fbpx

O self em expansão

Autor: Guaraci de Lima Silveira

Este, sem dúvida, é assunto de muita importância porque nos leva a reflexões sobre nós e nossa relação com a consciência. Segundo definições, a consciência é uma qualidade da mente que abrange qualificações tais como subjetividade, autoconsciência,  sapiência, e a capacidade de perceber a relação entre nós e um ambiente. É assunto muito pesquisado na filosofia da mente, na psicologia, neurologia e ciência cognitiva. Alguns filósofos a dividem em consciência fenomenal, que é a experiência propriamente dita; e consciência de acesso, que é o processamento das coisas que vivenciamos durante a experiência.  Dentro desta divisão, consciência fenomenal é o estado de estar ciente, tal como quando dizemos “estou ciente”, e consciência de acesso se refere a estar ciente de algo ou alguma coisa, tal como quando dizemos “estou ciente destas palavras”.  Assim sendo, podemos dizer que consciência é uma qualidade psíquica, isto é, que pertence à esfera da psique humana, por isso diz-se também que ela é um atributo do Espírito, da mente, ou do pensamento humano. Ser consciente não é exatamente a mesma coisa que perceber-se no mundo, mas ser no mundo e do mundo, para isso, a intuição, a dedução e a indução tomam parte. Há ainda alguns neurocientistas que equivocadamente a definem como um processo químico do cérebro. Esta tese não suporta uma pesquisa mais acurada sobre o ser e a existência.

O importante é que comecemos a nos interessar por este assunto. O homem do futuro terá que ser pleno, integral e, para tanto, profundo conhecedor de si mesmo. Não mais viver por viver, realizando de forma automática seus afazeres e comunicando-se trivialmente como acontece quase sempre em nossas relações interpessoais. Cabe aqui entendermos a etimologia da palavra Consciência. Ela vem de conscientia de consciens,  de conscire, que significa estar cientes e com a intensidade do saber. Também encontramos uma possível raiz formada de junção de duas palavras do latim; conscius+sciens: conscius (que sabe bem o que deve fazer) e sciens (conhecimento que se obtém através de leituras; de estudos; instrução e erudição). A consciência segundo o psicólogo canadense Steven Pinker é “… a função mental de perscrutar o mundo, pois que a consciência é a faculdade de segundo momento – ninguém pode ter consciência de alguma coisa (objeto, processo ou situação) no primeiro contato com essa coisa; no máximo se pode referenciá-la com algum registro próximo, o que permite afirmar que a coisa é parecida com essa ou com aquela outra coisa de domínio”.

