Autor: Paulo da Silva Neto Sobrinho
A Ciência não é mais que o conjunto das concepções de um século, que a Ciência do século seguinte ultrapassa e submerge
Léon Denis
Introdução
É muito comum a uma classe de detratores do Espiritismo se apoiar no pai da Psicanálise, Sigmund Freud (1856-1939), como base para explicar os fenômenos espirituais.
Esse grupo é composto de pseudoparapsicólogos, todos de origem Católica, que, não tendo elementos na Parapsicologia para refutar a realidade da manifestação espiritual, recorrem ao tal de “Freud explica”, usando e abusando do inconsciente individual e do coletivo, como poderosos armamentos que, segundo eles, aniquilariam as teses espíritas.
A ligação que estamos fazendo à Igreja Católica não tem o sentido de denegrir essa milenar instituição religiosa, mas apenas mostrar a contradição desses nossos sistemáticos opositores. Apesar do catecismo católico ensinar que o homem tem uma alma e que ela após a morte do corpo físico, futuramente, quando do dia do juízo, irá ressuscitar, eles, os pseudo-parapsicólogos católicos, em tese contrária, dizem que “não existem espíritos humanos sem corpo material ou ressuscitado”. Veja bem, caro leitor, como tais idéias se justapõem às dos materialistas que não acreditam em qualquer coisa espiritual.
Oportuno seria colocarmos as observações de J. Herculano Pires, que, em vida, foi um estudioso da Parapsicologia, sobre essas pessoas:
Quando, pois, um pretenso parapsicólogo se propõe a “ensinar” que a parapsicologia nega a existência de espíritos, de comunicações espirituais, de princípios religiosos e filosóficos, como da reencarnação e o da existência de Deus, os seus diplomas e certificados não têm sequer o valor de atestado de informação sobre o assunto. (PIRES, 1987, p. 25).
É interessante como certas coisas acontecem. Vejamos:
Os fenômenos espíritas, que revelavam inteligência, não eram simples efeitos dos processos biológicos e fisiológicos. Eram fenômenos muito mais complexos, que podiam provir da mente ou das entranhas humanas, mas também podiam ser produzidos por forças ainda não suficientemente conhecidas, como o magnetismo natural, a eletricidade, energias e elementos procedentes de regiões ainda não devassadas da própria consciência humana. O inconsciente era uma incógnita. Kardec o abordou quando Freud estava ainda na primeira infância. Kardec deu à Revista Espírita, órgão que fundou para divulgar seus trabalhos e pesquisas de opiniões, o subtítulo de Jornal de Estudos Psicológicos, provando já estar convencido de que enfrentava os problemas do psiquismo humano. (PIRES, 1988, p. 54).
Tendo a Parapsicologia como origem os fenômenos espíritas, como explicar que alguns parapsicólogos hodiernos vêm negar tais fenômenos? A explicação é fácil, assim como o Espiritismo nasceu na França, também veio de lá a Parapsicologia reducionista de Robert Amadou, católico-tomista. Ela é a preferida dos nossos contraditores católicos que tentam, por todos os meios que lhes são possíveis, combater o Espiritismo, mas nós sabemos o por quê disso, pois “é fato bastante conhecido que o ponto de vista de cada qual influi fortemente sobre o ponto de vista de cada qual! Em outras palavras, o que se vê quando se observa, está condicionado pelo ponto em que nos colocamos quando observamos”. (WILKINSON, 2003, p. 210).
Esse fato nos faz acreditar ainda mais nos princípios espíritas, pois pensamos que se o Espiritismo não tivesse realmente algo de valor não seria tão sistematicamente atacado. E como cremos que a verdade não necessita ser imposta, que os que querem convencer aos outros que estão com ela, na realidade não estão, pois ela é tão cristalina que não necessita de absolutamente nada para convencer a não ser ela mesma.
Temos dito que se não existir alguma coisa após a nossa morte qual seria a utilidade de nascermos numa família? Poderíamos muito bem ter um comportamento igual ao dos animais, que nenhum vínculo familiar estabelece com sua prole e em sua maioria o relacionamento com os parceiros se resume apenas no ato de procriar.
