Autor: Rogério Miguez
Um mundo de provas e expiações, como a nossa Terra, abriga Espíritos que embora sempre evoluindo, o fazem entre sucessos e deslizes morais ao longo de suas particulares existências. São aqueles que optaram por não seguir o caminho reto desde o início, possibilidade real, conforme Allan Kardec assim bem registrou1:
“124. Uma vez que há Espíritos que, desde o princípio, seguem o caminho do bem absoluto e outros o do mal absoluto, haverá, talvez, gradações entre esses dois extremos?
– Sim, certamente, e constituem a grande maioria.”
É a realidade deste orbe, bem como em incontáveis outros compondo o Universo. Desta forma, é de se esperar esta pequeníssima parte da Humanidade corriqueiramente infringindo as leis divinas, por variadas razões e motivações. Nada a estranhar, basta recordar as palavras de Jesus, quando advertiu2: “Ai do mundo por causa dos escândalos: pois é necessário que venham escândalos; mas ai do homem por quem o escândalo vem.” (Mateus 18:7)
Sim, o escândalo, representando na visão espírita qualquer desvio à ordem divina, deve acontecer enquanto os homens não alinham o passo com a conduta moral e ética esperada daqueles pretendentes a alcançar a tranquilidade de consciência.
Quando o escândalo se materializa, surge para o autor, quando consciente de seu desvio, um turbilhão de sentimentos: vergonha, descredito em si mesmo, humilhação, incertezas atrozes, remorso, angústia, depressão, solidão, entre outros, passando a atormentar o infrator, perturbações estas passíveis de serem de muito aumentadas pela ação de Espíritos desencarnados, desorientados e desconhecidos, ou mesmo antigos inimigos do autor.
A vida do transgressor passa então a ser um desenrolar de dúvidas e questionamentos, no sentido de tentar esclarecer ou entender por quais causas ou motivos, chegou-se àquele desfecho. Passa então a viver como se estivesse dentro de um pesadelo interminável, nas profundezas de um mar sem fim.
Observemos a natureza: ela expressa em suas diversas fases do ano algo semelhante ao que acontece rotineiramente em nossas vidas, ou seja, há o verão, outono, inverno e a finalmente a primavera. Normalmente o inverno não é muito apreciado, pois o frio intenso provoca desconforto e representa, fazendo um paralelo nesta singela análise, ao período no qual o Espírito vive as indefinições provocadas pelo escândalo cometido.
No inverno, tudo fica cinzento, não há mais a alegria de viver, as muitas situações se colorem de tons sem vivacidade, tudo permanece sem graça, as árvores apresentam-se despidas de suas folhas e flores multicoloridas. A cena é comum em países do hemisfério norte, diante de invernos rigorosos. O mesmo se passa entre os transgressores da ordem divina. Dependendo da falta cometida e da forma como enfrentam a situação, cogitam mesmo em abrir a traiçoeira e ardilosa porta do suicídio e, quando assim procedem com “sucesso” se arrependem amargamente mais à frente, suportando então expiações severas, em resposta ao ato mais grave que a criatura pode cometer contra o seu Criador.
O escândalo, quando chega, abre a caixa de Pandora, liberando todos os males do mundo passíveis de alcançar o violador da Lei.
A Doutrina, como em qualquer situação, possui orientações seguras e precisas nestes casos, e não poderia ser diferente, dadas as favoráveis condições ainda vigentes neste mundo viabilizando a ocorrência de desacertos morais, em suas muitas modalidades:
- Colocar as mãos no serviço de preferência em direção aos menos felizes;
- Colaborar na edificação do bem e da verdade, em favor de si mesmo;
- Dedicar-se aos estudos e meditações recordando e fortalecendo o entendimento das regras divinas;
- Servir sem questionar, àqueles a se apresentarem necessitados;
- Não se afastar da casa espírita onde milita ou frequenta, pois sozinho pode não encontrar forças renovadoras;
- Buscar o atendimento fraterno para, se desejar, conversar sobre a situação;
- Refazer o passo e buscar o anjo guardião pelo pensamento;
- Orar e pedir forças novas ao Criador.
Estas são medidas simples, mas infalíveis, estando todas ao nosso alcance, podendo auxiliar na retomada da caminhada, pois estagnar nunca será a melhor opção. Martirizar-se, crendo-se o último dos últimos, igualmente não resolverá, só agravará a situação, deixando o infrator mais exposto aos rigores do inverno. Se daqueles a nos cercar, vier a condenação, saibamos aceitá-los humildemente, equivocados estão, e mais cedo ou mais tarde, reconhecerão, porquanto ainda agem no momento conforme padrões estabelecidos em nossa sociedade, que ditam e impõem o julgamento e a consequente aplicação da pena, sem maiores avaliações do quadro amplo caracterizando qualquer desvio cometido contra as Leis divinas.
Desta forma, se o escândalo alcançar a nossa particular jornada, seja de que monta for, olhemos para o alto, elevemos o nosso pensamento em direção a Deus, solicitando sinceramente o perdão do Eterno, e prossigamos decididos, agora mais sábios diante da experiência vivenciada, certos de que o Deus Pai, não pune Seus filhos eternamente, pelo contrário, é o Seu desejo que nos libertemos de nossas limitações e marchemos resolutos rumo à perfeição, meta fatal a nos alcançar, mais hoje, mais amanhã.
Não deixemos nos envolver pelo frio inverno da incerteza e da tristeza, a primavera sempre retornará, colorindo de flores mais uma vez os caminhos de nossa existência, nos convocando a seguir em frente, resolutos, agora e sempre.
- KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 3ª ed. Comemorativa do Sesquicentenário. Rio de Janeiro: FEB.
- KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Trad. Guillon Ribeiro. 112. ed. Cap. VIII, it. 11. Rio de Janeiro: FEB, 1996.