Na questão 835 de O Livro dos Espíritos encontramos que “A consciência é um pensamento íntimo, que pertence ao homem como todos os pensamentos”.  E no livro O que é o Espiritismo, escrito por Allan Kardec, verificamos no capítulo 3, item 127, que “A consciência é uma recordação intuitiva do progresso feito nas precedentes existências e das resoluções tomadas pelo Espírito antes de encarnar. Resoluções essas que ele muitas vezes esquece quando reencarna”. A mentora espiritual Joanna de Ângelis, em seu livro: O Homem Integral, nos informa que a consciência emerge do subconsciente, como uma planta se solta das profundezas da terra. António Rosa Damásio é um médico neurologista, neurocientista português, que trabalha no estudo do cérebro e das emoções humanas. É professor de Neurociência na Universidade da Califórnia. E ele nos traz interessante informação sobre a consciência. Segundo o professor, em seu livro: O Mistério da Consciência, a consciência é dividida em dois tipos: Consciência Central e Consciência Ampliada. Inspirados na tese damasiana, entendemos que a consciência é constituída com uma espécie de anatomia, que pode ser dividida, didaticamente, em três partes: A primeira seria uma consciência de dimensão fonte – onde as coisas acontecem de fato, o aqui agora: o meu ato de escrever e dominar o ambiente e os equipamentos dos quais faço uso, o ato do internauta de ler, compreender a leitura e o ambiente que o envolve em todos os instantes etc. Essa dimensão da consciência não retrocede muito ao passado e, da mesma forma, não avança para o futuro; ela se limita a registrar os atos presentes, com um espaço-tempo (passado/futuro) suficiente para que os momentos (presentes) tenham continuidade. Segundo esta tese podemos dizer que a consciência na dimensão fonte é o meu agora, o que defino, faço, busco enquanto cumpro meus objetivos mais imediatos. A segunda dimensão é a processual – significando a amplitude de sistema que abriga expectativas, perspectivas, planos e qualquer registro mental em aberto; aquelas questões que causam ruídos e impulsionam o ser humano à busca de soluções. Essa amplitude de consciência permite observar questões do passado e investigar também um pouco do futuro. Aqui consideremos que somos uma potência em desenvolvimento. Temos acessos importantes em nós mesmos. O ideal é direcionar nossos questionamentos e buscas somente para aquilo que nos enriqueça de harmonia, amor e sabedoria. Vale nos lembrarmos da metáfora aristotélica do bloco de mármore que é uma bela escultura em potencial necessitando das mãos ágeis e sábias do escultor para concretizá-la. A terceira dimensão da consciência, como a entende o professor António Damásio, trata-se da dimensão ampla que é uma região de sistema que, sem ser um dispositivo de memória, alberga os conhecimentos e experiências que uma pessoa incorpora na existência. Todos os conhecimentos do passado e experimentações pelas quais o ser atravessou na vida, como por exemplo: uma antiga profissão que não se tem mais qualquer habilidade para exercer guarda registros importantes que servirão como experiência em outras práticas. Digamos que é como uma dimensão processual, onde a amplitude da consciência permite examinar o passado e avançar no futuro – tudo dentro de limites impostos pelo próprio desenvolvimento mental do indivíduo. Resumindo, podemos dizer que todos estamos convocados para o grande acontecimento individual que é conhecer-se e ouvir sua consciência que é o suporte desperto do Espírito que nos indica novas perspectivas ao mesmo tempo em que nos coloca em relação direta do que somos e do que já conseguimos atingir dentro do nosso processo evolutivo.

O escritor espírita Pedro Camargo, em seu livro: O Mestre na Educação, nos diz que “A consciência é o juiz íntegro cuja toga não se macula e cuja sentença ouviremos sempre, quer queiramos, quer não, censurando nossa conduta irregular. Esse juiz, essa voz débil, mas insopitável, é a centelha divina que refulge, através da escuridão da nossa animalidade, é o diamante que cintila a despeito da negrura espessa do rude invólucro que o circunda”. Assim, podemos dizer que a consciência é o quantum que já despertamos em nós do Deus que habita o nosso santuário interno. É o self em expansão e fazendo-se notar através de atos virtuosos que já incorporamos em nossos hábitos comuns.

Emmanuel, em seu livro que tem o título do seu nome: Emmanuel, nos diz, no capítulo 15, que “É a consciência, centelha de luz divina, que faz nascer em cada individualidade a ideia da verdade, relativamente aos problemas espirituais, fazendo-lhe sentir a realidade positiva da vida imortal, atributo de todos os seres da Criação”. Chegamos agora à questão 621 de O Livro dos Espíritos. Nela Allan Kardec, estudando o conhecimento das Leis Naturais instituídas por Deus, faz o seguinte questionamento:

– E onde estão escritas as Leis de Deus?

– Na consciência. – Respondem prontamente os Espíritos responsáveis pela implantação do Espiritismo na Terra. E na questão 621-a, o Codificador completa a pergunta, quando formula a questão:

– Desde que o homem traz na consciência a Lei de Deus, que necessidade tem que lha revelem?

– Ele a tinha esquecido e desprezado. Deus quis que ela lhe fosse lembrada. –Respondem os Espíritos. Ou seja, estamos indo em direção a Deus. O nosso roteiro é a nossa consciência, pois que nela estão escritos os códigos que nos levam a um avanço destemido e constante.