Interessante também é que a maioria desses contraditores devem se julgar os únicos dotados de inteligência, já que só as teses que defendem são as verdadeiras, apesar de não estarem alinhadas, primeiro com seus princípios religiosos, segundo com os da Parapsicologia moderna.
Opiniões irretorquíveis sobre o Espiritismo
O professor Charles Richet, da Academia de Medicina de Paris, criador da Metapsíquica, origem da atual Parapsicologia, conforme Léon Denis, termina o seu artigo sob o título “Deve-se estudar o Espiritismo”, publicado nos “Annales des Sciences Psychiques”, em 1905, dessa forma:
“1º – Não há contradição alguma entre os fatos e teorias do Espiritismo e os fatos positivos estabelecidos pela Ciência. 2º – O número dos escritos, memórias, livros, narrações, notas, experiências, é tão considerável e firmado por autoridades tais, que não é lícito rejeitar esses inúmeros documentos sem um estudo aprofundado. 3º – A nossa ciência contemporânea se acha tão pouco adiantada ainda relativamente ao que serão um dia os conhecimentos humanos, que tudo é possível, mesmo o que mais extraordinário se nos afigura… Em lugar, portanto, de parecer ignorarem o Espiritismo, os sábios o devem estudar. Físicos, químicos, fisiologistas, filósofos, cumpre que se deem ao trabalho de tomar conhecimento dos fatos espíritas. Um longo e árduo estudo é necessário. Será indubitavelmente frutuoso”. (DENIS, 1987, p. 33).
E falando sobre as experiências de Willian Crookes, o renomado sábio inglês, afirma Richet que elas “são de granito” (PIRES, 1987, p. 83). Crookes realizou experiências relacionadas às materializações de Espíritos, tendo inclusive tirado várias fotografias daquele que se apresentava com o nome de Katie King, através da mediunidade de ectoplasmia de Florence Cook.
Herculano Pires nos informa que:
Charles Richet, prêmio Nobel de Fisiologia e fundador da Metapsíquica, discordante de Kardec, declarou no seu próprio Tratado de Metapsíquica, que Kardec era quem mais havia contribuído para o aparecimento das novas ciências, e lembrou que Kardec jamais fizera uma afirmativa que não estivesse provada em suas pesquisas. (PIRES, 1987, p. 55).
Deve-se a Joseph Banks Rhine, professor catedrático de filosofia e psicologia na Universidade de Duke, EUA, o surgimento da Parapsicologia. Sua esposa, Sra. Louisa Rhine, colaboradora de sua obra, publicou o livro Os canais ocultos do espírito, em que “reconhece que uma parte significativa dos fenômenos psíquicos somente pode ser explicada através da hipótese espirítica” (LOEFFLER, 2003, p. 312), conclusão que teve o apoio do próprio J. B. Rhine em O Novo Mundo da Mente (PIRES, 1987, p. 25).
Continuando com o pensamento de Herculano Pires:
Convém deixar bem claro que alguns parapsicólogos de renome mundial, sérios e altamente capacitados, chegaram a sustentar, com base nas ilações que tiraram de suas investigações, a supervivência da mente após a morte física. O Prof. Whately Carington, da Universidade de Cambridge, responsável pelas famosas experiências de telepatia com desenhos que forneceram as primeiras provas científicas da precognição, chegou a formular uma teoria parapsicológica da existência post-mortem. O Prof. Harry Price, catedrático de lógica da Universidade de Oxford, sustenta a mesma tese afirmando que a mente humana sobrevive à morte e tem o mesmo poder da mente do homem vivo, de influir sobre outras mentes e sobre o mundo material. O Prof. Soal, da Universidade de Londres, realizou com êxito experiências com “voz-direta”, nas quais a voz do comunicante vibra no espaço independentemente do sensitivo ou médium. (PIRES, 1987, p. 25).
Loeffler, citando Louisa Rhine, transcreve, do livro dela já mencionado, passagens nas quais ela avalia a hipótese da sobrevivência:
“Viverá depois da morte alguma parte do Homem? Certas experiências de psi sugerem respostas afirmativas. Realmente, a idéia da vida post mortem viu-se reforçada pelas ocorrências psíquicas que sugerem atuação de pessoas desaparecidas.” (p. 233).
