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Perdoar e não esquecer

Autora: Cristina Sarraf

Inúmeras são as maneiras de se entender os fatos, as lições e tudo o mais. Essas diferenças não dependem apenas da mentalidade de cada um, porque a mesma pessoa muda seu entendimento durante a vida, sobretudo pelas situações complicadas, que a levam a amadurecer.

O fato é que, muitas vezes uma interpretação passa pelas gerações e não é examinada para se verificar se continua sendo válida e funcional ou se já está na hora de ser eliminada ou reciclada.

Dentre essas, está a de que perdoar é sinônimo de esquecer.

O equívoco dessa interpretação vem da observação dos fatos e de pesquisas de campo, que mostram como as pessoas funcionam psicologicamente, não esquecendo as situações que viveram, sobretudo as marcantes e mais graves.

O que ocorre, quando a pessoa diz que esquece um fato vivido, é que vão ficando na memória inativa, as situações irrelevantes e as coisas do cotidiano. Mas ficam também, os momentos ruins já devidamente administrados, e que por isso, deixaram de ter significação.

Ser “obrigado” a esquecer não funciona! Quanto mais há esforço nesse sentido, mais o fato vai sendo marcado e fixado. Há negação do que existe no íntimo da pessoa, e isso aumenta o vínculo com a situação.

Muita gente se empenha, oram, pedem ajuda e quando a situação amaina, até pensam que esqueceram as ofensas, mágoas e dores. Mas, quando relembram, tudo é revivido com dor, acompanhado dos sentimentos, emoções e alterações físicas que marcaram o fato, mostrando que o esquecimento não aconteceu.

Até porque, no geral, orgulho, egoísmo e vaidade impedem algum interesse em analisar a própria conduta. Além do que, nos aborrecemos sempre pelas mesmas coisas, não percebendo sermos joguetes de situações, Espíritos e pessoas, que “lucram” com isso.

Ter que esquecer algo que aconteceu é ilógico, não apenas porque não se consegue, mas pelo fato de que a memória nos dá a consciência de quem somos; bem como, daquilo que não deve ser repetido, por causa das más consequências advindas. Esquecer seria perder essa conexão conosco mesmos e eliminar a possibilidade dos naturais processos de reciclagem de pensamentos e atos, promovendo a seleção do que nos serve e expurgando o demais.

No entanto, se colocarmos o verbo esquecer num sentido figurado, ou seja, o de não darmos importância a…, ele pode ser usado em relação ao perdão. Mas nesse caso, é preciso explicar que está sendo utilizado com essa significação metafórica.

Na realidade, perdoar é um ato de inteligência, quando signifique termos reciclado os fatos, buscando compreender a nossa participação nas causas que os determinaram. Assim, poderemos dar-lhes outra interpretação, ou seja, não somos vítimas! Percebemos que representam o didatismo das Leis da Vida, encontrando formas de nos chamar a atenção para pensamentos, sentimentos e condutas que produzem maus resultados. Em outras palavras, entendemos nossos equívocos e buscamos nova atitude interior. Como resultado em curto tempo, o fato doloroso passa a ser visto de outra forma, como se ele mudasse de cheiro e cor. As lembranças vão diminuindo…

Gradativamente, essa nova postura vai ganhando corpo e nos beneficiando. As lembranças dolorosas vão deixando de doer, pela compreensão de como as provocamos -mesmo sem querer- por causa da maneira de pensar que tínhamos. O que promove a diluição das emoções correlatas e a importância que dávamos ao acontecido, acaba por desaparecer.

Um dia, talvez nem nos lembremos mais dele, e quando lembrarmos, será algo neutro e superado. O fato fica na memória inativa, não por obrigação de esquecer ou por medo de Deus, e sim por um trabalho interior de autoconhecimento e renovação de valores.

Há um progresso espiritual eterno, porque nos renovamos, ao compreender nossa incompreensão.

Passa-se a vivenciar que todo e qualquer prejuízo causado a outros, em primeiro lugar é causado a quem o faz, já que sua origem e móvel está dentro dessa pessoa; está nas escolhas de pensamentos que provocam atos e que “atraem”, criam sintonia com pessoas e Espíritos de características semelhantes, os quais passam a agir conosco como agimos com eles. É a justeza das Leis divinas, que visam o nosso amadurecimento, a descoberta do Bem verdadeiro e a condição de não provocarmos prejuízos reais, nem a nós mesmos e nem a ninguém.

Quando, por razões psicológicas de buscar predomínio, pelos preconceitos, egocentrismo ou vaidade, alguém se julgar lesado, mas isso for apenas manifestação dos seus truques mentais, o pseudo causador não tem responsabilidades, é óbvio! Descarte o envolvimento e garanta a consciência de sua conduta limpa. Com postura benevolente, não se deixe envolver em culpas e deveres inexistentes.

Perdoe, ou seja, compreenda e “deixe pra lá”.

Jornal do NEIE

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