O escritor patrício Almerindo Martins de Castro, em seu interessante livro “Lições da Vida”, disse, e disse muito bem, que “a afirmativa de que a inspiração nos grandes talentos e dos gênios vem do Alto não é uma expressão arbitrária de crentes; essa influência se encontra positiva, em vários artistas de renome, músicos, poetas, literatos, desde épocas em que não se falava em Psiquismo ou em Espiritismo, e vigorava ainda a celebérrima teoria de que as grandes celebrações são indivíduos mais ou menos desequilibrados, suscetíveis de alucinação”.
Hoje, talvez, mais que em qualquer outra fase da História, a Religião, em geral, vem atraindo a atenção dos investigadores especializados, e todos eles, quase que a “una você”, afirmam haver perfeita vinculação entre a Música e a Religião.
Brian Wibberley chegou mesmo a declarar que “a Religião sempre esteve associada à Música, e que a Música, desde suas primitivas origens até o estado moderno, sempre se desenvolveu sob a égide da Religião. Foi na atividade da Religião que a Música se encontrou a si mesma. Dela surgiu necessariamente sua ciência, desenvolveu – se sua técnica realizou-se sua habilidade, estendeu- se seu campo de expressão, fez notada sua força transcendental, e seu conteúdo de beleza impregnou-se de significado eterno.”
É bem certo, e isto não se discute, que “a música não constitui uma necessidade absoluta para a religião”.
Mas, precisamos convir que ela – a música – continua sendo de incalculável vantagem para a religião.
A música tem tantas afinidades naturais que seria praticamente impossível separá-las.
Não pretendemos fazer um estudo a respeito dessa afinidade existente, desejamos apenas realçar o fato em si, para que melhor possamos ajuizar o valor, a importância, a finalidade, enfim, desses gênios da música que, de quando em quando, reencarnam em nosso mundo, com a missão, não apenas de deleitar nossos ouvidos, mas para que nossas almas se alimentem por meio das harmonias que nos lembram aquelas outras produzidas pela música celestial!
A verdade é que sublimes melodias, cheias de espiritualidade, nem sempre agradam ou sensibilizam a todas as criaturas, e isto sucede em face da maior ou menor vibratilidade dos espíritos, de sua melhor identificação com as vibrações superiores.
A música é uma das maneiras sutis de se expressarem pensamentos, ideias, sentimentos.
Nem todos estão, evidentemente, em condições de alcançar o poder expressional desses sentimentos, ideias e pensamentos. Ora, quando um corpo sonoro é posto em vibração e as ondas sonoras chegam ao órgão receptor – o ouvido -, penetram elas no labirinto e daí são transmitidas, por meio da rede de um nervo especial, ao centro do cérebro, por meio do qual são comunica das à consciência. Esta questão que, para nós espíritas, não apresenta dificuldade de compreensão, tem, no entanto, dado margem até agora, entre os homens de ciência que tudo querem resolver sem levar em consideração o fator anímico, a simples hipóteses explicativas, pois que tal assunto, como vim os, se situa na linha limítrofe da vida subjetiva e da objetiva, ou melhor, da vida material e da vida espiritual.
Os grandes compositores, os gênios da música, por meio de suas faculdades mediúnicas, escutam harmonias maravilhosas, e, quando tentam escrevê-Las, experimentam grande angústia, porque nesse registro não podem dar-nos dessas harmonias senão uma pálida ideia. E isto por uma razão muito simples – é que o número de vibrações da onda sonora musical, perceptíveis pelo ouvi ouvido, encontra-se dentro de limites bem definidos.
“A extensão extrema dessa onda, como sabemos, cobre aproximadamente as sete oitavas do piano, cujas notas variam desde o Lá mais baixo, de 27 vibrações, até o Láj6 de 3.520 vibrações. Mais além desses extremos, como observa Max Mueller, as notas mais baixa simples zumbidos, e as notas mais altas simples toques de campainhas.”