“É razoável supor que, se existem personalidades desencarnadas capazes de influir sobre os vivos e com eles manter comunicação, assim o farão com certo grau de frequência. É possível que a prova esteja à mão, sendo necessária tão-somente abrir os olhos para vê-la. (p. 254).
“À proporção que compreendemos ser o mundo mais vasto do que parece, e que somos mais do que os mortais acorrentados aos sentidos que o estádio mecanicista da ciência pretende nos convencer de que somos, apreciaremos o universo expandido. Veremos que, se dispomos desse potencial, o universo será maior do que se afigura. Compreenderemos que, pelo menos logicamente, há espaço bastante para continuação da parte da personalidade depois de terem cessado de funcionar os sentidos. (p. 258)”. (LOEFFLER, 2002, p. 313-314).
Freud no divã
A primeira contestação a Freud surgiu de um de seus discípulos, chamado C. G. Jung, que acabou formando uma escola dentro da Psicanálise. Sua opinião está expressa no livro Psicologia do Inconsciente, onde a certa altura diz:
“A teoria sexual da neurose freudiana fundamenta-se, portanto, num princípio verdadeiro e real. Comete, no entanto, o erro da unilateralidade e da exclusividade, além da impudência de querer apreender Eros, que nunca se deixa capturar numa grosseira terminologia sexual. Neste ponto Freud é também um dos representantes da sua época materialista, que nutria a esperança de resolver todos os enigmas do mundo num tubo de ensaio. O próprio Freud, depois de velho, reconheceu essa falta de equilíbrio de sua teoria e contrapôs a Eros, que chamou de libido, o instinto de morte, ou de destruição”. (JUNG, 2001, p. 20).
No Prefácio desse livro, encontramos uma opinião de Jung que não poderemos deixar de citar, porquanto, ela vem reforçar este nosso estudo; leiamos:
“Matérias difíceis e complexas como a psicologia do inconsciente não se prestam apenas a novas descobertas, mas também a equívocos. Trata-se de uma vasta área virgem, em que penetramos a título experimental, onde só é possível atinar com o caminho certo depois de errar por muitos desvios”. (JUNG, 2001, p. XI).
Mas, ao que nos parece, hoje alguns parapsicólogos (ou pelo menos é o que dizem ser) sabem mais que Jung.
Em outubro/2002 a revista Superinteressante trouxe como reportagem de capa: “O fim da Psicanálise?”, cujo artigo está assinado por Rodrigo Cavalcante, do qual transcrevemos:
Apesar de tão popular, a psicanálise (nome que Freud deu a esse método, em 1896) nunca foi alvo de tantas críticas como nos últimos anos. Neurologistas e estudiosos da mente dizem que boa parte dela está mais próxima da ficção do que da ciência e que as obras de Freud hoje não passam de boa literatura (ele escrevia muito bem). Psicólogos sociais acusam a ênfase dada por Freud às relações familiares e à sexualidade como modelos limitados de interpretação do sofrimento psíquico, propondo novos caminhos para cuidar dos problemas existenciais. […].
“Só quem tem pouco bom senso levaria hoje a sério a maioria das idéias de Freud”, diz a psicóloga Sophie, professora da Faculdade Simmons, em Boston, nos Estados Unidos. Sua declaração seria mais uma dentre o coro de críticos de Freud, não fosse por um detalhe importante. O último nome de Sophie é Freud. Isso mesmo: a neta do fundador da psicanálise disse à SUPER que é bastante cética diante das teorias do avô e acha que pouca coisa de suas teses ainda pode ser considerada. (CAVALCANTE, 2002, p. 44). (grifo nosso).
Observar que nem a própria neta de Freud acredita em suas teses, que dirá dos que nenhum grau de parentesco tiveram com ele, não é mesmo?
Mais à frente, diz Cavalcante: “O próprio Freud, em alguns de seus textos, aventou a possibilidade de que um dia a psicanálise talvez fosse deixada para trás, substituída por um novo tratamento”. (CAVALCANTE, 2002, p. 44). Uma verdadeira e autêntica profecia!