Ocorre que a grande maioria ainda prefere o fazer trivial a uma reflexão importante e necessária sobre o que estamos fazendo na vida e quem representamos nela. Podemos listar vários tipos de consciência. Stanislav Groff, psicólogo transcendental da atualidade, classifica em cinco os tipos de consciência. É um estudo interessante e que tem o aval de Joanna de Ângelis. O primeiro nível é o da consciência de sono sem sonhos. Nesse estágio a pessoa vive basicamente para cumprir os fenômenos fisiológicos, assim como: comer, dormir, reproduzir-se e atender aos prazeres sensoriais vinculados ao ego. Na análise de Joanna de Ângelis, nesta fase “… apenas se tem como fator determinante os fenômenos orgânicos automáticos que se exteriorizam, assim mesmo sem o conhecimento da consciência”. Puro automatismo. É como se o indivíduo não fosse mais que uma máquina de fazer acontecer os eventos diários sem uma análise, uma conclusão, uma síntese que o enriqueça. É o famoso: viver por viver.

O segundo nível de consciência é classificado por Stanislav Groff como consciência de sono com sonhos. Nesse nível de consciência a elaboração onírica intensifica-se, demonstrando um maior diálogo entre o consciente e o inconsciente, proporcionando a liberação de inúmeros clichês. Ainda há a preponderância dos desejos e pulsões controlando as ações do indivíduo, embora já se veja um suave despertar. Podemos definir esses clichês como símbolos arquivados no inconsciente e formados ao longo das existências passadas, ficando como marcas, matrizes, onde o Espírito busca significados que ampliem seus entendimentos sobre as coisas que vê e sente. E nos diz Joanna de Ângelis: “… ali a realidade apresenta-se ainda difusa, cujos contornos perdem-se em vagos delineamentos que não lhe correspondem à exatidão”. É como se víssemos um camelo e não soubéssemos distingui-lo de um dromedário. Olhássemos o céu e víssemos apenas pontos luminosos brilhando à noite, sem uma introspecção do que seriam as estrelas, para que foram criadas, qual o destino delas. Nesse nível ainda confundimos gato com lebre! Alhos com bugalhos, utilizando aqui expressões populares.

O terceiro nível é o da consciência do sono acordado. Agora já se começa a ter uma identificação com a realidade. Neste nível as escolhas começam a ser mais bem elaboradas. Já conseguimos identificar, mesmo que levemente, o que seja o bem do mal, o belo do feio, o valor da cidadania e sua adequação a ela. É um nível onde iniciamos a autorrealização tendo como parâmetro a lei de causa e efeito. O indivíduo toma conhecimento de que o que plantar haverá de colher. Daí o cuidado no plantio. Joanna de Ângelis avalia como sendo “… a determinação pessoal, aliada à vontade de conduzir o ser aos ideais de enobrecimento, à descoberta da finalidade da sua existência, às aspirações do que lhe é essencial”. Avaliamos esse nível de consciência como sendo o ponto chave do despertamento do indivíduo, pois que à medida que amadurecem as reflexões em torno desses postulados, avança de forma mais determinada para as próximas etapas.

O quarto nível, segundo Stanislav Groff e Joanna de Ângelis, o indivíduo começa a ser o si para si mesmo. Vejamos o que diz Groff: “O ser desidentifica-se da persona, ou seja, do ego inferior e imaturo, desidentifica-se igualmente do coletivo e se deixa conduzir pelo self que é a personalidade maior”. Identificamos aqui figuras importantes da história. Homens e mulheres que entregaram suas vidas por ideais que beneficiaram toda a humanidade. Esse nível de consciência é identificado como sendo o da Transcendência do eu.

