Autora: Solange Meiking (Psicanalista Clínica)
O amor é o sentimento mais nobre que o homem necessita estimular para o seu crescimento como ser, que além de racional é simbólico.
Somos envolvidos a sentimentos que os Gregos denominaram como: Pornéia, Eros, Nous-ética e o Ágape.
A Pornéia foi o primeiro sentimento que surgiu em tudo que é animado, e no homem surgiu como a força motriz que irá estimular o instinto sexual, o instinto pela preservação da vida. É a busca pelo prazer, o saciarse sem limites.
Pornéia foi o início de tudo. Mantínhamos relações sexuais a céu aberto, não existia estímulo de perpetuidade amorosa, e de formação familiar. Existia a procriação livre. Nascendo à defesa pela vida, onde a noção por ela era totalmente instintiva, o aqui e agora.
O “outro” não era respeitado. É o prazer desprovido de qualquer inferência social, é a busca de satisfazer-se mesmo que esteja na presença do seu grupo. É a liberdade de escolha sem o mínimo respeito pela parceira. A luta corporal pela disputa de uma parceira para o coito era permanente. Esse era o seu grande referencial: a luta pela conquista sexual. Mas, não podemos esquecer que Pornéia está dentro de nós como o início de tudo e nos estimulará à satisfação sexual.
Dessa forma o homem alcança dentro da sua escala evolutiva o Eros, que nasce estimulando a beleza, as cores, a arte. Eros é a valorização pelo corpo, pela perfeição da escultura, é a PAIXÃO. Chega o início do fechar as portas para manter relações sexuais. O nascer da relação familiar e social mesmo que conturbada. Pois, Eros ainda é paixão e toda paixão é efêmera. Ela se expressa instintivamente, sem perpetuidade, é um cristal que se quebra facilmente na primeira decepção do outro. Ainda não existe respeito ao convívio sócio-familiar.
Hoje estamos adentrando no Nous-ética (Nous em grego significa espírito), portanto, nasce a ética do espírito. Assim, o homem começa a se voltar para as coisas espirituais, sua preocupação pelo comportamento moral está em todo processo civilizador, que fez nascer o SUPEREGO.
O superego é o grande vigilante dos nossos comportamentos, nasce da educação familiar, religiosa e do convívio com o meio social. São as limitações que todo um processo civilizador veio trazer para que o homem, de uma forma-limite, pudesse desenvolver um novo comportamento do “eu”, que expressasse o “nós” com mais respeito em comunidade. Dessa forma, é o “outro” como alteridade que entra em jogo. É o saber conviver que traz ao homem uma noção de limites.
Assim, através do processo evolutivo, ainda atingiremos o sentimento Ágape, que será uma perfeita união dos sentimentos já vividos e experienciados, que nos tornarão amor. Amor em sua expressão mais bela, de respeito do ir e vir e da lealdade para consigo, e assim será expresso em sentimento universal. O Ágape foi o sentimento proposto e vivenciado por Jesus. Espírito de Escol que nos trouxe essa mensagem de “Amar Ao Próximo Como A Si Mesmo”, veio nos alertar essa proposta Ágape de viver a vida.
E porque tudo isso para chegarmos ao “ficar”?
É que este tipo de comportamento nos remonta ao Pornéia e ao Eros, que são a expressão inicial do nosso comportamento humano. Apesar de todo avanço tecnológico, o homem pós-moderno ainda sofre de problema moral. Com a falta da presença da família, que vem se distanciando da proposta educadora através da presença exemplificadora para a formação do ser, vem desenvolvendo nos mais jovens a insegurança amorosa. O sentimento “ficar”, veio como expressão desse desamor vivenciado em família. A desqualificação desse sentimento que deveria fazer parte do processo evolutivo do Nous-ética, está emperrando a caminhada.
O “ficar” desqualifica totalmente (e como sempre) a mulher, que fica visada e discriminada pelo homem que a usa. O homem como um caçador nato, sempre estará presente na hora da caçada, e quanto mais caça nova tiver, mais ele se sentirá alimentado. A mulher por sua vez, que pensa que está conquistando um espaço de liberdade, cai de qualificação na hora da escolha para um relacionamento sério. O lema social entre os homens é: “Com quem se “fica”, não se casa”.
Tenho visto no Divã Analítico, jovens que completaram 25 anos de idade e ainda não encontraram o parceiro sério para um futuro compromisso. Nessa idade, os jovens querem ter sua vida profissional e amorosa arrumada. A vida precisa encontrar um rumo, formar-se, casar-se e ter seus filhos. E o que vem ocorrendo? A falta de seriedade nos homens e nas mulheres para uma proposta de vida a dois. Os homens recuaram com medo da mulher que se apresenta livre e independente. Garotas que “ficam” dão ao homem o sabor do descompromisso e da leviandade. De forma subjetiva estão dizendo: “tudo se pode, sem precisar nada assumir”.
Os compromissos da seriedade, do respeito ao outro não estão presentes nesse tipo de relação. Estamos de volta aos sentimentos Porneicos e Eros que fizeram parte da nossa caminhada como degrau evolutivo, e o homem atual, que já teve tantas conquistas, vem utilizando-os como mecanismo de “fuga” para sua responsabilidade sentimental. Infelizmente, é à volta dos sentimentos atávicos, pelo medo de amar.