Com certeza, será substituída por algum tratamento que considere que o ser humano não se resume meramente a um corpo físico, mas que possui um espírito que é imortal. Espírito esse que já viveu antes dessa vida e viverá outras vidas até atingir a perfeição. Isso não está longe de acontecer, pois muitos psicanalistas e psicólogos já perceberam essa realidade sustentada pelo Espiritismo.
Por outro lado, Freud também vem perdendo terreno no que se refere à sua interpretação dos sonhos. Vejamos este trecho dum artigo na revista Galileu:
[…] Pesquisadores que estudam o funcionamento físico do cérebro começam a delinear os mecanismos bioquímicos que estão por trás da atividade onírica (sono) e dizem que a coisa pouco ou nada tem a ver com mensagens em linguagem simbólica e desejos sexuais reprimidos apontados por Freud. (GARCIA, 2003, p. 19). (grifo nosso).
Ao que parece Freud talvez tenha se espelhado em si mesmo para desenvolver a teoria dos sonhos, pois pensar que tudo é sexo é, como se diz popularmente, “ter o sexo na cabeça”, por isso passa a achar que todo mundo pensa da mesma forma. “Freud tem sido alvo de críticas desde que publicou ‘A Interpretação dos Sonhos’, em 1899”, diz Rafael Garcia, autor do artigo.
Vejamos agora a opinião de um neurofisiologista, citado por Garcia:
“Sonho é só isso: uma experiência consciente enquanto nós dormimos”, explica o neurofisiologista César Timo-Iaria, da Faculdade de Medicina da USP. “Qualquer outro conceito é fantasioso”. […].
“No sonho, qualquer coisa é possível, porque não existe o filtro que é dado pelos mecanismos de alerta”, explica Timo-Iaria. Para ele, a neurofisiologia derruba a tradição freudiana, que considera os elementos estranhos dos sonhos como símbolos para disfarçar nossos desejos reprimidos” (GARCIA, 2003, p. 21).
Kardec já dizia que os sonhos são estados de emancipação da alma, realidade essa que fatalmente um dia a ciência também irá confirmar.
Não só os encarnados, mas também os desencarnados dão sua opinião sobre Freud. Nos livros Entre a Terra e o Céu e Ação e Reação, obras ditadas pelo Espírito André Luiz, na psicografia de Chico Xavier, encontramos:
“Freud deve ser louvado pelo desassombro com que empreendeu a viagem aos mais recônditos labirintos da alma humana, para descobrir as chagas do sentimento e diagnosticá-las com o discernimento possível. Entretanto, não pode ser rigorosamente aprovado, quando pretendeu, de certo modo, explicar o campo emotivo das criaturas pela medita absoluta das sensações eróticas”.
“Criação, vida e sexo são temas que se identificam essencialmente entre si, perdendo-se em suas origens no seio da Sabedoria Divina. Por isso, estamos longe de padronizá-los em definições técnicas, inamovíveis. Não podemos, dessa forma, limitar às loucuras humanas a função do sexo, pois seríamos tão insensatos quanto alguém que pretendesse estudar o Sol apenas por uma réstia de luz filtrada pela fenda de um telhado. Examinando como força atuante da vida, à face da criação incessante, o sexo, a rigor, palpitará em tudo, desde a comunhão dos princípios subatômicos à atração dos astros, porque, então, expressará força de amor, gerada pelo amor infinito de Deus”.
“Freud quem definiu o objetivo do impulso sexual como procura de prazer… Sim, a assertiva é respeitável, em nos reportando às experiências primárias do Espírito, no mundo físico; entretanto, é indispensável dilatar a definição para arredá-la do campo erótico em que foi circunscrita. Pela energia criadora do amor que assegura a estabilidade de todo o Universo, a alma, em se aperfeiçoando, busca sempre os prezares mais nobres. Temos, assim, o prazer de ajudar, de descobrir, de purificar, de redimir, de iluminar, de estudar, de aprender, de elevar, de construir e toda uma infinidade de prazeres, condizentes com os mais santificantes estágios do Espírito. Encontramos, desse modo, almas que se amam profundamente, produzindo inestimáveis valores para o engrandecimento do mundo, sem jamais se tocarem umas nas outras, do ponto de vista fisiológico, embora permutem constantemente os raios quintessenciados do amor para a edificação das obras a que se afeiçoam. Sem dúvida, o lar digno, santuário em que a vida se manifesta, na formação de corpos abençoados para a experiência da alma, é uma instituição venerável, sobre a qual se concentram as atenções da Providência Divina; entretanto, junto dele, dispomos igualmente das associações de seres que se aglutinam uns aos outros, nos sentimentos mais puros, em favor das obras da caridade e da educação”. (XAVIER, 1987, p. 202-204 – passim).
