Autor: Joelson Pessoa
“A desigualdade social é obra do homem e não de Deus”.
“Desaparecerá quando o egoísmo e o orgulho deixarem de predominar. Restará apenas a desigualdade do merecimento.” – O Livro dos Espíritos questões 806 / 806-a
Poucos temas são tão perigosos hoje, quanto discutir desigualdade social, por provocar paixões e ressentimentos nos dois principais partidários que se interessam pelo gravíssimo problema: os socialistas e os liberais.
Sem contestação inteligente possível, a desigualdade social é uma calamidade social, só não é maior que o materialismo, por ser dele, o fruto tóxico .
Não abordaremos o problema pelo viés comunista. Os espíritos demonstraram a Kardec, pela lógica, que o sistema comunista é insustentável (questão 816 do L.E.) e (O E.S.E., Cap 16, item 8).
O Brasil e o ocidente, no entanto, estão muito longe do comunismo, estamos sob o sistema capitalista e, neste sistema, o Brasil figura entre os países mais desiguais no ranking mundial. Apresentamos um notável progresso na redução da desigualdade entre 2004 à 2014: (http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=27000), e atualmente, voltamos a piorar. Em Maio deste ano atingimos o maior índice de concentração de renda (desigualdade) desde que o indicador passou a ser medido.
Vamos então pensar o problema da desigualdade social com a contribuição da filosofia espírita, e encontraremos a causa dessa mazela, em grande parte, na condição moral materialista da humanidade, que manifesta-se, pelo apego às coisas materiais e indiferença ao sofrimento do próximo à nossa volta.
Este apego, é a própria materialização do egoísmo, que exige tudo para si, e do orgulho, que se compraz em qualquer coisa que traz a sensação de importância e da superioridade sobre os outros, e que, na falta de legítimas qualidades intelectuais e morais para a real superioridade, a maioria se contenta com as ilusões decorrentes das vantagens materiais.
Aqui repousa o materialismo, maquiado de capitalismo, propagando como pandemia através da degeneração do consumo, em consumismo.
Sobre o Materialismo
“Pela crença no nada, o homem concentra forçosamente todos os seus pensamentos na vida presente; não se poderia, com efeito, logicamente se preocupar com um futuro que não se aguarda. Esta preocupação exclusiva com o presente conduz naturalmente a pensar em si antes de tudo; é portanto o mais poderoso estimulante do egoísmo, e o incrédulo é consequente consigo mesmo quando chega a esta conclusão: Gozemos enquanto aqui estamos, gozemos o máximo possível visto que depois de nós está tudo acabado; gozemos depressa, porque não sabemos quanto isso durará; e a esta outra, muito mais grave para a sociedade: Gozemos à custa de qualquer um; cada um por si; a felicidade, aqui embaixo, é do mais esperto. Se o respeito humano retém alguns, que freio podem ter aqueles que nada temem? Dizem a si mesmos que a lei humana não atinge senão os inábeis; é por isso que aplicam seu gênio aos meios de se esquivar dela. Se há uma doutrina nociva e antissocial, é seguramente a do niilismo [néantisme], porque ela rompe os verdadeiros laços da solidariedade e da fraternidade, fundamentos das relações sociais.” – O Céu e o Inferno, Cap 1.
Sobre o Capitalismo
“Sem dúvida, pelos arrastamentos a que dá causa, pelas tentações que gera e pela fascinação que exerce, a riqueza constitui uma prova muito arriscada, mais perigosa do que a miséria. É o supremo excitante do orgulho, do egoísmo e da vida sensual. É o laço mais forte que prende o homem à Terra e lhe desvia do céu os pensamentos. – O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap 16, item 7
“Sendo o homem o depositário, o administrador dos bens que Deus lhe pôs nas mãos, contas severas lhe serão pedidas do emprego que lhes haja ele dado, em virtude do seu livre-arbítrio. O mau uso consiste em os aplicar exclusivamente na sua satisfação pessoal; bom é o uso, ao contrário, todas as vezes que deles resulta um bem qualquer para outrem.
A riqueza concentrada em uma mão deve ser qual fonte de água viva que espalha a fecundidade e o bem-estar ao seu derredor. Ó vós, ricos, que a empregardes segundo as vistas do Senhor! O vosso coração será o primeiro a dessedentar-se nessa fonte benfazeja; já nesta existência fruireis os inefáveis gozos da alma, em vez dos gozos materiais do egoísta, que produzem no coração o vazio. Vossos nomes serão benditos na Terra e, quando a deixardes, o soberano Senhor vos dirá, como na parábola dos talentos: “Bom e fiel servo, entra na alegria do teu Senhor.” – O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap 16, item 13
Sobre o Consumismo
“A civilização, criando novas necessidades, não é a fonte de novas aflições?
— Os males deste mundo estão na razão das necessidades artificiais que criais para vós mesmos. ” (questão 926 L.E.)
