Autor: Ricardo Orestes Forni
Através da religião, o homem aprofunda reflexões e mergulha no seu inconsciente, fazendo que ressumem angústias e incertezas, animosidades e tormentos que podem ser enfrentados à luz da proposta da fé, e que são lentamente diluídos, portanto, eliminados, a serviço do bem-estar pessoal, que se instala lentamente, tornando-o cada vez mais livre e, portanto, mais feliz
Joanna de Ângelis
A edição de julho de 2015 da revista Seleções READER´S DIGEST, páginas 72 a 79, traz uma reportagem com dalai-lama Tenzin Gyatso, de 80 anos de idade, sendo o 14º dalai-lama. Nascido no dia 6 de julho de 1935 no Tibete, foi reconhecido aos dois anos de idade como sendo a reencarnação do 13º dalai-lama. Entre as suas declarações, vamos destacar a seguinte: É claro que o conhecimento e a prática da religião são úteis, mas hoje já não bastam, como mostram, com clareza cada vez maior, exemplos no mundo inteiro. Isso é verdade em todas as religiões, inclusive no cristianismo e no budismo. Guerras foram travadas em nome da religião, “guerras santas”. Muitas vezes as religiões foram e ainda são intolerantes.
Por isso digo que, no século 21, precisamos de uma nova ética que transcenda todas as religiões. Muito mais importante do que a religião é nossa espiritualidade humana elementar. Ela é uma predisposição para o amor, a bondade e o afeto que todos temos dentro de nós, seja qual for a nossa religião. Pode-se viver sem religião, mas não se pode viver sem valores íntimos, sem ética.
Uma pergunta que o cristão raramente se faz é sobre qual a religião que Jesus professava quando encarnou entre nós para a execução da maior tarefa de amor de que se tem notícia sobre a face da Terra. Ele se colocava dizendo que estava a serviço de Deus sem mencionar religião alguma. “Eu e o Pai somos um”, o que levou a imaginação e interesses humanos a confundi-Lo com o próprio Deus, tendo sido decretado por homens falíveis a divindade Dele.
Em seguida, uma outra pergunta que deve se seguir a essa: qual a religião que Ele nos deixou? Deu alguma denominação, ou “cristianismo” foi uma criação do homem? Podemos afirmar com toda a certeza, porém, que nos legou um código de ética jamais visto com tal clareza até então, principalmente se tomarmos como referência o Sermão da Montanha.
Portanto, o dalai-lama está correto. Com ética no sentido de valores morais, o Espírito, dependendo da sua evolução, já reencarna. A religião, via de regra, é uma opção que vem a posteriori. Influência dos pais; livre escolha da própria pessoa; conveniências da situação em que o indivíduo está vivendo; influência de amigos; de paixões etc.
Através da religião a ética se manifesta. Ou será que não, mas sim através da religiosidade que são coisas absolutamente diferentes? Fico com essa última colocação devido ao ensinamento de Joanna de Ângelis quando ela nos diz: A religiosidade é uma conquista que ultrapassa a adoção de uma religião; uma realização interior lúcida, que independe do formalismo, mas que apenas se consegue através da coragem de o homem emergir da rotina e encontrar a própria felicidade. E encontra essa felicidade porque a consciência pacificada pelo dever cumprido pode ser alcançada sem religião nenhuma, apenas pelos valores éticos que cada um traz dentro de si, incorporados que foram por conquistas milenares ao longo do caminho evolutivo.
Quantos não ostentam uma religião e são a razão do sofrimento dos seus semelhantes? Que “batem no peito” e torturam animais e destroem a natureza através da poluição da atmosfera, de rios, de oceanos, de florestas que são dizimadas em busca da corrida tresloucada pelo dinheiro do mundo que permanecerá no mundo, sem que um único mísero centavo adentre o caixão onde o corpo sem vida repousa em direção ao aniquilamento total! Quantos não se apresentam como participantes de alguma religião e se transformam em instrumentos da corrupção ou se sujeitam a ela desesperados pelo lucro imediato com que os homens lhes acenam, amordaçando a própria consciência como se pudessem sufocá-la para sempre? Como se a morte nunca fosse convocá-los para o local da Justiça perfeita e incorrupta, onde mergulharão no inferno interior pela ausência dos valores éticos que resolveram ignorar ou nunca tenham tido interesse em adquiri-los, na tentativa vã de subornar a própria consciência?
Acertadamente afirma o dalai-lama que pode-se viver sem religião, mas não se pode viver sem valores íntimos, sem ética.
Antes de se tornar o Codificador da Doutrina Espírita, Allan Kardec era possuidor da ética suficiente que o fez escolhido para a missão de trazer aos homens uma filosofia de implicação moral que nos permite adquirir os valores éticos necessários a todos aqueles que se pronunciam como espíritas cristãos. Resta apenas a cada um indagar da própria consciência se temos aproveitado tal oportunidade, porque muito se pedirá a quem muito tiver sido dado…
O consolador – Artigos