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Jamais abandonados 

Autora: Jane Martins Vilela

“… o Senhor pôs o seu selo em todos os que creem nele. Cristo vos disse que a fé transporta montanhas. Eu vos digo que aquele que sofre e que tiver a fé como apoio será colocado sob a sua proteção e não sofrerá mais… Felizes os que sofrem e choram! Que suas almas se alegrem, porque serão atendidas por Deus.” (“O mal e o remédio”, Santo Agostinho, O Evangelho segundo o Espiritismo.

Quando adquirimos uma compreensão da dor através da razão e das leis de Causa e Efeito, realmente a vemos não como um mal, mas como um remédio eficaz para o aprimoramento do Espírito que o recebe com resignação, galgando degraus de luz com a maturidade espiritual que adquire, maturidade do senso moral, que acompanhará esse Espírito em suas vidas sucessivas, independente da idade corporal. Um dia, talvez não tão distante, a humanidade há de compreender que o Espírito que anima um corpo jovem não é uma criancinha pequenina, mas tem uma bagagem milenar que se revela desde o berço. Um dia se compreenderá que não é a idade do corpo físico que faz um entendimento, mas sim a maturidade do Espírito. Há jovenzinhos que parecem mais velhos que os pais ou os avós, nesse sentido, por isso, tantos se surpreendem hoje com a infância, que parece ensinar a muitos. 

A vida é uma oportunidade de luz e as provações são necessárias para o Espírito ascender na sabedoria, mas jamais uma dor será maior que o amor. Convém lembrar que o amor cobre uma multidão de pecados, como disse o apóstolo Pedro, e sempre o amor estará à frente, pronto a diminuir os sofrimentos, quando as provações chegarem ao seu limite e puderem ser minimizadas ou até retiradas. 

Dentro disso que tratamos, temos uma história assim, de amor, provação, fé e amadurecimento. 

Uma senhora ainda jovem levou-nos dois meninos para atender, quase da mesma idade, muito amigos. Um, filho dela, de cerca de 8 anos, a quem poderíamos chamar de Jonathan, e outro, filho do atual marido dela, de 8 anos também, que chamaríamos de Mateus. 

Jonathan estava com uma intoxicação alimentar – comeu algo que não lhe fez bem, estava com vômito, diarreia, mas quadro passageiro. Uma criança feliz que sempre teve o amor dessa mãe. 

O outro, Mateus, parecia um adulto, uma linguagem racional e uma maturidade incomuns. Estava com lesões na cabeça, uma micose, “tinea capitis”. 

Conversando, a madrasta foi contando a história e o menino confirmando e dando os seus apontamentos. Quem conhece os mecanismos das leis de Causa e Efeito, do amor de Deus socorrendo sempre, entenderia bem esse momento. 

Disse-nos ela que o marido e a mãe do Mateus há cerca de 4 anos tinham se separado e a ex-esposa desapareceu com as crianças, mudando para outro Estado e não dando o endereço a ele. Eles tinham 3 filhos – uma menina que hoje tem 10 anos, o Mateus, e um mais novo, hoje com 5 anos. 

Esse pai ficou desesperado procurando esses filhos, até que se resignou, confiando em Deus e em que um dia ele encontraria os meninos de novo. 

Há cerca de uns dois meses, um amigo dele, viajando a trabalho, reconheceu o Mateus, depois de quatro anos, numa cidade do interior de São Paulo, e o avisou. Poucos dias após, o “ex-cunhado” dele telefonou-lhe dizendo que fizesse de tudo para buscar os filhos, porque estavam abandonados pelas ruas da cidade, completamente descuidados pela mãe, sofrendo, e que ele, o “ex-cunhado”, lhe daria todo o apoio que precisasse para reaver as crianças. 

A madrasta, contando, era de emocionar. Ela e o marido foram imediatamente, e os filhos, quando o viram chegando, correram para abraçá-lo de tal modo que ele parecia-lhes a última tábua de salvação, o último recurso. 

Ele conseguiu trazer os dois mais velhos, convenceu a “ex-esposa” a deixá-los ficar pelo menos um tempo, na esperança de que ficassem em definitivo. 

O Mateus, nesse momento, interferiu e disse que não volta mais para a casa da mãe, de jeito nenhum. Agora ele é cuidado com amor e carinho pela madrasta, fez amizade com o Jonathan, toma banho todos os dias, tem comida todos os dias, dorme numa cama limpinha e não sofre agressões. Relatou-nos ele que o padrasto bebe e batia todos os dias nele e na irmã. 

A madrasta disse que a irmã dele não se afasta dela, tal o amor por se sentir bem tratada. A preocupação do Mateus agora é com o irmãozinho de 5 anos que ficou lá com a mãe: saudades do irmão e preocupação, pois acha que ele deve estar apanhando do padrasto e sofrendo. 

Não volta mais, disse ele, e o pai e a madrasta vão tentar tudo para que amigavelmente a mãe se convença a deixá-los em definitivo aqui e que permita que o mais novo também venha. 

Víamos o Mateus assim, relatando os fatos com desassombro e sem revolta, um menino bom, a despeito dos sofrimentos passados, muito amadurecido, bem mais que o Jonathan, da mesma idade. 

Parece coisa de novela, mas é do dia-a-dia de milhões de pessoas por aí afora. 

Nesse caso, parece que chegou o fim do sofrimento. O amor divino interveio para que aqueles que não necessitassem de tamanha provação pudessem ser socorridos. Merecimento deles e do pai que deve ter sofrido demais nesses quatro anos de buscas.

Era hora de parar de sofrer. Assim é a vida. Há momentos de sofrer, de crescer, de parar de sofrer, de ser feliz. A cada um segundo as suas obras. Jamais desamparados pelo amor, jamais abandonados. Em nenhuma circunstância deve um Espírito imaginar-se abandonado, sem esperanças. O amor sempre socorre e ampara, se não diretamente aqui na Terra, nas ações humanas, indiretamente na ação da espiritualidade, socorrendo nas horas dolorosas do caminho. 

Como diz o Espírito Emmanuel, no livro Justiça Divina, “… Por amor, os bem-aventurados, que já conquistaram a Luz Divina, descerão até nós, quais flamas solares que não apenas se retratam nos minaretes da Terra, mas penetram igualmente nas reentrâncias do abismo, aquecendo os vermes anônimos…”. 

O consolador – Ano 3 – N 148

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