Autora: Cristina Sarraf
As coisas são mais belas quando vistas de cima
Santos Dumont
Essa frase parece perfeita às experiências que levaram o Homem a voar, embora num aparelho. Mas se a examinarmos sem o nome do autor, podemos formular outros pensamentos a seu respeito. E como a maior liberdade humana está no livre pensar, exercê-la é um grande prazer!
Assim, pensei que ela é tentadoramente boa, mas expressa uma verdade parcial e ocasional.
De cima vemos o conjunto e não os detalhes. Quem já esteve num avião e pode ir acompanhando as paisagens que se sucedem, sabe disso. Quanto mais de cima, proporcionalmente vemos numa amplidão maior e perdemos ainda mais os detalhes… E as belezas vão se tornando novas e inesperadas, como fotos que satélites e o super telescópio Hubble tiram de regiões da Terra.
Kardec se refere ao homem sobre a montanha que antevê, pela posição em que está, a abordagem que o salteador fará ao viajante que não pode vê-lo, por estarem ambos na mesma estrada no sopé, um vindo pela dirhttps://jornaldoneie.com.br/wp-admin/post-new.phpeita e outro pela esquerda. E usa essa figura para ilustrar a condição de Espíritos mais adiantados conhecerem o futuro, porque estão vendo o desenrolar dos fatos presentes. Estar de cima, nesse caso é ter uma visão de conjunto dos comportamentos, e conhecer pelas experiências já vividas, as decorrências naturais deles.
Do ponto de vista pessoal, para sairmos do mau hábito da crítica e condenação, própria ou de outros, olhar o conjunto das características “de cima”, poderá diluir os aspectos negativos e mostrar valores e qualidades que não podem ser desprezados. Enquanto a fixação mental no ponto negativado, fecha as condições de uma análise justa. É como uma fotografia de perto: só se vê o enquadramento.
Ante problemas e dificuldades, olhar de cima facilita uma certa impessoalidade, necessária para uma visão mais ampla e clara da situação, o que encaminha a um posicionamento melhor.
Também lembrei do professor, no filme Sociedade dos Poetas Mortos, mandar os alunos subirem nas carteiras, para ter uma visão nova, de cima, simbolizando a postura mental de sair do medo, do abaixo e postar-se corajosamente em suas próprias características… Coisa que todos precisamos fazer conosco mesmos, se pretendemos a autorrealização e a felicidade.
Apesar dessas confirmações à frase de nosso ilustre conterrâneo, intitulado o pai da aviação, caso o objetivo do observador esteja no micro, nos detalhes e partes, a visão deve ser de perto, o mais possível! Ou de dentro, como nas maravilhosas e inusitadas fotos do interior de artérias, de órgãos… neste caso, a frase não serve; fica ilógica.
Uma cerejeira olhada, vista, fotografada de cima é pujante; de perto, a delicadeza das flores e a multi nuance das cores, se mostra em toda sua magnificência e esplendor, apenas vistos por quem vê de bem próximo.
E por mais que Santos Dumont não pudesse saber, porque a busca da vida e das “cenas” microscópicas só veio depois, uma foto nanométrica traz belezas extraordinárias e tão surpreendentes quanto as “de cima”. Um fio de cabelo fotografado por essa atualíssima técnica, se afigura semelhante a um tronco de árvore…hemácias parecem rosquinhas…
Há pinturas na cabeça de alfinetes, só observáveis com lupa. Há os microrganismos, salvadores ou destruidores de nossa vida fisiológica, do solo, de plantas, cujo conhecimento advêm das condições atuais de observação e análise com tecnologia microscópica. Quando as parturientes morriam pela invisível contaminação microbiana e quando, pela mesma razão, Oswaldo Cruz estabeleceu providências para estancar a peste bubônica, o que esteve em jogo, acreditassem ou não as pessoas da época, era a vida e a ação dos seres microscópicos, jamais vistos pelo olhar “de cima”.
Um artista pintor, use a técnica que for e o estilo que quiser, tem por característica saber ver detalhes e insignificâncias, que são a razão de sua qualidade e das belezas que cria. Um olhar de cima só veria o todo…
Na vida de cada um, das famílias e grupos humanos, há detalhes que não podem ser ignorados, fingindo que não existem, porque funcionam como bombas relógio, detonando a saúde, os relacionamentos, a mente e a paz. Precisam ser examinados, estudados minuciosamente e trabalhados em seus múltiplos pequenos aspectos, para se obter uma solução razoável. Olhar de cima, nesses casos, é o mesmo que “empurrar com a barriga” ou viver apagando incêndio…
E lembrei do conhece-te, ou seja, observa, enxerga aqueles aparentemente mínimos detalhes comportamentais e valorize-se como fruto do pensamento de Deus, que todos somos; e sobretudo, que vejamos e examinemos o que é possível fazer para minimizar, pelo menos, algum condicionamento mental, ideia ou conceito que infelicita a vida… Coisa que todos precisamos fazer conosco mesmos, se pretendemos a autorrealização e a felicidade!
Nota
Se o exercício de pensar feito no texto acima foi do seu agrado, a sugestão é que faça algo semelhante com a seguinte frase: “Um realizador futuro acontecerá somente após o entendimento e a superação de situações consideradas negativas. Ninguém caminha adiante, enquanto não deixar para trás os fracassos e sofrimentos passados.” – autor desconhecido.