Anima-nos saber que este é o justo caminho a ser trilhado por todos nós. É isto que os Espíritos Superiores nos informam sempre quando nos aconselham ao estudo e prática do Evangelho de Jesus. Ou seja: há uma finalidade e essa finalidade está ligada diretamente aos avanços dos nossos níveis conscienciais dando lugar ao nosso Deus interior para que Ele fale através de nós e que o outro O sinta quando estiver próximo a nós. É esta a finalidade para o amai-vos e instruir-vos que o Espírito da Verdade nos aconselha através do Livro O Evangelho segundo o Espiritismo e, ainda no mesmo livro, a citação de Allan Kardec: “Reconhece-se o verdadeiro espírita pelo muito que fizer para domar suas más inclinações”. A resultante será sempre uma consciência livre dos níveis iniciais, obscuros, estreitos e sonolentos.

Completando as nossas reflexões sobre os propostos níveis de consciência, vamos agora para o quinto nível que é o da Consciência Cósmica. Nesse nível o ser atinge a perfeita identificação com os ideais superiores da vida, da qual Jesus é o exemplo perfeito. Podemos repetir aqui a sua palavra: “Eu e o Pai somos um” e que João anotou no capítulo 20, vv. 30, do seu evangelho. Paulo de Tarso, escrevendo aos Efésios no capítulo 5, vv. 14, da sua carta, disse com ênfase e autoridade: “Desperta, ó tu que dormes, levanta-te dentre os mortos e Cristo resplandecerá sobre a tua pessoa”.

Há ainda os estados alterados de consciência através das drogas lícitas ou não, momentos de transtornos frequentemente motivados pela ira ou ainda originados pelo êxtase das emoções superiores. Há ainda a consciência culpada que, no dizer de Manoel Philomeno de Miranda, em seu livro Nos Bastidores da Obsessão, no capítulo 4, “… é sempre porta aberta à invasão da penalidade justa ou arbitrária. E o remorso, que lhe constitui dura clave, faculta o surgimento de ideias fantasmas apavorantes que ensejam os processos obsessivos de resgate das dívidas”. E há ainda a consciência normal que, segundo Gustavo Gelei, em seu livro O Ser subconsciente, editado pela FEB, “É o resultado da colaboração de dois psiquismos, o superior e o inferior; colaboração na qual o psiquismo superior desempenha o papel diretor e centralizador”.

“A chave para estarmos em estado de conexão permanente com o nosso eu interior, ou seja, nossa consciência em expansão é o desejo de senti-la em todos os momentos. Esta prática pode intensificar nossos avanços, transformando nossas vidas. Quanto mais nos direcionarmos para o nosso campo interior, mais cresce a frequência vibracional, tal qual a luz que vai ficando mais forte quando acionamos o botão do dimmer” – diz-nos Eckhart Tolle da Universidade de Cambridge, em seu livro O Poder do Agora.

É-nos necessário um olhar mais profundo sobre nós e o mundo que nos rodeia. Há muito que fazer. Há muito que realizar e não podemos ficar por aí dormindo e sonhando, achando que somos super-homens ou mulheres, numa alucinação onírica que a nada nos levará. O homem antigo, cheio de rugas de um passado coalhado de mandos e desmandos, ilusões, narcisismos e atitudes imorais, deve ceder espaços ao novo que bate às nossas portas. Deus está dentro de nós e somente com a consciência expandida ou em expansão é que vamos senti-Lo. Fora isto, seremos sempre o arrogante, imaturo, matuto, sensual, maioral etc. A vida espiritual é, com efeito, a verdadeira vida. É a vida normal do Espírito, sendo-lhe transitória e passageira a existência terrestre, espécie de morte, se comparada ao esplendor e à atividade da outra, da vida espiritual, como nos informam os Espíritos Superiores. E agora, a quem seguir? A um conjunto de informações e vivências que nos mantêm adormecidos, consciencialmente, ou a ações que nos impelem a um despertamento para melhor avaliarmos quem somos neste grande concerto que é a vida gerada e mantida por Deus, de quem somos filhos?

O consolador – Ano 9 – N 430

spot_img