Autor: Ricardo Baesso de Oliveira
Conversando com uma tarefeira espírita, disse-me ela, desanimada, após uma crise com o marido:
– Vou deixar o Espiritismo. Frequento o centro, há mais de dez anos, e meu marido não melhorou nem um pouco!
Minha condição de inferioridade levou-me a pensar: está no Espiritismo, há dez anos, e não compreendeu nada.
Uma atitude relativamente comum: aplicarmos os ensinamentos espíritas nos outros. Diante de uma palestra edificante, costumamos pensar: “Pena que o fulano não estava aqui para ouvir; o que o expositor disse se encaixa perfeitamente nele”. Isso significa que ainda não fomos tocados afetivamente pelo ensinamento, que está em nossa cabeça, mas não desceu para o coração.
O ensino começa a funcionar quando nos damos conta de que o progresso é pessoal e intransferível. O contato com pessoas boas pode nos sensibilizar para a mudança, mas ela, efetivamente, se dará dentro de nós, a partir de uma tomada de decisão pessoal.
Desde que me entendo por gente, meu pai gostava de uma cachacinha e minha mãe de um cigarrinho. A vida toda, um implicando com o outro. Quando o jornal publicava uma matéria sobre os malefícios do cigarro, meu pai mostrava para minha mãe, dizendo: “Tá vendo?”
Quando saía uma notícia falando dos problemas da cachaça, minha mãe mostrava para meu pai: “Olha só!”.
Foram assim mais de cinquenta anos. Resultado: meu pai morreu tomando sua cachacinha, e minha mãe fuma até hoje.
Não com isso que devamos fechar os olhos para os defeitos das pessoas que queremos bem, como se isso não fosse da nossa conta. Se as amamos de verdade, queremos que vivam melhor e sejam melhores, mas é preciso saber como agir.
A esse respeito, o Evangelho segundo o Espiritismo traz lição em duas questões propostas por Kardec e respondidas por um de seus guias:
Como ninguém é perfeito, podemos deduzir que ninguém tem o direito de repreender o próximo?
– Certamente que não, pois cada um de vocês deve trabalhar para o progresso de todos, e sobretudo dos que estão sob a sua responsabilidade. Mas isso deve ser feito com moderação, com uma intenção útil, e não como geralmente se faz, pelo prazer de criticar. Neste último caso, a censura é uma maldade; no primeiro, é um dever que a caridade manda cumprir com todas as cautelas possíveis. Outra coisa importante: a censura que fazemos ao outro deve ser endereçada também a nós mesmos, para vermos se não a merecemos.
Será repreensível observar as imperfeições dos outros, quando disso não possa resultar nenhum benefício para eles, e mesmo que não as divulguemos?
– Tudo depende da intenção. Certamente que não é proibido ver o mal, quando o mal existe. Seria mesmo inconveniente ver somente o bem: essa ilusão prejudicaria o progresso. O erro está em fazer essa observação em prejuízo do próximo, desacreditando-o sem necessidade diante da opinião pública. Seria ainda repreensível agir assim com um sentimento de maldade, e de satisfação por identificar os outros em falta. Mas quando observamos o mal para proveito pessoal, ou seja, para estudá-lo e evitar aquilo que censuramos nos outros, isso é válido.
O consolador – Ano 16 – N 800 – Artigos