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Espíritos impostores: O falso Padre Ambroise

Revista Espírita, julho de 1858

Um dos escolhos que apresentam as comunicações espíritas é o dos Espíritos impostores, que podem induzir em erro sob sua identidade, e que, ao abrigo de um nome respeitável, procuram passar seus grosseiros absurdos. Em muitas ocasiões, explicamos sobre esse perigo, que deixa de sê-lo para quem escrute, ao mesmo tempo, a forma e o fundo da linguagem dos seres invisíveis com os quais se comunicam. Não podemos repetir aqui o que dissemos a esse respeito: leia-se, atentamente, nessa Revista, em O Livro dos Espíritos e em nossa Instrução Prática, ver-se-á que nada é mais fácil que premunir-se contra semelhantes fraudes, por pouco que nisso se coloque de boa vontade. Reproduziremos somente a comparação seguinte, que citamos em alguma parte: Suponde que, num quarto vizinho ao que estais, estejam vários indivíduos que não conheceis, que não podeis ver, mas que ouvis perfeitamente; não seria fácil reconhecer, pela sua conversação, se são ignorantes ou sábios, homens honestos ou malfeitores, homens sérios ou estouvados, pessoas de boa companhia ou grosseiras?

Tomemos uma outra comparação, sem saímos da nossa humanidade material: suponhamos que um homem se apresente a nós sob o nome de um distinto literato; diante desse nome, o recebeis de início com todo o respeito devido ao seu mérito suposto; mas se ele se exprime como um carregador, reconhecereis logo o engano, e o expulsareis como impostor.

Ocorre o mesmo com os Espíritos: são reconhecidos pela sua linguagem; a dos Espíritos superiores é sempre digna, em harmonia com a sublimidade dos pensamentos; jamais a trivialidade macula-lhes a pureza. A grosseria e a baixeza de expressões não pertencem senão aos Espíritos inferiores. Todas as qualidades e todas as imperfeições dos Espíritos se revelam pela sua linguagem, e pode-se, com razão, aplicar-lhes este adágio de um escritor célebre: O estilo é o homem.

Essas reflexões nos foram sugeridas por um artigo que encontramos no Spiritualiste de Ia Nouvelle-Orléans, do mês de dezembro de 1857. É uma conversação que se estabeleceu, por intermédio do médium, entre dois Espíritos, um se dando o nome de padre Ambroise, o outro o nome de Clément XIV. O padre Ambroise foi um respeitável eclesiástico, falecido em Louisiane, no último século; era um homem de bem, de grande inteligência, e que deixou uma memória venerada.

Nesse diálogo, onde o ridículo disputa com o ignóbil, é impossível equivocar-se sobre a qualidade dos interlocutores, e é preciso convir que os Espíritos que o fizeram, tomaram bem pouca precaução para se mascararem; por que qual é o homem de bom senso que poderia, um só instante, supor que o padre Ambroise e Clément XIV pudessem se abaixar a tais trivialidades, que se parecem a um espetáculo teatral? Comediantes da mais baixa categoria, que parodiassem esses dois personagens, não se exprimiriam de outro modo.

Estamos persuadidos de que o círculo de Nouvelle-Orléans, onde o fato se passou, a compreendeu como nós; duvidar disso seria injuriá-los; lamentamos apenas que ao publicá-lo, não o fizeram seguir de algumas observações corretivas, que pudesse impedir, às pessoas superficiais, tomá-lo por uma amostra do estilo sério de além-túmulo. Mas, apressamo-nos em dizer que esse círculo não tem apenas comunicações desse gênero; tem também de outra ordem diferente, onde se encontram toda a sublimidade do pensamento e da expressão dos Espíritos superiores.

Pensamos que a evocação do verdadeiro e do falso padre Ambroise poderia oferecer um útil objeto de observação sobre os Espíritos impostores; foi, com efeito, o que ocorreu, como se pode julgar pela entrevista seguinte:

1. Peço a Deus Todo-poderoso permitir ao Espírito do verdadeiro padre Ambroise, falecido em Louisiane, no século passado, e que deixou uma memória venerada, se comunicar conosco. – R. Estou aqui.

2. Podeis dizer-nos se foi realmente vós quem tivestes, com Clément XIV, a conversa narrada no Spiritualiste de Ia Nouvelle-Orléans e da qual demos leitura em nossa última sessão? – R. Lamento os homens que foram vítimas dos Espíritos, lamentando igualmente a estes.

3. Qual é o Espírito que tomou- o vosso nome? – R. Um Espírito bufão.

4. E o interlocutor era realmente Clément XIV? – R. Era um Espírito simpático àquele que havia tomado o meu nome.

5. Como deixastes debitar semelhantes coisas sob vosso nome, e por que não viestes desmascarar os impostores? – R. Porque não posso sempre impedir os homens e os Espíritos de se divertirem.

