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Senhor Poitevin, aeronauta

Revista Espírita, abril de 1859

Morto há mais ou menos dois meses, de uma febre tifóide contraída em consequência de uma descida que fez em pleno mar.

Sessão da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, de 11 de fevereiro de 1859.

1. Evocação. – R. Heis-me, falai.

2. Lamentais a vida terrestre? – R. Não.

3. Sois mais feliz que de quando vivo? – R. Muito.

4. Qual motivo pôde levar-vos às experiências aeronáuticas? – R. A necessidade.

5. Tínheis o pensamento de servir à ciência? – R. De nenhum modo.

6. Vedes hoje a ciência aeronáutica sob um outro ponto de vista do que de vossa vida? – R. Não; via-a como a vejo agora, porque a via bem. Vejo sempre aperfeiçoamentos a trazer que eu não poderia desenvolver por falta de ciência; mas esperai; homens virão que lhe darão o relevo que ela merece e que merecerá um dia.

7. Credes que a ciência aeronáutica se tomará um dia um objeto de utilidade pública? – R. Sim, certamente.

8. A grande preocupação daqueles que se ocupam dessa ciência, é a procura dos meios de dirigir os balões; pensais que a isso se chegará? – R. Sim, certamente.

9. Qual é, segundo vós, a maior dificuldade que apresenta a direção dos balões? – R. O vento, as tempestades.

10. Assim, não é a dificuldade de encontrar um ponto de apoio? — R. Se se conduzissem os ventos, conduzir-se-iam os balões.

11. Poderíeis assinalar o ponto para o qual conviria dirigir as pesquisas sob esse aspecto? – R. Deixai fazer.

12. Em vossa vida, estudastes os diferentes sistemas propostos? – R. Não.

13. Poderíeis dar conselhos àqueles que se ocupam dessas espécies de pesquisas? – R. Pensais que seguiriam vossos avisos?

14. Não seriam os nossos mas os vossos. – R. Quereis um tratado? Eu o mandarei fazer.

15. Por quem? – R. Por amigos que me guiaram, a mim mesmo.

16. Há aqui dois inventores distintos em fatos aeronáuticos, o senhor Sanson e o senhor Ducroz que obtiveram rendimento científico muito honroso. Fazeis uma ideia do seu sistema? – R. Não; há muito a dizer; não os conheço.

17. Admitindo como resolvido o problema da navegação, credes na possibilidade de uma navegação aérea sobre uma grande escala, como sobre o mar? – R. Não, jamais como pelo telégrafo.

18. Não falo da rapidez das comunicações, que jamais podem ser comparadas às do telégrafo, mas do transporte de um grande número de pessoas e de objetos materiais. Quais resultados se podem esperar sob esse aspecto? – R. Pouco e prontidão.

19. Quando estáveis em um perigo iminente, pensáveis no que serieis depois da morte? – R. Não; estava inteiramente absorvido em minhas manobras.

20. Que impressão fazia sobre vós o pensamento do perigo que corríeis? – R. O hábito havia enfraquecido o medo.

21. Que sensação experimentáveis quando estáveis perdido no espaço? – R. Perturbação, mas feliz; meu espírito parecia escapar do vosso mundo; entretanto, as necessidades das manobras me tornavam a chamar sob o vento à realidade, e me faziam recair na fria e perigosa posição na qual me encontrava.

22. Vedes com prazer vossa mulher seguir a mesma carreira de aventura vossa? – R. Não.

23. Qual é a vossa situação como Espírito? – R. Vivo como vós, quer dizer, posso dominar a minha vida espiritual como dominais a vossa vida material.

Nota. As curiosas experiências do senhor Poitevin, sua intrepidez, sua notável habilidade na manobra dos balões, nos faziam esperar encontrar, nele, mais elevação e uma grandeza nas ideias. O resultado não respondeu às nossas expectativas; a aerostação não era para ele, como se pôde ver, senão uma indústria, um modo de viver por um gênero particular de espetáculo; todas as suas faculdades estavam concentradas sobre os meios de excitar a curiosidade pública. É assim que, nessas conversas de além-túmulo, as previsões, frequentemente, se desenrolam; ora ultrapassam, ora acha-se menos do que se esperava, prova evidente da independência das comunicações.

Em uma sessão particular, e por intermédio do mesmo médium, Poitevin ditou os conselhos seguintes para realizar a promessa que vinha de fazer, cada um poderá apreciar-lhe o valor; nós os damos como objeto de estudo sobre a natureza dos Espíritos, e não por seu mérito científico mais que contestável.

“Para conduzir um balão cheio de gás, encontrareis sempre as maiores dificuldades: a imensa superfície que oferece exposta aos ventos, a pequenez do peso que o gás pode levar, a fraqueza do envoltório que reclama esse ar sutil; todas essas causas jamais permitirão dar, ao sistema aerostático, a grande extensão que gostaríeis de vê-lo tomar. Para que o aerostato tenha uma utilidade real, é preciso que seja um modo de comunicação poderoso e dotado de uma certa presteza, mas, sobretudo, poderoso. Dissemos que ele ocupava o meio entre a eletricidade e o vapor; sim, e em dois pontos de vista:

1º. Ele deve transportar os viajantes mais depressa do que as ferrovias, menos depressa do que o telégrafo as mensagens.
2º. Não está no meio desses dois sistemas, porque participa, ao mesmo tempo, do ar e da terra, todos os dois servindo-lhe de caminho: está entre o céu e o mundo.