Paremos com nossas divagações para falarmos sobre a figura admirável de Gioacchino Rossini, que for detentor das mais raras e completas aptidões musicais, tendo sido mesmo considerado como o pioneiro compositor da Itália.
Houve quem dissesse que outros compositores, como, por exemplo, Meyerbeer ou Weber bem podiam ser comparados aos mineiros que a golpes de picareta arrancam os metais preciosos das entranhas da terra, ao passo que em Rossini o ouro e o diamante jorram fluente e espontaneamente do caudaloso manancial de sua: inspiração – dessa inspiração que durante dez anos foi reinar como senhor absoluto em todas as “cenas da Península.
Gioacchino Antônio Rossini nasceu na Itália, na: cidade de Pésaro, em 29 de fevereiro de 1792.
Todos conhecem, sem dúvida alguma, a ópera “Barbeiro de Sevilha”, a pérola do repertório musical de nossa época e naturalmente de todas as épocas futuras.
Pois bem, parece impossível que obra dessa extensão pudesse ter sido escrita em 13 dias apenas, como se asseverou, ou melhor, como as próprias datas o confirmam.
Rossini era espiritualista e cristão, e, em face de suas convicções religiosas, jamais conspurcou a torrente cristalina da sua inspiração, para musicar libretos que pudessem ofender seus princípios religiosos.
Seu pai era músico, porém de mentalidade medíocre.
Jamais se preocupou com a educação do filho, tanto assim que só muito tarde Gioacchino faz o curso primário.
Quando garoto, trabalhou como aprendiz de ferreiro. Vivia, porém, insatisfeito, porque sua ambição era a de ser músico.
Jamais deu mostras de desânimo, de falta de fé quanto ao futuro que o aguardava. Há quem diga, embora não se possa asseverar a sua veracidade, que Rossini certa vez declarara que, nas horas de aprender música, escutava sempre e distintamente uma voz que lhe segredava com firmeza: – “Aguarda e confia, pois serás compositor e a tua música te tornará conhecido e estimado.”
A hora, de fato, soou. Foi-lhe dada a oportunidade de obter rudimentares lições de piano.
Quando jovem entrou para o Conservatório de Bolonha, onde então recebeu a educação musical, que naquele tempo era ministrada na Itália, aliás, de forma deficientíssima.
Tinha ele consciência de possuir maravilhosa facilidade para a música, e essa consciência outra coisa não era senão os seus conhecimentos musicais, patrimônio de sua alma, obtidos trabalhosamente em vidas pregressas.
‘Por isso sentia o anseio de compor, de exteriorizar as doces harmonias que, como médium, percebia com seus ouvidos psíquicos.
Ele constatava a diferença existente entre essas harmonias, com as apresentadas pelos mestres de seu tempo e tidas como as mais fulgurantes expressões melódicas, como as mais delicadas e enternecedoras harmonias!
E daí, naturalmente, o seu indiferentismo no tocante aos estudos mais aprofundados do seu tempo, os quais estavam muito aquém de seus conhecimentos.
Quando contava 14 anos de idade, escreveu uma ópera em dois atos: “Demétrio e Políbio”. Com 18 anos, não obstante serem muito precários seus estudos no que concerne a ponto, contraponto e harmonia, recebeu, por intermédio de amigo influente, a primeira encomenda de uma ópera, então intitulada “O Mercado Matrimonial “. Outras encomendas se sucederam.
Hoje ninguém contesta que Rossini alterou tanto a forma como o espírito da ópera italiana, e, como essa alteração fosse profunda realmente, era natural que desse oportunidade, aos espíritos rotineiros daquela época, a julgá-la um verdadeiro contrassenso.
