Autor: Augusto dos Anjos (espírito)
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Donde venho? Das eras remotíssimas,
Das substâncias elementaríssimas,
Emergindo das cósmicas matérias.
Venho dos invisíveis protozoários,
Da confusão dos seres embrionários,
Das células primevas, das bactérias.
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Venho da fonte eterna das origens,
No turbilhão de todas as vertigens,
Em mil transmutações, fundas e enormes;
Do silêncio da mônada invisível,
Do tetro e fundo abismo, negro e horrível,
Vitalizando corpos multiformes.
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Sei que evolvi e sei que sou oriundo
Do trabalho telúrico do mundo,
Da Terra no vultoso e imenso abdômen;
Sofri, desde as intensas torpitudes
Das larvas microscópicas e rudes,
A infinita desgraça de ser homem.
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Na Terra, apenas fui terrível presa,
Simbiose da dor e da tristeza,
Durante penosíssimos minutos;
A dor, essa tirânica incendiária,
Abatia-me a vida solitária
Como se eu fora bruto entre os mais brutos.
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Depois, voltei desse laboratório,
Onde me revolvi como infusório,
Como animálculo medonho, obscuro,
Té atingir a evolução dos seres
Conscientes de todos os deveres,
Descortinando as luzes do futuro.
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E vejo os meus incógnitos problemas
Iguais a horrendos e fatais dilemas,
Enigmas insolúveis e profundos;
Sombra egressa de lousa dura e fria,
Grito ao mundo o meu grito que se alia
A todos os anseios gemebundos: –
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“Homem! por mais que gastes teus fosfatos
Não saberás, analisando os fatos,
Inda que desintegres energias,
A razão do completo e do incompleto,
Como é que em homem se transforma o feto
Entre os duzentos e setenta dias.
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A flor da laranjeira, a asa do inseto,
Um estafermo e um Tales de Mileto,
Como existiram, não perceberás;
E nem compreenderás como se opera
A mutação do inverno em primavera,
E a transubstanciação da guerra em paz;
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Como vivem o novo e o obsoleto,
O ângulo obtuso e o ângulo reto
Dentro das linhas da Geometria;
A luz de Miguel Angelo nas artes,
E o espírito profundo de Descartes
No eterno estudo da Filosofia.
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Porque existem as crianças e os macróbios
Nas coletividades dos micróbios
Que fazem a vida enferma e a vida sã;
Os antigos remédios alopatas
E as modernas dosagens homeopatas,
Produto da experiência de Hahnemann.
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A psíquico-análise freudiana
Tentando aprofundar a alma humana
Com a mais requintadíssima vaidade,
E as teorias do Espiritualismo
Enchendo os homens todos de otimismo,
Mostrando as luzes da imortalidade.
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Como vive o canário junto ao corvo,
O céu iluminado, o inferno torvo
Nos absconsos refolhos da consciência;
O laconismo e a prolixidade,
A atividade e a inatividade,
A noite da ignorância e o sol da Ciência.
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As epidermes e as aponevroses,
As grandes atonias e as nevroses,
As atrações e as grandes repulsões,
Que reunindo os átomos no solo
Tecem a evolução de pólo a pólo,
Em prodigiosas manifestações;
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Como os degenerados blastodermas
Criam a descendência dos palermas
No lupanar das pobres meretrizes,
Junto dois palacetes higiênicos,
Onde entre gozos fúlgidos e edênicos
Cresce a alegre progênie dos felizes.
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Os lombricóides mínimos, os vermes,
Em contraposição com os paquidermes,
Assombrosas antíteses no mundo;
É o gigante e o germe originário,
Os milhões de corpúsculos do ovário,
Onde há somente um óvulo fecundo.
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A alma pura do Cristo e a de Tibério,
Vaso de carne podre, o cemitério,
E o jardim rescendendo de perfumes;
O doloroso e tetro cataclismo
Da beleza louçã do organismo,
Repleto de dejetos e de estrumes.
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As coisas substanciais e as coisas ocas,
As ideias conexas e as loucas,
A teoria cristã e Augusto Comte;
E o desconhecido e o devassado,
E o que é ilimitado e o limitado
Na óptica ilusória do horizonte.
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Os terrenos povoados e o deserto,
Aquilo que está longe e o que está perto;
O que não tem sinal e o que tem marca;
A funda simpatia e a antipatia,
As atrofias e a hipertrofia,
Como as tuberculoses e a anasarca.
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Os fenômenos todos geológicos,
Psíquicos, científicos, sociológicos,
Que inspiram pavor e inspiram medo,
Homem! por mais que a ideia tua gastes,
Na solução de todos os contrastes,
Não saberás o cósmico segredo.
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E apesar da teoria mais abstrusa
Dessa ciência inicial, confusa,
A que se acolhem míseros ateus,
Caminharás lutando além da cova,
Para a Vida que eterna se renova,
Buscando as perfeições do Amor em Deus.”
Nota
A poesia acima, psicografada por Francisco Cândido Xavier, faz parte do livro Parnaso de Além-Túmulo
Obra completa: https://www.febeditora.com.br/parnaso-de-alem-tumulo