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Eles viverão

Autor: Irmão X (espírito)

Onze anos após a crucificação do Mestre, Tiago, o pregador, filho de Zebedeu, foi violentamente arrebatado por esbirros do Sinédrio, em Jerusalém, a fim de responder a processo infamante.

Arrancado ao pouso simples, depois de ordem sumária, ei-lo posto em algemas, sob o sol causticante.

Avançando ao pé do grande templo, na mesma praga enorme em que Estevão achara o extremo sacrifício, imensa multidão entrava-lhe a jornada.

Tiago, brando e mudo, padece, escarnecido.

Declaram-no embusteiro, malfeitor e ladrão.

Há quem lhe cuspa no rosto e lhe estraçalhe a veste.

– “A morte! à morte!…”

Centenas de vazes gritam inesperada condenação, e Pedro, que de longe o segue, estarrecido, fita o irmão desditoso, a entregar-se humilhado.

O antigo pescador e aprendiz de Jesus é atado a grande poste e, ali mesmo, sob a alegação de que Herodes lhe decretara a pena, legionários do povo passam-no pela espada, enquanto a turba estranha lhe apedreja os despojos.

Simão chora, sozinho, ao contemplar-lhe os restos, voltando, logo após, para o seu humilde refúgio.

Depois de algumas horas, veio a noite envolvente acalentar-lhe o pranto.

De rústica janela, o condutor da casa inquire o céu imenso, orando com fervor.

Por que a tempestade? por que a infâmia soez?

O pobre amigo morto era justo e leal…

Incapaz de banir a ideia de vingança, Pedro lembra os algozes em revolta suprema.

Como desejaria ouvir o Mestre agora!… que diria Jesus do terrível sucesso?!…

Neste instante, levanta os olhos lacrimosos, e observa que o Cristo lhe surge, doce, à frente.

É o mesmo companheiro de semblante divino.

Ajoelha-se Pedro e grita-lhe:

– Senhor! somos todos contados entre os vermes do mundo!… por que tanta miséria a se desfazer em lama? Nosso nome é pisado e o nosso sangue verte em homicídio impune… A calúnia feroz espia-nos o passo…

E talvez porque o mísero soluçasse de angústia, o Mestre aproximou-se e disse com carinho, a afagar-lhe os cabelos:

– Esqueceste, Simão? Quem quiser vir a mim carregue a própria cruz…

– Senhor! – retrucou, em lágrimas, o apóstolo abatido – não renego o madeiro, mas clamo contra os maus… Que fazer de Joreb, o falsário infeliz, que mentiu sobre nós, de modo a enriquecer-se? que castigo terá esse inimigo atroz da verdade divina?

E Jesus respondeu, sereno, como outrora:

– Jamais amaldiçoes… Joreb vai viver…

– E Amenab, Senhor? que punição a dele, se armou escuro laço, tramando-nos a perda?

– Esqueçamo-la em prece, porque o pobre Amenab vai viver igualmente…

E Joachib Ben Mad? não foi ele, talvez, o inspirador do crime? o carrasco sem fé que a todos atraiçoa? Com que horrenda aflição pagará seus delitos?

– Foge de condenar, Joachim vai viver…

– E Amós, o falso Amós, que ganhou por vender-nos?

– Olvidemos Amós, porque Amós vai viver…

– E Herodes, o rei vil, que nos condena a morte, fingindo ignorar que servimos a Deus?

Mas Jesus, sem turvar os olhos generosos, explicou simplesmente:

– Repito-te, outra vez, que quem fere, ante a lei será também ferido… A quem pratica o mal, chega o horror do remorso… E o remorso voraz possui bastante fel para amargar a vida… Nunca te vingues, Pedro, porque os maus viverão e basta-lhes viver para se alçarem à dor da sentença cruel que lavram contra eles mesmos… Simão baixou a face banhada de pranto, mas ergueu-a em seguida, para nova indagação…

O Senhor, entretanto, já não mais ali estava.

Na laje do chão só havia o silêncio que o luar renascente adornava de luz…

Nota

O conto acima, psicografado por Francisco Cândido Xavier, faz parte do livro Contos Desta e Doutra Vida.

Obra completa: https://www.febeditora.com.br/contos-desta-e-doutra-vida

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