Franz Schubert, o famoso autor da Sinfonia Inacabada, foi um músico filósofo que viveu simples e despretensiosamente, mas amando sempre a poesia e o lirismo.
Schubert impressionou de tal modo os grandes mestres da música de sua época, que o maravilhoso Schumann afirmou:
– O tempo, criador de inumeráveis belezas, jamais tornará a produzir outro Schubert.
Karl Kobald, profundo conhecedor da copiosa obra schubertiana, concluiu que a vida desse famoso compositor “foi uma visão interior; que sua obra foi realmente sua vida e que, deixando-se de parte a primeira infância de Schubert, passou ele os dias de seu viver musicando poesias e sonhando, impulsionado pela fantasia e por uma demoníaca natureza criadora”.
É natural, porém, que alguém indague acerca desta extravagante expressão de Karl Kobald – “demoníaca natureza criadora”. Sim, essa demoníaca natureza criadora outra coisa não é senão pujante mediunidade!
Lemos uma obra intitulada “A Religião da Música”, de Camille Mauclair, poeta que sente a música em toda a sua mais representativa linguagem angelical, divina, na qual há uma apreciação sua, aliás, muito interessante, e que vamos tentar reproduzir. Todo som, quando emitido, passa, desde logo, a ressoar no Universo, e suas vibrações ferem o éter, desde a sua origem, porque o movimento jamais cessa e as ondas sonoras se propagam até ao infinito. Todas as nossas sinfonias se reproduzem em mundos desconhecidos, como em fonógrafos prodigiosos, e do mesmo modo o eco da música que se faz, em outros planetas, deverá também chegar até nós.
E acrescenta Mauclair que, sem dúvida alguma, existem sinfonias em marcha por esse espaço incomensurável, tal como a luz de certas estrelas que ainda não chegou até nós…
Esses músicos geniais que de quando em quando surgem na face da Terra trazem, sem dúvida alguma, conhecimentos profundos das harmonias transcendentes, conhecimentos esses hauridos nas regiões siderais antes de seu reingresso em nosso mundo; e porque seus Espíritos possuem tão expressivo cabedal da arte dos sons, mais facilmente do que qualquer outro médium podem eles captar esses ecos vibratórios das sinfonias executadas em outros planetas e transmiti-Ias a nós, com as naturais deficiências oriundas da nossa ainda acanhada gama musical, aliada, igualmente, à nossa imperfeita instrumentalização.
E daí, naturalmente, a explicação por que muitas vezes atravessamos fases sem que gênios musicais apareçam no tablado do mundo. E isso sucede, ou porque não haja encarnado entre nós Espíritos capazes para essa, captação, ou porque, por motivos que’ desconhecemos, ainda não chegaram até nós às ondas vibratórias de imponentes sinfonias executadas em esferas longínquas!
Schubert, apesar de ter desencarnado com apenas 31 anos de idade, foi de uma produtividade espantosa.
Escreveu inúmeras canções, das quais são conhecidas apenas 603, sinfonias, em número de nove, trios, quartetos, sonatas, improvisos, fantasias, missas, etc. Toda a sua produção era recebida com geral agrado.
Viveu, podemos dizer assim, nos braços amorosos do sonho. Seu Espírito, seduzido pelas doces harmonias siderais, que soavam a seus ouvidos, mostrava-se indiferente às coisas da vida terrena.
Para enaltecer e exaltar o valor de Schubert basta que se lembre a famosa frase pronunciada por Beethoven, já às portas da morte: – “Em Schubert há verdadeiramente um lampejo divino.”
Franz Serafim Peter Schubert nasceu em Viena, em 31 de Janeiro de 1797.
Disse seu genitor, homem severo e por vezes rude, que seu filho contava oito anos de idade, quando o matriculou no curso de canto do Maestro Miguel Holzer, diretor do Coro de Lichtenthal, e que esse maestro lhe dissera, em certa ocasião, com lágrimas nos olhos, que jamais lhe fora dado ter um aluno como o pequeno Franz Peter. “Quando pretendia ensinar-lhe algo de novo, ele prontamente me advertia de que já sabia. De maneira que eu – continua o maestro – nada, em verdade, lhe ensinei; apenas me recreava com ele, admirando-o em silêncio. “
É que no Espírito de Schubert aos poucos ia aflorando os conhecimentos hauridos em existências pregressas, e essa manifestação positiva da reencarnação é ainda reforçada pelo relato de seu irmão mais velho, chamado Inácio. Foi ele quem o iniciou no estudo do piano, ficando assombrado, conforme expressão sua, quando, ao cabo de alguns meses, Franz lhe declarara que não mais necessitava de suas lições, pois que dali em diante ele por si mesmo saberia como familiarizar-se com a técnica do teclado. E, com efeito, tais progressos fêz em tão pouco tempo, que seu irmão foi forçado a reconhecer nele um mestre que o superava amplamente.