A par da abundância e da frescura prodigiosa de sua inspiração, por todos reconhecida como a causa primária de seu êxito, Rossini introduziu, na arte das formas, e com habilidade rara, nova técnica na modulação, mostrou-se sempre dotado de admirável critério no desenvolver os temas de conjunto, a par de uma variedade até então desconhecida nos efeitos orquestrais.
Era preciso ter ânimo forte para, nos primórdios do século XIX, implantar essas reformas, a ponto de Lorde Mount Edgecumb, defensor da música antiga, dizer que Rossini e seus imitadores estavam abastardando o teatro lírico.
E como pôde ele operar tais realizações reformistas na conceituação musical, relativamente ao gênero operístico, quando a mentalidade geral dos professores de então era de nível muito inferior à sua? Donde vieram esses conhecimentos, essa coragem de levar avante a implantação de sua técnica na maneira de sentir a beleza dos sons, produzindo harmonias novas e delicadas?
O Espiritismo explica tudo isso, por meio da lei reencarnacionista e também em face das faculdades medianímicas.
A Rossini, os Espíritos incumbidos de lhe nortearem os passos na Terra experimentavam grande facilidade em transmitir, pela inspiração, as lições que os mestres terrenos não lhe podiam dar, e isto porque, além de sua sensibilidade psíquica, dispunha de fartos cabedais da sublime arte da música, adquiridos, quem sabe, na última, ou, mais acertadamente, em várias outras existências.
“Guilherme Tell” é, na opinião dos entendidos, a mais bela e a mais completa manifestação do gênio do mestre.
Coisa curiosa e para muitos um mistério que jamais será esclarecido: Rossini, não obstante haver atingido a idade de 76 anos, deixou, desde os 37 anos, quando apresentou o seu “Guilherme Tell”, de escrever, dizendo para sempre adeus ao teatro.
Em torno desse fato, vários têm sido os motivos aventados, sem que possam eles merecer crédito pela insubsistência de suas conclusões. O que só se pode admitir é que, por motivos que não nos cabe investigar, a sua faculdade mediúnica foi cassada e, assim, desprovido dessa antena que lhe permitia receber as inspirações do Alto, sua pena foi forçada a fazer um staccato em suas magníficas composições.
Houve mesmo quem escrevesse o seguinte:
“Não há, nos anais da arte, história tão estranha a respeito de um gênio que encheu o mundo com a sua glória e que depois resolveu desaparecer, mas sem se ocultar.”
Rossini tomou conhecimento das conjecturas então publicadas em face da sua improdutividade, e não nos consta tenha ele tornado público o motivo do seu completo afastamento das lides musicistas. E’ que ele bem sentia a falta da inspiração que até aos 37 anos lhe descia em catadupas prodigiosas, e em virtude disso compreendeu que a missão que o trouxe à Terra estava finda.
Quem penetra nos escaninhos de sua alma, por meio dos estudos biográficos a seu respeito, verifica que Rossini não quis revelar os motivos da sua improdutividade, porque sabia muito bem que os homens não estavam em condições de pesar as razões de ordem psíquica e transcendental que o impediram de escrever novas peças de fôlego.
Em uma das obras de Allan Kardec, há uma comunicação transmitida pelo Espírito de Rossini à médium francesa Desliens, da qual destacamos o seguinte trecho: “O grande maestro Rossini, o criador de tantas obras-primas segundo os homens, nada mais faz do que debulhar algumas das pérolas menos perfeitas do escrínio musical criado pelo Mestre dos mestres. Rossini reuniu notas, compôs melodias, bebeu da taça que contém todas as harmonias, roubou algumas centelhas ao fogo sagrado, mas, esse fogo sagrado nem ele, nem outros o criaram!
“Nada inventamos: copiamos do grande livro da Natureza e a multidão aplaude, quando não apresentamos: por demais deformada a partitura.”
Rossini, afirma Alberto Montalvão: “foi o grande músico que arrebatou quase todas as plateias do mundo com suas óperas imortais”.
Fonte: Grandes vultos da humanidade.