“Freud vislumbrou a verdade, mas toda verdade sem amor é como luz estéril e fria. Não bastará conhecer e interpretar. É indispensável sublimar e servir. O grande cientista observou aspectos de nossa luta espiritual na senda evolutiva e catalogou os problemas da alma, ainda encarcerada nas teias da vida inferior. Assinalou a presença das chagas dolorosas do ser humano, mas não lhes estendeu eficiente bálsamo curativo. Fez muito, mas não o bastante. O médico do porvir, para sanar as desarmonias do espírito, precisará mobilizar o remédio salutar da compreensão e do amor, retirando-o do próprio coração. Sem mão que ajude, a palavra erudita morre no ar”. (XAVIER, 1986, p. 83).
Freud analisa Freud
A Revista Cristã de Espiritismo publicou, numa matéria intitulada “Freud Além da Vida”, uma mensagem ditada pelo pai da psicanálise à médium alemã Eva Herrmann, da qual não tivemos como não transcrever estes interessantíssimos trechos:
[…] O homem é a soma final das existências terrenas anteriores, que muitas vezes se situa séculos antes da vida atual. […]
Faltou pouco e eu teria me tornado o criador de uma psicologia válida, mas faltou a condição decisiva: eu não tinha a autorização de o fazer. Somente me foi permitido dar ao mundo um quadro, na sua maior parte correto, do inconsciente, mas não de esclarecer a verdadeira natureza da alma. […]
[…] Eu odiava minha mãe apesar de uma forte ligação incestuosa do meu lado, mas ambos os sentimentos corriam em paralelo, sem se perturbarem mutuamente. Mais tarde expliquei este sentimento pela suposta presença de um complexo de Édipo, mas hoje vejo este quadro numa luz completamente diversa. Eu odiava minha mãe porque, numa vida anterior, ela me fez uma grande injustiça e eu carregava esse fato comigo, nas profundezas do meu ser.
Mas, que eu além disto a desejava, está ligado ao fato que a teoria do complexo de Édipo está correta quando há uma certa atração entre os sexos. Não se deve, no entanto, concluir que todo o resto da tragédia de Sophocles pode ou deve ser aceita como um todo. A teoria acima, que na minha obra tem um papel preponderante, rejeito hoje como uma construção falha. O fato de que milhões de pessoas a aceitaram e ainda hoje aceitam, não muda nada na verdade de que forças destrutivas idealizem este logro que levou mais de uma geração a fazer o papel de tola.
Os meus colegas, aos quais este diagnóstico parecia a resposta correta a dado problema, tanto quanto eu, foram vítimas de uma autossugestão que se apodera daquele que não conhece uma solução melhor.
[…] apesar dos meus conhecimentos sobre o mecanismo do inconsciente formarem uma base para uma psicologia válida, o restante do meu ensino não é somente errôneo, e eu o confirmo com o coração pesado, mas é, de certa maneira, um absurdo.
O que hoje, no entanto, sinto mais profundamente é não ter utilizado, desde que isso me tivesse sido permitido, meu tempo e trabalho para descobrir as verdadeiras bases daquilo que fazem o homem ser como é, ou seja, procurar os acontecimentos na reencarnação e no seu passado, que se perde na escuridão, em vez de procurá-los na sua infância. […].
[…] começo a compreender que todos os conceitos atuais sobre o funcionamento do ser humano não chegam nem perto da realidade. […]
[…] entendo hoje sob religiosidade algo bem diferente de uma observação cega de um ritual, ou de um fanatismo religioso. […]
[…] No mundo de cá não podem existir ilusões sobre a condição da própria alma, já que lhes está contraposto um posicionamento objetivo e inexorável. […]
[…] As colaborações acima mostravam o homem de um entoque com uma tônica sexual unilateral, o que desviou a atenção de uma geração inteira para conceitos que não correspondiam à realidade, ou que não tinham a abrangência universal, como eu o proclamei.