Aos onze anos possuía Schubert uma linda voz de soprano, de extensão notável e de expressão fascinante.
Em Outubro de 1808 vagara um lugar de soprano na Capela Imperial. Numerosos foram os concorrentes e entre eles estava o nosso Franz Serafim Peter Schubert.
Ao penetrar no recinto do concurso, trajando um fraque muito grande, de cor cinzenta já quase branca, produziu uma hilaridade geral entre os rapazes seus concorrentes.
Todos se divertiam à sua custa. Iniciou-se o exame. Vários jovens desfilaram diante da banca julgadora.
Quando foi apregoado o nome de Franz, todos os demais concorrentes, pela sua aparência grotesca, antegozavam um fracasso completo e preparavam-se para soltar estrepitosa gargalhada.
Logo, porém, que ele iniciou o solfejo da peça apresentada, e pelas respostas dadas, sem titubear, às perguntas então formuladas, ninguém mais pensou em rir-se dele. Os jovens estavam assombrados. Franz foi admitido imediatamente.
Schubert era um espírito superior, jamais se preocupava com o que os outros pensassem a seu respeito.
Não dava a menor importância às coisas terrenas, seu pensamento pairava em planos bem mais elevados.
Desconhecia o que fosse egoísmo, ambição e inveja, imperfeições essas de ordinário muito comuns em certos artistas. Quando seus amigos o visitavam, tomavam emprestado seus cadernos, prometendo logo devolvê-los.
Sucedia, porém, que quase sempre jamais os devolviam. Schubert não se preocupava com isso e acabava esquecendo- se a quem confiara esta ou aquela de suas famosas canções.
Consumia ele incrível quantidade de papel com suas produções musicais, escritas muitas vezes em pedaços de papel comum, por não dispor de recursos para adquirir papel apropriado, e as produzia com extraordinária rapidez, tal como acontece com os médiuns psicógrafos.
Schubert aproveitava-se das horas destinadas ao preparo dos deveres escolares para escrever suas músicas, com prejuízo, evidentemente, de seu progresso em latim e matemáticas. Seu pai, logo que descobriu a causa do seu não aproveitamento na escola, proibiu-lhe de compor música, mas nessa altura as asas do jovem artista eram já muito fortes e ele não podia absolutamente impedi-Ias de alçá-lo ao paraíso das sonoridades!
Realmente o Espírito de Schubert veio à Terra com a missão de transmitir-nos músicas para conforto de nossas almas e ele tinha necessidade de não perder tempo, porque seu estágio em nosso plano, bem pressentia ele, era tão somente de 31 anos! Era o médium das doces harmonias, dessas harmonias que tocam corações. Ele as recebia do Além e sentia-se no dever de distribuí-Ias com seus irmãos em Humanidade, sem se preocupar, de forma alguma, com as questões financeiras. Dinheiro, para ele, era como se não existisse. Trabalhava sem qualquer interesse material, era profundamente bom, sempre pronto a perdoar aos seus desafetos gratuitos.
À proporção que a gente se vai mergulhando na vida íntima de Franz Schubert, verifica, mais uma vez, inúmeros pontos de contacto entre os seus sentimentos e a sua maneira de proceder, com os do extraordinário médium Francisco Cândido Xavier. E’ que o verdadeiro médium há de ser um Espírito onde refulge a luz das verdades cristãs!
Ruczizka, professor de nomeada e a quem o jovem Schubert fora confiado para se aprofundar na teoria da música, escreveu: – “A este rapaz nada se lhe pode ensinar, ele tudo já aprendeu do bom Deus.”
Esta expressão de Ruczizka quer dizer bem claramente que Schubert nada aprendera com os homens.
Quem, pois, lhe transmitira tais conhecimentos musicais?
Seu cabedal relativo à arte musical é fruto, indiscutivelmente, de seus esforços, de sua dedicação em várias existências, e, quando seu Espírito se encontrava devidamente preparado não só nessa deliciosa arte, senão também no que tange à sua formação espiritual cristã, reencarnou, tornando-se, assim, uma antena extraordinariamente sensível para captar as maravilhosas harmonias siderais e, também, por seus próprios conhecimentos, em condições de transmiti-Ias ao mundo, com as deficiências naturais, em face da imperfeição dos meios de que dispunha para torná-las conhecidas em toda a sua pureza!
