamente a autoridade de Moisés na espécie, a saber: — primeiro, porque a sua lei não rege o Cristianismo; e, segundo, porque é imprópria aos costumes da nossa época. Mas, suponhamos que essa lei tem a plenitude da autoridade por alguns outorgada, e ainda assim ela não poderá, como vimos, aplicar-se ao Espiritismo. É verdade que a proibição de Moisés abrange a interrogação dos mortos, porém de modo secundário, como acessória às práticas da feitiçaria. O próprio vocábulo interrogação, junto aos de adivinho e agoureiro, prova que entre os hebreus as evocações eram um meio de adivinhar; entretanto, os espíritas só evocam mortos para receber sábios conselhos e obter alívio em favor dos que sofrem, nunca para conseguir revelações ilícitas. Certo, se os hebreus usassem das comunicações como fazem os espíritas, longe de proibi-las, Moisés acoroçoá-las-ia, porque o seu povo só teria que lucrar.
(…) Quando a evocação é feita com recolhimento e religiosamente, quando os Espíritos são chamados, não por curiosidade, mas por um sentimento de afeição e simpatia, com desejo sincero de instrução e progresso, não vemos nada de irreverente em apelar-se para as pessoas mortas, como se fizera com os vivos. Há, contudo, outra resposta peremptória a essa objeção, e é que os Espíritos se apresentam espontaneamente, sem constrangimento, muitas vezes mesmo sem que sejam chamados. Eles também dão testemunho da satisfação que experimentam por comunicar-se com os homens, e queixam-se às vezes do esquecimento em que os deixam. Se os Espíritos se perturbassem ou se agastassem com os nossos chamados, certo o diriam e não retornariam.
Ainda outra razão é alegada: — as almas permanecem na morada que a justiça divina lhes designa — o que equivale dizer no Céu ou no inferno. Assim, as que estão no inferno, de lá não podem sair, posto que para tanto a mais ampla liberdade seja outorgada aos demônios. As do Céu, inteiramente entregues à sua beatitude, estão muito superiores aos mortais para deles se ocuparem, e são bastantemente felizes para não voltarem a esta terra de misérias, no interesse de parentes e amigos que aqui deixassem. Então essas almas podem ser comparadas aos nababos que dos pobres desviam a vista com receio de perturbar a digestão. Mas se assim fora essas almas se mostrariam pouco dignas da suprema bem-aventurança, transformando-se em padrão de egoísmo! Então é o caso de dizer: se as almas não podem vir, não há de que recear pela perturbação do seu repouso.
Mas aqui reponta outra dificuldade: se as almas bem-aventuradas não podem deixar a mansão gloriosa para socorrer os mortais, por que invoca a Igreja a assistência dos santos que devem fruir ainda maior soma de beatitude?! Por que aconselha invocá-los em casos de moléstia, de aflição, de flagelos? Por que razão e segundo essa mesma Igreja os santos e a própria Virgem aparecem aos homens e fazem milagres? Estes deixam o Céu para baixar à Terra; entretanto os que estão menos elevados não o podem fazer!
Que os cépticos neguem a manifestação das almas vá, visto que nelas não acreditam; mas o que se torna estranhável é ver encarniçar-se contra os meios de provar a sua existência, esforçando-se por demonstrar a impossibilidade desses meios, aqueles mesmos cujas crenças repousam na existência e no futuro das almas! Parece que seria mais natural acolherem como benefício da Providência os meios de confundir os cépticos com provas irrecusáveis, pois que são os negadores da própria religião. Os que têm interesse na existência da alma deploram constantemente a avalancha da incredulidade que invade, dizimando-o, o rebanho de fiéis. Entretanto, quando se lhes apresenta o meio mais poderoso de combatê-la, recusam-no com tanta ou mais obstinação que os próprios incrédulos. Depois, quando as provas avultam de modo a não deixar dúvidas, eis que procuram como recurso de supremo argumento a interdição do assunto, buscando, para justificá-la, um artigo da lei mosaica do qual ninguém cogitara, emprestando-lhe, à força, um sentido e aplicação inexistentes. E tão felizes se julgam com a descoberta, que não percebem que esse artigo é ainda uma justificativa da Doutrina Espírita.
Todas as razões alegadas para condenar as relações com os Espíritos não resistem a um exame sério. Pelo ardor com que se combate nesse sentido é fácil deduzir o grande interesse ligado ao assunto. Daí a insistência. Em vendo esta cruzada de todos os cultos contra as manifestações, dir-se-ia que delas se atemorizam.
O verdadeiro motivo poderia bem ser o receio de que os Espíritos muito esclarecidos viessem instruir os homens sobre pontos que se pretende obscurecer, dando-lhes conhecimento, ao mesmo tempo, da certeza de outro mundo, a par das verdadeiras condições para nele serem felizes ou desgraçados. O culto que estiver com a verdade absoluta nada terá que temer da luz, pois a luz faz brilhar a verdade e o demônio nada pode contra esta.
Repelir as comunicações de além-túmulo é repudiar o meio mais poderoso de instruir-se, já pela iniciação nos conhecimentos da vida futura, já pelos exemplos que tais comunicações nos fornecem. A experiência nos ensina, além disso, o bem que podemos fazer, desviando do mal os Espíritos imperfeitos, ajudando os que sofrem a desprenderem-se da matéria e a se aperfeiçoarem. Interdizer as comunicações é, portanto, privar as almas sofredoras da assistência que lhes podemos e devemos dispensar”.
Referências
[1] – KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. 51.ed. Rio [de Janeiro]: FEB, 2003, 1ª. parte, cap. XI, item 15, § 1º.
[2] – João, 14:16.
[3] – KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. 51.ed. Rio [de Janeiro]: 2003, 1ª parte, cap. 11, itens 8, 10 a 15, p. 161-165.
O consolador – Ano 17 – N 820 – Especial.