Autor: Ricardo Tchobnian
Era inverno. Certa vez um filhote de lobo se perdera de sua matilha. Vagava solitário pela floresta em busca de alimento. Ao cair da noite procurava por abrigo. O frio era intenso naquela região montanhosa.
No interior de uma caverna, pensativo, esticava o seu corpo sobre o chão de terra. Na escuridão e silêncio inerentes àquele local se lembrava dos bons momentos que passara junto à matilha. Sentia saudades do carinho de seus amigos, parentes, irmãos e principalmente de sua mãe.
Desde os primeiros momentos em que uivou neste mundo, sua mãe jamais deixou faltar alimento ou qualquer coisa de que necessitasse. Era feliz e não sabia – pensava o canídeo.
Tão logo amanhecia farejava no ar o aroma de carne fresca. Faminto que estava partiu ansioso até o local, onde então encontrou um grupo de ursos que devoravam um alce. Inocente, tentou abocanhar um pouco daquele alimento, mas foi impedido pelos mesmos que o espantaram com toda violência. Aflito, fugiu e se escondeu atrás de uma das inúmeras coníferas do local. Aguardava que fossem embora para se alimentar. No momento oportuno pode saciar sua fome com os restos que deixaram por lá.
Era primavera. Fazia dois anos que estava perdido. O lobo deixara de ser um filhote indefeso. Aprendera a caçar e a marcar território naquela região. Certa vez, durante perseguição de um alce, por distração, caiu de um penhasco de cinquenta metros onde foi salvo pelas águas de um rio que descongelara semanas atrás. O impacto com as águas chamou atenção de uma matilha que bebia nas margens daquele rio. Tão logo recobrou a consciência, pode reconhecer todos àqueles de que tanto sentira falta. Sua mãe o reconheceu imediatamente pelo inconfundível olfato. O lobo uivava de alegria. Era um dia especial. Ele voltava para suas origens.
Um fato curioso o chamou atenção. Sua mãe ainda trazia alimentos para seus irmãos de mesma idade. Percebeu o quanto ficaram acomodados com aquela situação.
Naquela noite, um grupo de pelo menos vinte ursos se aproximou para encurralar aquela matilha. Desesperados e adaptados somente aos fatos cotidianos da vida canina, os lobos se entregaram à própria sorte. Choravam, ou melhor, uivavam em coro, de olhos fechados esperando pelo inevitável.
Assim que abriram os olhos viram os ursos fugindo rapidamente. O lobo recém chegado avançara sobre um deles e com a força de sua mordida fez com que todos desistissem daquele ataque, mediante ao desespero que causara naquele animal.
O lobo perdido fora eleito lobo alfa da matilha. Seus irmãos lhe perguntaram da razão de tamanha força e coragem. Ele respondeu:
– Vocês não poderiam compreender. Somente aquele que passou fome, frio, desespero, incerteza e solidão compreenderia a origem do que sou hoje. Eu estava perdido e pude me encontrar.