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É Deus o culpado pelas mazelas humanas?

Autor: Anselmo Ferreira Vasconcelos

É desalentador observar que, mesmo em pleno terceiro milênio da era cristã, ainda ecoem dúvidas e comentários primários a respeito do papel de Deus em nossas existências. As mais recentes, aliás, foram manifestadas pelo músico britânico de rock, Noel Gallagher, ex-líder do Oasis. A propósito, não duvidaria que a sua ignorância sobre o tema fosse igualmente compartilhada por outros artistas. É bom frisar que essa classe profissional não é sinônimo – como querem alguns fazer transparecer nos dias presentes – de discernimento, espiritualidade ou religiosidade. Muito pelo contrário.

Afinal de contas, não raro somos surpreendidos por alguma “pérola de sabedoria” emanada desse grupo que agride o bom senso. Seja como for, Gallagher externou, em entrevista, toda a sua preocupação com a crise na Europa em decorrência da distorcida visão da religião, particularmente a mulçumana. Obviamente, não há como negar que o velho continente tem sido duramente atingido pela violência religiosa, especialmente a França e a Inglaterra. Os atentados terroristas deixaram, por sinal, profundas cicatrizes nos grandes centros e no dia a dia das pessoas. A desconfiança, o medo e a intranquilidade são, infelizmente, sentimentos ali observáveis.

Tomando esse cenário conturbado como ponto de partida, o Sr. Gallagher deixa muito claro o seu desconforto com a divindade: “Quem disse que eu tenho de acreditar em Deus? Quem inventou isso?” De fato, há nesse trecho da sua fala um abismo entre o músico e o Pai celestial, que ele não se esforça por disfarçar.

Demonstrando uma absoluta falta de compreensão acerca das manifestações do Criador, ele entende que o Sol, as estrelas estão lá no espaço, independentemente de Deus. Ou seja, na sua mente tais coisas estão lá por acaso… Nenhuma outra força ou poder maior atua sobre elas. No ápice da sua indignação, ele ainda desafia: “Se ele realmente existe, por que não impede as pessoas de promoverem massacres em nome dele?”

Diante de tamanha puerilidade podemos dizer que é muito fácil atribuir a Deus todas as mazelas humanas. Na falta de um raciocínio mais inquiridor responsabiliza-se, então, Deus, por todas as desgraças existentes no planeta. Mas e nós humanos que as cometemos: não temos nenhuma responsabilidade? Na ótica de Sr. Gallagher tal cogitação aparentemente não procede, já que Deus as “permite”. Na verdade, o músico não consegue entender que ele existe simplesmente por causa do amor do Pai.

Com efeito, um pouco de esforço intelectual poderia sanar muitas das equivocadas interpretações de Sr. Gallagher, bem como de outros que pensam como ele. Parece que toda essa gente ainda não entendeu que Deus não nos impõe nada. A prática da violência sob o seu nome é algo incompatível com a noção divina. Além disso, tais indivíduos esquecem que o livre-arbítrio é o instrumento – que todos nós possuímos em maior ou menor grau, inclusive o Sr. Gallagher – viabilizador da nossa liberdade de escolha.

Por meio desse mecanismo, Deus não nos dá todas as condições para que nos comportemos com dignidade e equilíbrio – e isso é fácil perceber. Mas se usamos a religião para nos distanciar do Pai, por exemplo, matando os nossos semelhantes, é porque essa não serve aos propósitos divinos ou não a soubemos entender. Uma religião que se preze liga os indivíduos ao Criador. Uma religião que se baseia em Deus não fomenta a violência entre irmãos. Aliás, uma boa religião – algo que Mr. Gallagher aparentemente abomina – fundada em princípios cristãos ou pelo menos de respeito ao próximo poderia ajudá-lo a iniciar uma jornada rumo ao entendimento das coisas transcendentais.

A partir daí as respostas e explicações provavelmente soariam mais palatáveis à capacidade de compreensão ainda pouco aguçada do músico. Contudo, sem o desejo sincero de buscar esse entendimento, como é o caso do espiritualmente iletrado artista, “não se sai do chão” e o pensamento, por extensão, não consegue conjecturar outras possibilidades. Desse modo, o Pai até deixa que os seus filhos rebeldes se afoguem no sangue das vítimas inocentes da ignorância.

Porém, muito antes ele os adverte, por meios sutis e/ou diretos, quanto às consequências daí advindas aos causadores das desgraças humanas. Para estes sobrará a realidade de uma triste colheita, isto é, provavelmente terão de enfrentar mais dia menos dia ambientes onde predominam “choro e ranger de dentes”. Mesmo nestas circunstâncias extremas, o Pai Celestial não abandona esses filhos ingratos e nem os fulmina. Ao contrário, dá-lhes meios para a devida recuperação e ajuste para que um dia possam também cooperar na sua obra magnânima.   

O consolador – Artigos

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