Autor: Ricardo Baesso de Oliveira
A desencarnação na infância coloca-nos diante da seguinte questão: o que se passa com o Espírito que, tão precocemente, deixa os fluidos terrenos?
De acordo com Allan Kardec, o Espírito de uma criança morta em tenra idade só recobrará a lucidez primitiva quando desaparecer toda a ligação entre o espírito e o corpo. [i]
A ligação a que se refere Kardec é de natureza mental. Durante o período de ligação ao corpo, verificado no processo gestacional e, nos anos vividos, depois do nascimento, o Espírito desvinculou-se parcial e temporariamente da realidade espiritual, adaptando-se psiquicamente à corporeidade. A libertação desses condicionamentos mentais não se verificará de forma imediata, excetuando situações especiais relacionadas a entidades nobres e muito lúcidas.
Segundo a literatura espírita, três situações podem se identificar com o Espírito que vem a desencarnar no período de infância.
Primeira possibilidade
O Espírito retoma de imediato a sua personalidade de adulto, geralmente a da última encarnação. André Luiz comenta que quando o Espírito já alcançou elevada classe evolutiva, assumindo o comando mental de si mesmo, adquire o poder de facilmente desprender-se das imposições da forma, superando as dificuldades da desencarnação prematura. Isso pode dar-se com grandes almas que renasceram na Terra por brevíssimo prazo, simplesmente com o objetivo de acordar corações queridos para a aquisição de valores morais, recobrando, logo após o serviço levado a efeito, a respectiva apresentação que lhes era costumeira.[ii]
Segunda possibilidade
Retornar brevemente à Terra para uma nova experiência corpórea. Não parece ser tão raro que Espíritos mortos em tenra idade tenham um curto período de erraticidade (meses ou poucos anos), com regresso ao planeta, muitas vezes reencarnando na mesma família.
Hernani Guimarães Andrade estudou oito casos de indivíduos que se lembraram de fatos de encarnações prévias e, após minuciosa pesquisa, acreditou ter dados suficientes para autenticar os fenômenos. Desses oito casos, quatro se relacionavam a Espíritos que haviam desencarnado na infância e regressaram, após breve intervalo de tempo, na mesma família, sendo que três voltaram ao convívio dos mesmos pais, ou seja, eram irmãos deles próprios. [iii]
Terceira possibilidade
Manter, por um espaço relativo de tempo, a forma infantil, submetendo-se a um processo natural de desenvolvimento “físico” e mental, à semelhança do que se verifica na dimensão física. A criança cresce em estatura e desenvolvimento cognitivo, aprende a ler e escrever, se escolariza, e adquire habilidades que vão capacitá-la a avançar em sua senda evolutiva. A literatura mediúnica se reporta a colônias espirituais especializadas nesse labor.
Ernesto Bozzano se reporta à mensagem mediúnica de uma senhora que teve a infelicidade de perder dois filhos ainda muito pequenos. Anos mais tarde, ela, por sua vez, retorna à dimensão espiritual. Durante o desligamento perispiritual, ela identifica dois belos mancebos que vêm recebê-la. Algo de familiar no semblante deles, mas não se recorda de havê-los conhecido na Terra. Mas quando eles se aproximam mais, ela, então, os reconhece: seus filhos amados que haviam se tornado homens feitos. [iv]
Lembra André Luiz que almas ainda encarceradas no automatismo inconsciente acham-se relativamente longe do autogoverno. Jazem conduzidas pela Natureza, à maneira das criancinhas no colo maternal. Não sabem desatar os laços que as aprisionam aos rígidos princípios que orientam o mundo das formas e, por isso, exigem tempo para se renovarem no justo desenvolvimento. Comenta ainda que é por esse motivo que, muitas vezes, não se pode prescindir dos períodos de recuperação para quem se afasta do veículo físico, na fase infantil, de vez que, depois do conflito biológico da reencarnação ou da desencarnação, para quantos se acham nos primeiros degraus da conquista de poder mental, o tempo deve funcionar como elemento indispensável de restauração. E a variação desse tempo dependerá da aplicação pessoal do aprendiz à aquisição de luz interior, através do próprio aperfeiçoamento moral. [v]
No entanto, o mais importante é que, independente da opção em que o Espírito esteja inserido, ele se encontrará sob a amorosa supervisão de almas queridas que velarão por ele, encaminhando-o da melhor maneira possível. Kardec lembra que a alma encontra no mundo dos Espíritos os parentes que ali a precederam, pois eles vêm recebê-la e ajudam-na em sua readaptação à nova experiência de vida. [vi]
Referências
[i] O Livro dos Espíritos, item 381
[ii] Entre a Terra e o Céu, cap. X
[iii] Reencarnação no Brasil
[iv] A crise da morte, Bozzano
[v] Entre a Terra e o Céu, cap. X
[vi] O que é o Espiritismo, cap. 2, item 153
O consolador – Artigos