“Não me perguntastes se chegaríeis a ir, por esse meio, visitar outros planetas.

Entretanto, esse pensamento é o que tem inquietado bem os cérebros, e cuja solução encheria de espanto todo o vosso mundo. Não, não chegareis. Considerai, pois, que para atravessar esses espaços desconhecidos para vós, de milhões, de milhões de léguas, a luz gasta anos; vede, portanto, quanto será preciso de tempo para atingi-los, mesmo levados pelo vapor e pelo vento.

“Para retornar ao assunto principal, começando vos direi que não é preciso esperar muito do vosso sistema atualmente empregado; mas obtereis sempre mais atuando sobre o ar por compressão forte e ampla; o ponto de apoio que procurais, está diante de vós, vos cerca por todos os lados, com ele vos chocais a cada um dos vossos movimentos, ele entrava todos os dias vosso caminho e influi, sobretudo, no que locais. Pensai bem nisso, tirai desta revelação tudo o que puderdes: suas deduções são enormes. Não podemos tomar-vos pelas mãos e vos fazer inventar as ferramentas necessárias a esse trabalho, não podemos vos dar, palavra por palavra, uma indução; é preciso que vosso Espírito trabalhe, que amadureça seus projetos, sem isso não compreenderíeis o que faríeis e não saberíeis manejar vossos instrumentos; seríamos obrigados a voltar e abrir, nós mesmos, todos os vossos empenhos, e as circunstâncias imprevistas que viriam um dia, ou outro, combater vossos esforços, vos reconduziriam a vossa ignorância primária

‘Trabalhai, pois, e encontrareis o que procurardes: conduzi vosso Espírito para o lado que- vos indicamos, e aprendei pela experiência que não vos induzimos ao erro.”

Nota. Esses conselhos, embora encerrando incontestáveis verdades, não deixam de denotar um Espírito pouco esclarecido em certos pontos de vista, uma vez que parece ignorar a verdadeira causa da impossibilidade de atingir outros planetas. É uma prova a mais da diversidade de aptidões e de luzes que se encontram no mundo dos Espíritos, como neste mundo. É pela multiplicidade das observações que se chega a conhecê-lo, a compreendê-lo e a julgá-lo. Por isso, damos espécimes de todos os gêneros de comunicações, tendo o cuidado de fazer ressaltar o forte e o fraco. A de Poitevin terminou por uma consideração muito justa que nos parece suscitada por um Espírito mais filosófico do que o seu; de resto, ele dissera que faria redigir seus conselhos por seus amigos que, em definitivo, não nos ensinam nada.
Nela encontramos ainda uma nova prova, que os homens que têm uma especialidade na

Terra não são, sempre, os mais apropriados a nos esclarecerem como Espíritos, se, sobretudo, não são bastante elevados para se desligarem da vida terrestre.
É deplorável, para o progresso da aeronáutica, que a maioria desses homens intrépidos não possa colocar sua experiência em proveito da ciência, ao passo que os teóricos são estranhos à prática, e são como marinheiros que jamais viram o mar.

Incontestavelmente, haverá um dia engenheiros em aerostática, como há engenheiros marítimos, mas isso não será senão quando terão visto e sondado, por eles mesmos, as profundezas do oceano aéreo. Quantas ideias não lhes dariam o contato real dos elementos, ideias que escapam às pessoas do
ofício! porque, qualquer que seja seu saber, não podem, do fundo de seus gabinetes, perceber todos os escolhos; e, todavia, se essa ciência deva ser um dia uma realidade, isso não será por eles. Aos olhos de muitas pessoas é ainda uma quimera, e eis porque os inventores, que não são, em geral, capitalistas, não encontram nem apoio nem encorajamentos necessários. Quando a aerostação der dividendos, mesmo uma esperança, poderá ser cotada, os capitais não lhe faltarão; até lá não é preciso contar senão com o devotamento daqueles que veem o progresso antes da especulação. Enquanto houver parcimônia nos meios de execução, haverá reveses pela impossibilidade de ensaios sobre uma tão vasta escala, ou em condições convenientes. Seremos forçados a fazê-lo mesquinhamente, o que é um mal, nisto, como em toda coisa.

O sucesso não será senão ao preço de sacrifícios suficientes para entrar largamente no caminho da prática, e quem diz sacrifício diz exclusão de toda ideia de benefício.

Esperamos que o pensamento de dotar o mundo da solução de um grande problema, não o fosse senão sob o ponto de vista da ciência, inspire algum generoso desinteresse. Mas a primeira coisa a fazer seria fornecer aos teóricos os meios para adquirir a experiência do ar, mesmo pelos meios imperfeitos de que dispomos. Se Poitevin tivesse sido um homem de saber, e tivesse inventado um sistema de locomotiva aérea, teria inspirado, sem contradita, mais confiança que aqueles que jamais deixaram a terra, e teria, provavelmente, encontrado os recursos que se recusam aos outros.

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