6. Concebemos isso em relação aos Espíritos; mas quanto às pessoas que recolheram essas palavras são pessoas sérias e que não procuravam se divertir. – R. Razão a mais; deveriam bem pensar que tais palavras não poderiam ser senão a linguagem de Espíritos zombeteiros.

7. Por que os Espíritos não ensinam em Nouvelle-Orléans, princípios em tudo idênticos aos que se ensinam aqui? – R. A Doutrina que vos foi ditada cedo lhes servirá; não haverá senão uma.

8. Uma vez que essa Doutrina deverá ser ensinada mais tarde, parece-nos que, se o fosse imediatamente, isso apressaria o progresso e evitaria, no pensamento de alguns, uma incerteza deplorável? – Os caminhos de Deus, frequentemente, são impenetráveis; não haverá outras coisas que vos parecem incompreensíveis nos meios que empregam para chegar aos seus fins? É preciso que o homem se exercite para distinguir o verdadeiro do falso, mas nem todos poderiam receber a luz subitamente sem se ofuscarem.

9. Podeis, eu vos peço, dizer-nos sua opinião pessoal sobre a reencarnação? – Os Espíritos são criados ignorantes e imperfeitos: uma única encarnação não poderá bastar-lhes para tudo aprenderem; é preciso que se reencarnem, para aproveitarem as bondades que Deus lhes destina.

10. A reencarnação pode ocorrer sobre a Terra, ou somente em outros globos? – R. A reencarnação se dá segundo o progresso do Espírito, em mundos mais ou menos perfeitos.

11. Isso não nos diz claramente se ela pode ocorrer sobre a Terra? – R. Sim, ela poderá ter lugar sobre a Terra; e se o Espírito a pede como missão, isso será mais meritório para ele do que pedir para avançar mais depressa em mundos mais perfeitos.

12. Pedimos a Deus Todo-poderoso permitir ao Espírito que tomou o nome do padre Ambroise, se comunicar conosco. – R. Estou aqui; mas não queirais me confundir.

13. Verdadeiramente, és tu o padre Ambroise? Em nome de Deus, peço dizer a verdade. – R. Não.

14. Que pensas daquilo que disseste sob o seu nome? – R. Penso como pensaram aqueles que me escutaram.

15. Por que te serviste de um nome tão respeitável para dizer semelhantes tolices? R- Os nomes, aos nossos olhos, nada são: as obras são tudo; como se podia ver o que eu era pelo que eu dizia, não atribuí consequência ao empréstimo desse nome.

16. Por que, em nossa presença, não sustentas mais tua impostura? – R. Porque minha linguagem é uma pedra de toque com a qual não podeis vos enganar.

Nota. – Foi-nos dito, várias vezes, que a impostura de certos Espíritos é uma prova para o nosso julgamento; é uma espécie de tentação que Deus permite, a fim de que, como disse o padre Ambroise, o homem possa se exercitar em distinguir o verdadeiro do falso.

17. E teu companheiro Clément XIV, que pensas dele? -Não vale mais do que eu; ambos temos necessidade de indulgência.

18. Em nome de Deus Todo-poderoso, peço-lhe que venha. – R. Estou aqui desde que o falso padre Ambroise chegou.

19. Por que abusaste da credulidade de pessoas respeitáveis para dar uma falsa ideia da Doutrina Espírita? – R. Por que se é propenso a faltas? É porque não se é perfeito.

20. Não pensastes, ambos, que um dia vosso embuste seria reconhecido, e que os verdadeiros padre Ambroise e Clément XIV não poderiam se exprimir como o fizestes? – R. Os embustes já foram reconhecidos e castigados por aquele que nos criou.

21. Sois da mesma classe dos Espíritos que chamamos batedores? – R. Não, porque é preciso ainda raciocínio para fazer o que fizemos em Nouvelle-Orléans.

22. (Ao verdadeiro padre Ambroise) Esses Espíritos impostores os veem aqui? – R. Sim, e sofrem com a minha visão.

23. Esses Espíritos estão errantes ou reencarnados? – R. Errantes; não seriam bastante perfeitos para se desligarem, se estivessem encarnados.

24. E vós, padre Ambroise, em qual estado estais? – R. Encarnado em um mundo feliz e sem nome para vós.

25. Nós vos agradecemos os esclarecimentos que consentistes em nos dar; sereis bastante bom para vir outras vezes entre nós, dizer-nos algumas boas palavras e nos dar um ditado que possa mostrar a diferença de vosso estilo com aquele que havia tomado o vosso nome? – R. Estou com aqueles que querem o bem na verdade.

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