Visto subjetivamente, do ponto de vista de alguém que perdeu as escamas diante dos olhos, houve um engano do meu lado, favorecido, de certo modo, pela disposição interna de querer chocar o mundo. […]
Não sei julgar em quanto tempo poderei, com a ajuda dos outros, reabilitar o homem como uma criação de Deus, cuja sexualidade, com exceção de casos patológicos, perfaz uma parte importante de sua vida terrena. […]
[…] Não é possível desfazer o acontecido e assim a gente experimentar, de um modo ou de outro, compensar o erro cometido, por algo de bom que não elimina a injustiça, mas de certa forma a compensa. Meu trabalho atual é este. Consiste, com primeiro passo, no reconhecimento e na avaliação da injustiça cometida. Isto não é fácil para alguém que, como a grande maioria da humanidade, está acostumado a mentir para si mesmo. […] (REBELO, 1999, 12-18 – passim).
Nós, os espíritas, que acreditamos na vida após a morte e na possibilidade de intercâmbio entre os dois planos da vida, achamos perfeitamente cabível essa mensagem de Freud. Mas em hipótese alguma poderemos afirmar isso categoricamente. Deixaremos ao encargo do leitor se reportar à revista e ler toda a mensagem, analisando-a em estilo e conteúdo para julgar, por si mesmo, sobre sua procedência, se poderia ser mesmo do autor que a assina.
Conclusão
Aos que buscam em Freud um apoio às suas idéias para combater o Espiritismo, diremos que busquem outra base, pois essa está sendo demolida dia-a-dia, além de que está de muito defasada:
Outra teoria, muitas vezes invocada pelos contraditores da idéia espírita, é a do inconsciente, ou do ego inconsciente. A ela se reportam numerosos sistemas, obscuros e complicados.
Segundo essa teoria, dois seres coexistiriam em nós: um consciente, que se conhece e se possui; outro inconsciente, que a si próprio ignora, como é por nós ignorado e que, todavia, possui faculdades superiores às nossas, pois que lhe são atribuídos todos os fenômenos do magnetismo e do Espiritismo; e não somente haveria um segundo “nós mesmos”, mas um terceiro, um quarto e mais até, porque certos teóricos admitem no homem a existência de grande número de personalidades, de consciências diferentes. Esse sistema é conhecido sob o nome de policonsciência.
Conforme demonstrou o Sr. Charles Richet no seu livro “O homem e a inteligência, o sonambulismo provocado”, o que se denomina a dupla personalidade representa, simplesmente, os diversos estados de uma única e mesma personalidade. Assim também o inconsciente não é mais que uma forma de memória, o despertar em nós de lembranças, de faculdades, de capacidades adormecidas. Os teoristas do inconsciente pretendem, por esse meio, combater o maravilhoso e inventam um sistema ainda mais fantástico e complicado do que tudo o que colima. Não só a sua teoria é ininteligível, mas não explica absolutamente os fenômenos espíritas, porque não se pode compreender como o inconsciente produziria formas de finados, comunicações inteligentes por meio de sons ou de pancadas, e todos os fatos outros atestados por experimentadores de todos os países.
Também se pretendeu atribuir as mensagens ditadas em sessão a uma espécie de consciência coletiva, que se desprendesse do conjunto dos assistentes. Concepção ilógica, se assim fosse.
Pode-se perguntar em virtude de que acordo universal esses inconscientes ocultos no homem, que se ignoram entre si e a si próprios se ignoram, são unânimes, no curso das manifestações ocultas, em se dizerem Espíritos dos mortos.
Pelo menos, é o que temos podido verificar nas inúmeras experiências em que temos tomado parte durante mais de trinta anos, em tão diversos pontos, na França e no estrangeiro. Em parte alguma se apresentaram os seres invisíveis como inconscientes, ou “egos” superiores dos médiuns e de outras pessoas presentes, mas sempre como personalidades diferentes, na plenitude de sua consciência, como individualidades livres, tendo vivido na Terra, conhecidos dos assistentes, na maioria dos casos com todos os caracteres do ser humano, suas qualidades e defeitos, suas fraquezas e virtudes, e dando frequentes provas de identidade.