O consumismo (vício de consumo) é um dos excessos do capitalismo, entorpecente moral que serve ao materialismo, chafurdando as consciências na matéria. Os investidores, para lucrar ilimitadamente, corromperam os valores e costumes, doutrinando as pessoas para limitarem suas existências a uma finalidade: consumir. Consumir muito. Consumir tudo. Consumir sobretudo o que não é necessário (releia a questão 926, acima) , e graças ao marketing, somos seduzidos a crer que o supérfluo é indispensável. Vivemos a época em que as crianças e jovens chegam à idade adulta, solapados de deficiências morais, pela ausência dos pais, que, para pagarem todos os boletos do consumismo, priorizam cansar-se em busca do ouro e da prata (Mateus 10 ; 9-15), em detrimento da educação moral dos filhos, não obstante estarem obesos de tanto comer e entediados por não terem o Espírito cultivado. Escolas, cuidadores e avós não suprem a falta dos pais.
Uma maneira louvável de se combater os excessos da desigualdade social, praticando justiça social, é através da remuneração descente a TODOS que trabalham.
“A todos os que podem dar, pouco ou muito, direi, pois: dai esmola quando for preciso; mas, tanto quanto possível, convertei-a em salário, a fim de que aquele que a receba não se envergonhe dela.” – O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap 16, item 13
Possuir e aumentar progressivamente o património material é meta de quem tem alguma ambição. Neste contexto quanto menos conceder para os outros, mais sobra para mim. Em boa medida, esse pensamento fez do salário mínimo no nosso país uma espécie de esmola regulamentada (só a escravidão era pior). A afirmação, não é pieguismo, dados oficiais apontam que 60% dos trabalhadores brasileiros ganham até 1 salário mínimo. E destes, cerca de 44 milhões, menos de 1 mínimo, em atividades informais. Como pode-se viver nessa condição? E isso não tem a ver apenas com a falta de qualificação e escolaridade do trabalhador (embora usada cinicamente como justificativa por quem paga), porque um balconista de comércio, ou uma costureira na oficina, por menor qualificação que o cargo exija, é aquela função indispensável para o empregador, e não deveria ser remunerado com um valor que é escandalosamente insuficiente para se manter minimamente com dignidade.
O D.I.E.E.S.E. refere que o valor do salário mínimo em Junho passado, deveria ser de $4.385,75 em vez do atual $ 998,00 (quase quatro vezes e meia menor que o devido). E acredite, ícones do capitalismo (que só falam em nome dos empregadores) protestaram quando governos anteriores corrigiram o salário mínimo com índices acima da inflação, para que ele chegasse ao que é hoje (eles queriam pagar menos). Em contrapartida os 6 homens mais ricos no Brasil, possuem o mesmo que os 100 milhões mais pobres. A falta de condições materiais para se desenvolver, com toda a coleção de privações e sofrimento decorrentes, num aspecto, constitui prova e expiação para aqueles que sofrem, testam a paciência, a resignação, a humildade, coloca a prova nossa inveja e inclinações para a cobiça ilícita. Contudo, não é menos verdade que, aqueles que possuem mais (riqueza e poder) estão também em provas e, nessa condição, para conduzir a coletividade à melhores condições. Não fazer todo o bem que se pode, quando dispõe dos meios para fazer, é como fazer o mal e por isso mesmo é condenável. Aqueles que desejam perpetuar a miséria e a extrema pobreza por meio de salários simbólicos, quando se poderia assalariar melhor, merecem ser repreendidos, denunciados e passar vergonha.
Devemos desenvolver mecanismos inteligentes que cerceie essas formas de violência, fortalecer instituições que representem os empregados. Protestar contra quantos estão desejosos de empobrecer as massas, para comprar barato o seu desespero. Há “notáveis” no mundo que defendem o distanciamento do povo à educação, que desejam a universidade apenas para sua classe, a fim de afogar as multidões na ignorância, para que estas não se rebelem perante as injustiças escabrosas que são submetidas. Precisamos sacudir a mente, saturada de jargões clichês e enxergar as lideranças sensíveis às pautas mais humanizadas (políticas sociais) e apoiá-las, políticas sociais são humanizadoras e muitos países europeus praticam elas, e consequentemente desempenham uma importância moral no cultivo da empatia, da justiça, da igualdade, da fraternidade, enobrecendo a sociedade, em vez daquelas outras lideranças que curvam-se somente à bolsa de valores e à especulação de alguns poucos gigantes avarentos.
Além do problema da concentração de renda, decorrente desse sistema desleal, apesar de legal (a escravidão foi legal por quase 400 anos), há outros fatos que colaboram para as desigualdades: a herança do escravagismo e a exclusão social após a abolição, que mutilou uma parcela expressiva da nossa sociedade; o machismo que manteve as mulheres perto da nulidade no âmbito da edificação social. Poderemos trazer algo sobre esses dois aspectos posteriormente.
Como o orgulho e o egoísmo deixarão de predominar?
Quando houver mais pessoas trabalhando e lutando pelo bem comum, mais que pelo bem privado.