Por tudo isso Volf, ao ler muitos dos “Lieder” de Schubert, afirmou que “ele compunha em um estado de clarividência e sonambulismo, sob o poder de uma inspiração mais forte do que a sua vontade”.
Mary Tibaldi Chiese, autora da obra “Schubert, su Vida y su Obra”, conforme consta de “100 Músicos Imortais “, de Tenório d’Albuquerque, disse- que “esse musicista levou alguns “Lieder” para Volf examinar. O cantor, por estar atarefado, examinou-os no dia seguinte.
Selecionou um, mandou-lhe abaixar o tom e cantou-o depois.
“Ouvindo-o, Schubert, embevecido, exclamou: “- Verdadeiramente essa canção não é má. Quem é o seu autor?” capazes de compreender por si mesmos e de conceber grandes coisas. Ora, precisamente porque os julgam capazes, é que os Espíritos, quando querem executar certos trabalhos, lhes sugerem as ideias necessárias, e assim é que eles, às mais das vezes, são médiuns sem o saberem.
“Nesses momentos de inspiração, a alma de um autor, de um pintor, ou de um músico se torna mais livre e como que desprendida da matéria; recobra uma parte das suas faculdades de Espírito e recebe mais facilmente as comunicações dos outros Espíritos que a inspiram.”
Ora, Schubert, desde sua adolescência, foi um médium inspirado.
Vamos trasladar o que Karl Kobald escreveu relativamente ao autor da Sinfonia Inacabada: “Schubert, que não era mestre em tocar piano, como o foram Mozart e Beethoven, não leva em conta as exigências da técnica do virtuosismo, pois que em sua música para piano palpitam harmonias saturadas de sonoridades; nelas oscila a alma íntima, sonhadora, romântica, ensimesmada, e a beleza externa do tema central é o sintoma reflexivo de seu conteúdo espiritual. Tudo brota do seu interior. O lugar mais adequado para executar a música de Schubert, para piano, não é a sala de Concertos, e, sim, a casa de família, a tranquila habitação, onde um círculo de homens de igual sentir se manifesta na intimidade o maravilhosamente psíquico daquela música.”
Tenhamos bem em vista este final da apreciação insuspeita de Karl Kobald: – o maravilhosamente psíquico da música de Schubert!
Schubert teve pouca sorte em questões de amor, bem como em todas as coisas de sua vida terrena. Ele tinha a intuição de que a sua passagem pela Terra seria de curta duração e, talvez por isso mesmo, não desejasse desviar sua atenção para outros quefazeres, para só se entregar à composição de suas deliciosas músicas; o certo, no entanto, é que ele se conservou solteiro até seu último alento de vida.
A música schubertiana, diz-nos ainda Karl Kobald, quando Schubert tocava ao piano e Vogl cantava, não carecia de nenhum som material, as melodias vibravam em seus ouvidos como aparições de Espírito…
Houve um escritor, não espírita, que se expressou com relação a Schubert, de maneira muito interessante e sugestiva. E’ a seguinte: “No fundo de seu espírito residem sombrios pensamentos, a melancolia, a desesperação e o sentido trágico. Esta alma alta e pura, idealista, não se pode adaptar a este mundo, nem se satisfazer com os bens terrenos. Daí, pois, a aguda nostalgia desse mais além, que transmite um tom particular a todos seus sentimentos.”
Alguém disse que “Schubert se imolou à Natureza, e disse mais, que seu sacrifício tem grandeza, grandeza de fibra que nos toca as entranhas, não grandeza de espírito que exalta o valor e a fé, mas grandeza de humildade, grandeza de remissão, de pobreza, de piedade”.
Franz Schubert foi grande porque nunca se exaltou; foi grande porque não sabia mercadejar as suas produções musicais, colhidas nas esferas em que a pureza de sentimentos é tudo, em que o amor pelas coisas superiores é o ar dominante; foi grande porque suas músicas despertam entre os homens o encanto pelas coisas sublimes da verdadeira vida! Foi grande, repetimos, porque na sua humildade e no heroísmo de seu desprendimento das coisas terrenas, para bem cumprir sua missão de ofertar a todos em geral o bálsamo suavizante de sua música, que é um chamamento para o bem, para a verdade, para a luz, tornou-se ele por todo o sempre digno do nosso carinho e da nossa gratidão!
Tua música, Schubert, que fala a linguagem dos simples, é a voz do Alto a dizer à Humanidade que a morte não existe que a vida continua além da tumba, em sua marcha ascensional em busca de mais amor!
Fonte: Grandes vultos da humanidade.