Autor: Marcus De Mario
Pensar sobre a função da escola na sociedade é tarefa, hoje, repleta de dificuldades. Para muitos ela é fundamental, para outros pode ser substituída pela educação doméstica. Não há consenso, inclusive, se seu objetivo é ensinar ou educar, porque existe diferença entre o ensino e a educação. Ou não?
Certa vez, desenvolvendo palestra num seminário que abordava a educação dos sentimentos, utizei o termo educador no lugar de professor, como aliás é de meu hábito. Uma professora solicitou a palavra e contestou: “Não sou educadora, sou professora. Formei-me para dar aula de língua portuguesa. Sou uma profissional do ensino”.
“Mas não deixa de ser, mesmo assim, educadora”, pensei com meus botões (assim diziam nossos avós). Isso porque ela está em sala de aula lidando com pessoas em determinado estágio de desenvolvimento, e na medida em que interage com os outros, na posição de ensinar algo, ela é uma educadora, pois seu ensino e principalmente sua interação, têm significativa influência sobre a personalidade em formação dos seus alunos.
Segundo essa professora a escola é lugar de ensinar, e não de educar.
Em outra ocasião, nova palestra, descobri que entre as professoras presentes catorze delas eram pedagogas, tinham formação superior. Propus que elas definissem, de forma simples, sem preocupação acadêmica, o termo “pedagogia”, para melhor entendimento de todos. Depois de cinco minutos de meio silêncio, nenhuma delas conseguiu explicar o que é pedagogia. Dei a definição, que foi considerada satisfatória, e solicitei que dissessem o que era, para elas, educação. Foi decepcionante. Não tinham a mínima noção do que estavam fazendo na escola enquanto professoras. Falta de consciência? Má formação universitária? Inexistência de vocação profissional? Ou um pouco de tudo isso e algo mais?
Como vamos debater a escola, sua missão, seus objetivos, se nem sabemos porque estamos professores e o que é educação?
Por não sabermos a diferença entre ensinar e educar, entre ensino e educação, entre instrução e formação, é que fizemos da escola um lugar onde a vida social não tem vez, porque o tempo está tomado por aulas de matemática, língua portuguesa, história, geografia, ciências, educação física, etc.
Há, inclusive, pedagogos, doutores e mestres em educação que consideram a discussão em torno da educação em valores e da formação em cidadania e ética uma perda de tempo, pois isso seria papel da família e não da escola. Um argumento apresentado é que a criança e o jovem passam mais tempo no lar do que na escola. Mas esses mesmos especialistas concordam que o ideal para a escola é o trabalho em tempo integral, num período de seis a oito horas diárias de estudos e atividades complementares. Não há coerência entre os dois pensamentos. Se a família deve educar para valores e ética, como tirar o tempo da família para colocá-lo na escola, que somente deve ensinar conteúdos curriculares de disciplinas fechadas em si próprias?
E quem já provou, por a+b:
- Que a escola que ensina não é também a escola que educa?
- Que o professor que ensina não é também, ou não deveria ser, um educador?
- Que a escola nada tem a ver com a família?
- Que a formação em valores não pode ser feita ao mesmo tempo que a instrução em conteúdos curriculares?
E tomei coragem para afirmar, em outra palestra, que eu não era um professor. Fui imediatamente interrompido pela platéia que, indignada, disse que quem ensina é professor, e, portanto, como estava ali a ensinar algo, não podia deixar de ser um professor. E arremataram: “Mas o senhor é mais que um professor, é um educador, porque trabalha a essência das coisas e do ser humano”.
Será que eles sentiram a grandiosidade e profundeza do que disseram?
Pensemos nisso.