O que há de mais notável nisso, convenhamos, é a argúcia, a fecundidade de certos pensadores, sua habilidade em arquitetar teorias fantasistas, no intuito de se esquivarem a realidades que lhes desagradam e os incomodam. (DENIS, 1987b, p. 200-202).
O que podemos ainda dizer é que, se a ciência conseguisse ficar livre dos preconceitos religiosos de alguns para pesquisar detidamente a questão da sobrevivência da alma, encontraria fortíssimo material para, finalmente, tratar o homem em sua verdadeira natureza que é a de ser um Espírito imortal, que pelos desígnios do Criador se vincula a um corpo físico, onde, por esforço próprio, tem a possibilidade de aprendizado e progresso, objetivando chegar ao patamar máximo que a vontade de Deus permite evoluir o ser humano.
Devemos ainda ressaltar a incoerência dos religiosos que se apoiam em Freud, já que o criador da psicanálise não tinha uma visão que viesse a justificar o sentimento religioso como coisa natural, antes, ao contrário, conforme nos informa Dora Incontri em seu livro Para entender Kardec:
Já, para Freud, a religião é uma projeção dos desejos humanos. Na Obra “O futuro de uma ilusão” (1997), o fundador da psicanálise admite que o ser humano cria ilusões metafísicas e religiosas para suprir uma necessidade psíquica. Na concepção de Freud, o ser humano é irremediavelmente um ser em conflito, portanto neurótico, que encontra no imaginário religioso uma forma de conforto. Ele vê aquilo que quer ver, crê naquilo que imagina, para satisfazer suas carências. (INCONTRI, 2004, p. 77). (grifo nosso).
Parece-nos que há nisso tudo algo de contraditório, uma vez que existem inúmeras provas de que as manifestações não são produto do inconsciente, enquanto os contraditores, que dizem ser produto do inconsciente, não apresentaram uma só de que a sua hipótese, se não verdadeira, pelo menos é viável. Falar que é produto do inconsciente torna-se forma fácil de negar os fatos, entretanto, que provem que o inconsciente os produz que nos renderemos às evidências.
Referências
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ANDRADE, H. G. Parapsicologia uma visão panorâmica. Bauru – SP: FÉ, 2002.
CAVALCANTE, R. A psicanálise no divã. In Revista Superinteressante, edição 181. São Paulo: Abril, outubro/2002, p. 42-50.
DENIS, L. Cristianismo e Espiritismo. Brasília: FEB, 1987b.
DENIS, L. No Invisível. Brasília: FEB, 1987a.
GARCIA, R. O sonho acabou? In Revista Galileu, nº 145. Rio de Janeiro: Editora Globo, agosto/2003, p. 18-24.
INCONTRI, D. Para Entender Kardec. Bragança Paulista – SP: Lachâtre, 2004.
JUNG, C.G. Psicologia do Inconsciente. Petrópolis: Vozes, 2001.
LOEFFLER, C.F., Fundamentação da Ciência Espírita. Niterói: Lachâtre, 2003.
PIRES, J. H. Ciência Espírita. São Paulo: Paidéia, 1988.
PIRES, J. H. Parapsicologia Hoje e Amanhã. São Paulo: Edicel, 1987.
REBELO, V. Freud Além da vida. In Revista Cristã de Espiritismo, nº 03. São Paulo: Escala, 1999, p. 12-18.
RHINE, J.B e BRIER, R. Parapsicologia Atual. São Paulo: Cultrix, 1989.
WILKINSON, H. C. Parapsicologia e Religião in RHINE, J. B. E BRIER, R (org). Parapsicologia atual. São Paulo: Cultrix, 2003.
XAVIER, F. C. Ação e Reação. Brasília: FEB, 1987.
XAVIER, F. C. Entre a Terra e o Céu. Brasília: FEB, 1986.
O consolador – Ano 2 – N 95 – Especial