Autor: Casimiro de Abreu (espírito)
*
Meu Deus, deixai que eu me esqueça
Da minha vida de agora,
Que apenas o meu passado
Eu possa alegre rever;
Deixai que me identifique
Com os raios da luz de outrora,
Daquela risonha aurora
Do meu passado viver.
*
Que eu sinta de novo a vida
Na infância linda e ditosa,
Na alegria inalterável
Do lugar onde nasci;
Quero rever novamente
A paisagem luminosa,
Sentir a emoção grandiosa
De tudo o que já senti!…
*
Ah! que eu possa hoje olvidar
Imensidades, esferas,
Concepções mais perfeitas
No progresso que alcancei;
Que das ruínas, dos escombros,
Minhalma retire as heras,
E contemple as primaveras
Da vida que já deixei.
*
Quero aspirar os perfumes
Dos cendais cheios de flores,
Na fresca sombra dos vales,
Sob a luz do céu de anil!
Rever o sítio encantado
Da minha estância de amores,
Meus sonhos encantadores,
Minha terra, meu Brasil!
*
Escutar os sinos calmos
Sob a alvura das capelas,
Enchendo as longes devesas,
De convites à oração;
Sentar-me no prado agreste,
Beijar as flores singelas,
Mirar a luz das estrelas,
Ouvir a voz da amplidão!
*
Correr sob o sol-nascente
Até que chegue o luar,
Procurando os passarinhos
E as borboletas tafuis;
Que esperança, que ventura!
Viver, sofrer, e amar
A campina, o Sol, o mar,
Campos verdes, céus azuis
*
Ser homem e ser criança,
Toucar-se a alma das galas
Da poesia inexprimível,
Da alvorada e do arrebol…
Oh! Natureza da Terra,
Que tesouros não exalas,
Na carícia dessas falas
Do passarinho e do Sol!
*
Eu gozo de quando em quando,
Revendo essa claridade,
Da existência transcorrida
Guardada no coração;
E dos cimos desta vida,
Na excelsa Imortalidade,
Verto prantos de saudade
A luz da recordação.
Nota
A poesia acima, psicografada por Francisco Cândido Xavier, faz parte do livro Parnaso de Além-Túmulo
Obra completa: https://www.febeditora.com.br/parnaso-de-alem-tumulo